sexta-feira, 5 de abril de 2024

31 de março ou 1º de abril?

       

    Em 31 de março de 1964 eu tinha apenas 10 anos. Naquele tempo menino não se metia em conversa de adulto. Mas, eu percebia que havia alguma coisa errada, pois os adultos cochichavam e se mostravam preocupados. Porém, isso foi só naquele dia. No dia 01 de abril, o clima lá em casa era bem diferente, já que era aniversário de um dos meus irmãos. À noite houve uma recepção e todos estavam alegres. Por lá apareceram um dos amigos de meu irmão trajando a farda do Exército Brasileiro. Eu não entendi bem por que. Só mais tarde vim a saber que ele era um oficial da reserva.

         Vida que segue. Os dias foram transcorrendo normais, pelo menos para mim e para a pacata cidade de Feira de Santana. Aqui ou acolá se ouvia ecos de uma revolução militar, mas, nada que afetasse o dia a dia da cidade. Em 1968 eu já entendia melhor o que acontecia, mas, peguei uma doença que me levou ao leito por seis meses. Como não havia remédio, a cura seria com repouso absoluto. Colei minha cama no pé do rádio e ouvia de manhã à noite a programação da Rádio Sociedade da Bahia. Foi assim que comecei a me inteirar dos fatos políticos que abalavam o Brasil, porém, eu não senti nada. Naquele curto período ouvindo rádio creio que aprendi mais do que em qualquer escola.

         Quando voltei à escola, muitos dos meus colegas já estavam envolvidos em passeatas contra a Ditadura. Eu me lembro de que votei contra o candidato a prefeito da minha família, mas, apenas porque os meus colegas diziam que nós éramos revolucionários. Vida que segue, eu comecei a entender melhor as coisas e fui formando opinião própria. Percebi mais tarde que direita ou esquerda não existiam. Tudo era apenas um jogo de interesses políticos.

         Fui tocando a minha vida sem dar importância sobre quem estava no poder. Pra mim pouco importava se era de direita ou de esquerda. Participava de campanhas políticas apenas por interesses pessoais, nunca por convicção. Meus ex-colegas, amigos, todos foram tomando seus rumos e comigo não foi diferente. Contudo, ainda me incomodavam as discussões sobre direita e esquerda. As pessoas se dividiam e assumiam cargos dependendo da posição política que tomavam. Cidades ou estados governados por políticos de direita empregam pessoas que se colocaram como indivíduos de direita. E os de esquerda seguiam o mesmo rumo. Mas, todo mundo vivia e convivia em paz e a gente nem se lembrava de que acontecera um movimento revolucionário. Movimento este que os de direita afirmavam ter sido uma revolução e os de esquerda que fora um golpe de Estado.

         O tempo passou e hoje, 60 anos depois, eu tenho a convicção de que não houve nem revolução, nem golpe de Estado. Tudo não passou de um grande 1º Abril.

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