quarta-feira, 12 de julho de 2023

Prazer, Roberto Muller. Mas, pode me chamar de Waldick Soriano.

       

Meu irmão Airton, era fã de Roberto Muller. Cantor romântico da antiguidade. Mas, era mais fã de Waldick Soriano. Costumava dizer nos bares da vida: “E pra Waldick não vai nada?” Nas reuniões familiares ele costumava nos divertir cantando músicas de Waldick e outros artistas como: Ari Lobo, Gordurinha, Jackson do Pandeiro e Luís Gonzaga. Dos meus irmãos biológicos era o mais próximo de mim. Caminhoneiro, vivia sempre nas estradas. Mas, sempre que passava por Feira de Santana me visitava. Depois de morar em Salvador por algum tempo, mudou-se para Feira de Santana. E assim vivemos muitas aventuras juntos.

         Sua esposa, Marilene (Nega) sempre me acolheu muito bem em sua casa. Seus filhos Adailton, Marlei, Débora, Dirceu e Valéria, também me trataram muito bem. Sempre que possível estávamos reunidos em família. Houve uma época em que aos domingos Marilene fazia aquele pirão de caranguejo. Eu me lembro de que numa dessas oportunidades eu quase deixo ela maluca com o truque da chave que parecia quebrar um copo e ela corria com uma vassoura e uma pá para pegar os cacos e não achava nada.

       
E assim a gente ia se divertindo, trocando informações, estreitando os laços familiares. Quando não era na casa deles, era na nossa. Muita música, muita cerveja e muita estória para contar. E muitas reclamações de Maura porque Airton queimava as toalhas de mesa com o cigarro. Nada diferente do que a maioria das famílias de classe média. Mas, com Airton sempre tinha um diferencial.

         Como era caminhoneiro, o que não faltavam era histórias sobre esse brasilzão afora. E como bom caminhoneiro, mentia e aumentava as estórias. Segundo seu filho Adailton, as estórias dele sempre tinham como personagens um finado, porque essa era a forma de não ter uma testemunha do fato. Entre essas estória estava aquela em que o bando de Lampeão havia invadido a cidade de Heliópolis (Novo Amparo) onde o nosso pai era delegado. Segundo ele, durante a confusão nosso pai saiu da casa de uma conhecida prostituta usando apenas cueca e no final não havia invasão alguma. Foi um alarme falso.

Numa das suas viagens a São Paulo, eu fui com ele, queria visitar minhas irmãs Letícia e Lulu, que há muito tempo não via. A viagem por si só foi maravilhosa. Eu ainda não conhecia as famosas alterosas de Minas Gerais, os homens minhocas que escavavam paredões em busca de pedras preciosas, conheci o tumulo, à beira da estrada, de Francisco Alves (O Chico Viola), famoso cantor brasileiro que morreu em um acidente de automóvel na Via Dutra. Conheci também a Academia Militar das Agulhas Negras, em Resende, no Rio de Janeiro, entre outras coisas. Mas, o bom mesmo, foi o reencontro familiar. Passamos uma noite só contando estórias engraçadas e lembrando os bons e velhos tempos.

Dessa viagem há uma estória sobre uma bebida que Airton resolveu tomar em uma parada, quando ele encostou o caminhão pra descansar e se dirigiu ao bar num posto de gasolina. Foi chegando e dizendo: “Dona Maria, me dê um dreher”! Quando ele tomou um gole, perguntou a dona do bar: Onde a senhora comprou esse dreher? Ela respondeu que comprou de um viajante que passou vendendo. Ele perguntou: Esse viajante era de Feira de Santana? Ela respondeu: Era seu Airton, como é que o senhor sabe? Ele respondeu: É que esse dreher é fabricado lá em Feira de Santana, no Campo Limpo.

Seguindo viagem, parando em um posto de abastecimento, encontramos um caminhoneiro fazendo a força de um pneu de uma carreta. Ele viajava em dupla com outro levando carga para São Paulo. O freio do caminhão estava com problemas e as rodas aqueciam provocando rompimento da câmara de ar. Meu irmão chamou a atenção do jovem caminhoneiro que seguia com o veterano, alertando-o para o perigo da serra do Marçal, uma das mais perigosas da BR 116. O Jovem seguiu o seu conselho, mas, o veterano foi em frente. Ai eu fiquei imaginando quantas pessoas morreram por causa de acidentes que caminhoneiros como aquele veterano teriam causado. Essa foi realmente uma viagem de aprendizado, além do lazer.

Numa viagem de passeio, eu, ele e seus filhos Adailton e Dirceu, paramos em um bar de estrada próximo a Fátima, que seria nosso destino, para beber alguma coisa. Airton ficou no carro. Eu, de brincadeira, perguntei a seu filho Adailton, cadê Roberto Muller? Ele respondeu: ficou no carro. Disse que não vai descer. A garçonete, uma jovem, levantou as orelhas quando ouviu o nome de Roberto Muller. Percebendo, eu cheguei até a porta do bar e perguntei: “Cadê o ônibus com os músicos?” Adailton entrou na brincadeira e respondeu: “Eles foram por Tobias Barreto, para pegar outros músicos que estão lá. Mas, o caminhão com os instrumentos já passou". Eu fui até o carro e perguntei: Não quer nada mesmo? Airton então desceu, bebeu um copo de cerveja e seguimos viagem. Com aqueles óculos escuros ele estava mesmo parecendo uma artista.

Na viagem de volta paramos no mesmo bar. Airton mais uma vez ficou no carro. Eu desci com Adailton para beber alguma coisa. O moleque do Adailton se dirigiu a mim esbravejando: “Da próxima vez, quero luzes, muitas luzes. Que porcaria de produção foi essa?" E eu disse: calma rapaz faltou foi divulgação. Dessa vez era a dona do bar que estava no balcão. E ela nos interpelou; “Ninguém aqui ouviu falar desse show”!

– Como minha senhora? Ninguém aqui ouviu falar do show de Roberto Muller?

– Não! Eu até gostaria de ter ido.

– É, tá tudo errado. Tem que melhorar muita coisa. E disse a Dirceu: Rapaz, você é da guitarra base. Tem que se entender com a guitarra solo. Vamos ensaiar mais. E seguimos viagem deixando a impressão do show de Roberto Muller que não existiu.

Mas, a coisa rendeu. Já em Feira de Santana contamos a história e todo mundo deu risada. Alguns dias depois, pedi a Maurício, sobrinho de Maura, para levar Airton em casa. Eles pararam em um posto para abastecer, e Maurício perguntou a ele: “Roberto Muller, vamos tomar uma cerveja? A garçonete perguntou: O senhor é Roberto Muller? E o moleque disse: Sou. A menina disse: minha mãe é sua fã! Me dê um autógrafo pra eu levar pra ela”. E ele deu. Pensam que a estória parou por ai? Qual o que! Algum tempo depois, sua filha Marley se encontrava em um shopping em Petrolina, e o marido encontrou numa prateleira de discos um cd de Roberto Muller. De brincadeira ele falou: Marley olha o disco de seu pai Roberto Muller aqui! Pessoas que ouviram a interpelaram: Você é filha de Roberto Muller? E ela moleca como o pai, disse: Sou sim. E virou celebridade por alguns minutos.

Airton nos deixou há pouco tempo, mas, a sua alegria e bom humor ficará conosco para sempre.

Até breve, irmão!

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