sexta-feira, 16 de abril de 2010

Crônica da Semana


Delinho

Delinho é um bom amigo, mas tem uma personalidade curiosa. Aliás, ele não tem uma personalidade, ele tem várias, e elas se manifestam de acordo com o seu humor no momento. Ele tem uma pequena fazenda onde mora e trabalha. Mas, como a sede da propriedade fica próximo da cidade, ele sempre aparece no Bar do Vital, para ver os amigos, jogar dominó e baralho e tomar umas e outras.
Só de farra, os amigos ficam perguntando pra ele como estão as coisas na fazenda, só pra ver o que ele vai dizer. Se num dia ele diz que está tudo bem, no dia seguinte ele diz algo completamente diferente. Para que se tenha uma idéia, um dia eu perguntei a ele como estavam as coisas lá na roça e ele me disse que estava preocupado, porque a estiagem já demorava e o gado já estava sofrendo. “Tá tudo seco, o gado quase que já não tem água pra beber. É um calor danado, uma poeira lascaca”, reclamava ele.
Poucos dias depois bateu uma chuvarada na região que durou quase uma semana. Os rios transbordaram, os tanques e açudes sangraram, e o capim verde logo despontou. Por mais de uma semana ele não apareceu no bar. Quando o encontrei, comentei: Agora tá beleza, não é? Pra meu espanto ele respondeu: “Que nada rapaz, tá uma lama danada, o carro atola, o capim novo deixa os bezerros com diarréia. Um frio retado. Tá uma zorra”!
E como ele é gozador, brincalhão, ainda me saiu com esta: “Rapaz, ficou tanto tempo sem chover lá na roça, que os sapos desaprenderam a nadar, agora tá tudo morrendo afogado na enchente”.
Delinho também é mão de vaca e gosta de uma pechincha. Certo dia eu encostei no balcão do bar e pedi um pedaço de empanada para tira gosto. Ele viu e perguntou ao dono do bar: “Quanto custa um negócio deste”? Ao saber que custava R$ 2 Reais, ele perguntou: “Você não me vende só uma metade não”? A partir daquele dia ele deu nome àquele tira gosto pela metade. Os clientes chegavam ao balcão e pediam: “Me dá um Delinho aí”!
Delinho comercializava com couros de animais. Ele comprava o couro cru dos animais abatidos na zona rural, salgava e vendia para um curtume. Mas, como o abate acontece sempre nas madrugadas de sábado para domingo, ele tinha que recolher os couros no domingo, e não tinha tempo para se divertir com os amigos.
Ele então passou a convidar os amigos para irem à sua fazenda às segundas-feiras, quando ele fazia uma panela de feijoada ou um churrasco, preparava uma panela de batida de limão, e passava parte da manhã e da tarde comendo e bebendo com os amigos que apelidaram aquele dia de “Dominguinho do Delinho”.
Certa vez ele resolveu começar uma criação de perus. Meteu na cabeça que era um bom negócio e comprou na feira cerca de uma dúzia de perus novos e magros para engordar e vender, como se faz com gado. Comprou alguns sacos de ração e passou a dar aos perus para ver se engordavam mais rápido. Mas, a ração acabou e ele teve que comprar mais. Matou um peru, vendeu e com o dinheiro comprou mais ração. Quando a ração acabou, ele repetiu a fórmula. Matou outro peru, vendeu e com o dinheiro comprou mais ração.
E assim foi indo até que sobrou um peru. Certo dia, quando os amigos chegaram para o Dominguinho, estranharam que só havia um peru no terreiro. Alguém, então perguntou: “Cadê os perus, Delinho”? Na maior malemolência ele respondeu:
- Tá tudo no fi-o-fó desse aí...

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