terça-feira, 11 de fevereiro de 2020

Coronavírus: o que pode estar por trás da baixa incidência em crianças?


A notícia sobre o diagnóstico do novo coronavírus em um recém-nascido no dia 5 de fevereiro, 30 horas após o nascimento, correu o mundo.
O bebê é o paciente mais jovem infectado no surto que já matou mais de mil pessoas e infectou cerca de 40 mil (99% na China, embora casos tenham sido detectados em mais de 30 países e territórios).
Um dos mais recentes estudos do surto foi publicado no Journal of the American Medical Association e analisa pacientes do hospital Jinyintan, na cidade de Wuhan, epicentro do surto.
Segundo os dados analisados pelos pesquisadores, metade de todas as pessoas infectadas pelo vírus eram adultos com idade entre 40 e 59 anos. Somente 10% dos pacientes têm menos de 39 anos.

"Casos entre crianças têm sido raros", afirma o estudo. Mas por quê? A resposta não é simples e passa por pelo menos três teorias: as crianças teriam um sistema imunológico mais forte, levando a menos complicações e, consequentemente, menos diagnósticos oficiais; o início do surto coincidiu com o período de férias expondo as crianças a menor risco de contágio e há também a possibilidade de o coronavírus ser mais um do rol de vírus com sintomas mais brandos em crianças, como o da catapora, o que também gera menor detecção formal pelo sistema de saúde.

Baixa incidência entre crianças

Nathalie MacDermott, professora da University College de Londres, destaca a possibilidade de a resposta estar no sistema imunológico de crianças.
"Crianças com mais de cinco anos e adolescentes tendem a ter sistemas imunológicos bastante preparados para lutar contra vírus", diz. "Eles podem ser infectados, mas ter uma doença mais branda ou não desenvolver sintomas."
Ian Jones, professor de virologia da Universidade de Reading, acrescenta que as crianças parecem estar escapando dos sintomas mais graves da infecção, sem determinar a razão.
Mas a consequência é a não detecção pelo sistema de saúde dos casos. Ao não desenvolver sintomas como febre e tosse, não há necessidade de consultas médicas, hospitalizações e mais casos reportados.
"Pneumonia (uma das consequências do coronavírus) tende a afetar aqueles com imunidade enfraquecida porque eles já estão têm saúde debilitada ou se aproximando do fim de suas vidas", explicou Jones, da Universidade de Reading.
"Isso acontece com o vírus influenza e outras infecções respiratórias." Adultos com doenças pré-existentes já pressionam seus sistemas imunológicos — a exemplo de diabetes e doenças cardíacas — tendem a ser mais vulneráveis a esse tipo de surto.
Christl Donnelly, especialista em epidemiologia estatística da Universidade de Oxford e do Imperial College de Londres, concorda, citando dados do surto de Sars em Hong Kong.
"A conclusão de nossos colegas foi que, em crianças pequenas, houve um percurso clínico menos agressivo da doença — então elas foram menos afetadas."
Há precedentes para essa baixa incidência em crianças — foi observada em surtos recentes de outros tipos de coronavírus, como a Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars), que começou na China em 2002 e matou quase 800 pessoas (cerca de 10% dos mais de 8.000 casos).
Em 2007, especialistas do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC), órgão público dos Estados Unidos, identificaram 135 casos pediátricos da Sars, mas descobriram que "não houve mortes de crianças ou adolescentes".

As celebrações de fim de ano protegem as crianças?

McDermott, da University College de Londres, também afirma que crianças não ficam tão expostas ao vírus quanto os adultos — o surto começou durante as celebrações de Ano Novo, período em que as escolas estão fechadas.
Quase todas as províncias chinesas decidiram estender a suspensão das aulas, e parte das escolas continuará fechada ao longo de fevereiro.
"Adultos tendem a agir como cuidadores, e protegem as crianças ou as mandam para fora de casa se alguém ali dentro estiver infectado."
McDermott estima que o cenário pode mudar se "a doença se espalhar ainda mais e ampliar o risco coletivo de ser infectado".
Entretanto, a rápida disseminação da doença, até agora, não tem sido acompanhada de um aumento do número de casos pediátricos.

O vírus tem efeitos mais graves em adultos do que em crianças?

Uma outra explicação para a menor detecção em crianças estaria, não no sistema imunológico, mas nas características do vírus. A hipótese neste caso seria de que a doença é mais uma das que têm efeitos mais severos em adultos do que em crianças, como a catapora.
"Isso é mais provável do que (a hipótese de) as crianças terem algum tipo de imunidade (ao coronavírus)", disse à BBC Andrew Freedman, especialista em doenças infecciosas da Universidade de Cardiff.
Os efeitos mais graves também estão relacionados às chamadas comorbidades, como diabetes e doença cardíaca, que são muito mais comuns em adultos.

Mas as crianças não são conhecidas como 'espalhadoras' de vírus?

Crianças costumam ser propensas a contrair e espalhar infecções virais, e em geral são classificadas como "super espalhadoras", segundo Jones.
"Elas transmitem doenças respiratórias com muita facilidade, como sabe qualquer pessoa com filhos em creches", diz.
Poderíamos esperar, portanto, um número elevado de crianças nas listas de infectados — e de mortos — com o novo coronavírus, mas isso simplesmente não está acontecendo, pelo menos até agora.
Se não há unanimidade nas teorias, há consenso, no entanto, sobre o que fazer. Como se trata aqui de um novo vírus, não é possível concluir taxativamente que as crianças estão protegidas dos efeitos mais graves da doença, ou seja, é importante seguir as medidas de prevenção das autoridades de saúde como a frequente higiene das mãos. (BBC News Brasil)

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