sábado, 20 de fevereiro de 2021

Para manter as delicadas esperanças

A gente escasseia de falar de amor na primeira deslealdade e desaprende de vez na última. E desaprendendo vamos perdendo a sutileza dos pequenos gestos e delicadezas que se desfazem quase sem que percebamos sua falta. Uma palavra não dita, um carinho encurtado, uma flor esquecida, e vamos despovoando esse imaginário do amor encantado.
Vamos ali endurecendo o peito e afinando a alma. As paredes do coração ficam mais espessas, a inocência –esse fio que avaliza a esperança e enternece o espírito-, vai se desfazendo feito um fio de água em um rio que perdeu a perenidade. E ficam os veios abertos da memória. É como se nunca mais fosse possível desligar o alerta e se entregar ao abandono total. Haverá, sempre, os sinos prestes a dobrar ao menor sinal de perigo real ou imaginário. É verdade , também, que o tempo vai nos tirando a imensidão do sentir, o arrebatamento das ilusões, pois, o duro caminho da vida, se de um modo ensina, de outro, limita.
E isso não é só com uma mulher, ou homem. É de pai para filho e vice –versa, de amigo para amigo, que, por vezes, é muito mais imperdoável do que qualquer outra. O sentir é sempre essa cordilheira de isopor, frágil , ou invencível, a depender do cuidado.
É assim que as vezes até achamos que perdemos o jeito, a capacidade de amar, que ela só vinga em lugares férteis. É certo, no entanto, que de repente o que era fresta pode deixar passar a luz, e pode haver algum homem que te olha como ninguém olha, que deseja como ninguém deseja, ou uma mulher que cumpre promessas ou anuncia abraços como se o mundo inteiro coubesse nele.
Á gente escasseia de falar de amor, até que o amor nos faz lembrar que há sempre um amanhã para acontecer.

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