terça-feira, 31 de dezembro de 2019

RÉVEION


Dizia T.S. Eliot, em poema de Quatro Quartetos, que “a espécie humana não pode suportar muita realidade”. Então, se é verdade, vamos dar licença as nossas exigências, amolecer os corações e decretar feriado na lucidez. Vamos embarcar neste trenó de fantasia, desmascarar as defesas de confete e partir para o abraço. Já lutamos o ano inteiro, choramos nossas pitangas, ganhamos e perdemos, fomos sacaneados por nossos políticos de todas as formas e a luta está longe de acabar porque o time de adversários a cada dia revela um novo talento para substituir os que vão festejar o ano novo no xilindró.

Sim, tivemos que andar atento com os amores, tomados de irreversíveis fragilidades, mas não é hora de fazer balanço, nem de ajustes de contas, afinal, do balacobabo mesmo é botar um champanhe na geladeira, celebrar com os amigos, de calcinha ou cueca nova, desembrulhar o ano novo recém-entregue e passar uma noite inocente de propósitos.
É vero, companheiro, que a luta foi dura, que ninguém facilitou sua vida, porque cada um estava tentando dar conta da sua, mas na hora do vamos ver, estamos todos aí pagando em suor a felicidade, brindando a oportunidade de mudança, e disposto a dar um apoio aos que precisam.

Sim, acredite, existe muita gente por aí arrastando a asa da solidariedade e fazendo muita coisa boa. Este mal, sem vergonha, que vira notícia, não merece nosso respeito. Gente de verdade é você que rala o coco, mas não perde o rebolado e segue em frente sem perder o rojão. Portanto, bote uma beca de respeito, avise geral que a esperança está no ar porque todos merecemos uma noite digna. Você é o artista do seu show, portanto merece acender todos os fogos de artifício de sua imaginação.
Agradeçamos, pois temos a chance de recomeçar, de limar as pedras, e cultivar desertos como um pomar as avessas, como dizia J.C. de Melo Neto. Vamos esquecer o apego ao narcisismo e o exacerbado culto ao individualismo. Inaugure-se para o que vem por aí, sem nunca se dar por obra pronta.
Faça concessões - é o primeiro dia do ano-, e precisamos de leveza na alma. Deixe o ano vir, e vamos ver qual seu borogodó. Abra-se para os amigos e a família e receba todos que puder, delete rancores e celebre como se não houvesse amanhã.

Ame, afinal, é réveion. Com reverência, mas sem vassalagem. Feliz Ano Novo! Meu afeto, e obrigado pela companhia.

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