"Pensar
fora da caixa", "quebrar paradigmas", "desconstruir" e
"empoderamento feminino". Para o publicitário Washington Olivetto,
todas essas expressões ocupam a mesma categoria: "clichês
constrangedores" criados, de tempos em tempos, pela publicidade - e pela
sociedade.
"São
todos primos-irmãos de um baixo nível intelectual, do 'beijo no seu coração'. A
gente tem que fugir desses clichês."
Presidente da
agência W/McCann, eleito duas vezes "Publicitário do Século" pela Associação
Latino-Americana de Agências de Publicidade e ganhador de mais de 50 Leões
no Festival de Publicidade de Cannes, o responsável por campanhas como Garoto
Bombril vê sua área mais pressionada pelos consumidores e pelo politicamente
correto, "que muitas vezes é bem-educado, mas é chato".
Em entrevista
à BBC Brasil, Olivetto, de 65 anos, conta como a maior participação do público
transformou o monólogo da publicidade em diálogo, mas afirma que a interação
tem limite.
"O
consumidor pode e deve dar palpite, mas a principal função dele é consumir.
Quero saber da opinião dele? Claro! Mas se a opinião dele for estapafúrdia e
mais cinco estapafúrdios quiserem (o mesmo) não vou abrir mão das convicções da
boa persuasão."
Ele também
explica por que "Porsche é melhor do que mulher que, diga-se de passagem,
é excelente". Mas para descobrir os motivos é preciso ler a entrevista até
o fim.
Veja abaixo alguns
trechos da conversa:
BBC Brasil - A publicidade adotou temas que antes eram
exclusivos de movimentos sociais, como diversidade sexual e o feminismo. O que
acha dessa tendência?
Washington Olivetto - A publicidade, seja quando começou, seja hoje, tem uma característica
fundamental: a presença de uma grande ideia. É a ideia que provoca aquele
efeito de 'como não pensei nisso antes', e ela é pertinente. É algo que tem a
ver com o produto e com seu consumidor. Não é uma grande ideia algo que seja
simplesmente sensacionalista ou oportunista.
Dentro desse
critério, tudo o que está na vida pode estar na publicidade, desde que seja
pertinente. Tem música na vida? Tem sexo? Pode ter (na publicidade).
Ciclicamente, mesmo antes desses movimentos que
acontecem hoje, a melhor publicidade sempre foi aquela que soube perceber isso.
Quando fiz o
Garoto Bombril, em 1978, tinha detectado que as mulheres estavam cansadas de
serem tratadas como idiotas pela propaganda dos produtos de limpeza. E que a
presença de um homem seria surpreendente. Se ele fosse doce e delicado, melhor
ainda.
BBC Brasil - Como o Woody Allen? Em outras
entrevistas, você disse que o estilo dele estava em alta na época.
Olivetto - As mulheres
estavam achando mais interessante a inteligência do Woody Allen do que os
músculos do John Wayne.
Nos últimos
anos, aconteceram outras coisas, incluindo duas que considero muito ruins:
surgiu fortemente a presença do politicamente correto, que muitas vezes é
bem-educado, mas é chato; e a detecção do politicamente incorreto, que às vezes
é engraçado e mal-educado.
No meio
disso, tem um negócio que batizei de politicamente saudável, que são ideias que
tenham irreverência, senso de humor, mas respeitem a inteligência das pessoas.
A publicidade
no Brasil, por exemplo, durante um grande tempo desconheceu a presença do negro
- temos tantos negros no país e poucos na publicidade. Nos últimos tempos, uma
pressão dos movimentos sociais fez com que a publicidade participasse de
determinadas causas. Isso pode ser feito de maneira oportuna ou oportunista,
essa é a grande questão.
Tivemos uma
experiência interessante no ano passado, que lutei para que não ficasse
oportunista e acabou muito oportuna. Minha diretora de arte do Rio de Janeiro,
que atende a L'Oréal, descobriu uma transgênera, fez um comercial dela com sua
primeira carteira de identidade no dia internacional da mulher. Falei 'Não pode
acabar nisso. Não pode ser um comercial que ganhe um prêmio, tem que virar uma
coisa grande'. Ela virou a primeira porta-voz mundial transgênera da L'Oréal,
virou capa da Vogue francesa, enfim, se tornou um fato verdadeiro.
BBC Brasil - Hoje é mais oportunista do que oportuno?
Olivetto - Sempre será assim. Em causas sociais, a maior
parte delas contém um componente de oportunismo, infelizmente.
BBC Brasil - Há alguns anos, você deu a declaração de que o
politicamente correto estava matando a publicidade. Ainda pensa isso?
Olivetto - Sim, porque principalmente o pessoal mais
verdinho não cogita que tem o politicamente saudável no meio, então elimina
qualquer ideia que tenha uma conotação de irreverência.
Anos atrás
fizemos um comercial do (protetor solar) Coppertone, mostrando um cara que só
usava Coppertone. Ele estava com a mulher na praia e ela tinha esquecido de
comprar o protetor. De repente, vinha um gordo, muito gordo, passando
Coppertone no corpo. (O homem) saia correndo, gritando 'Alfredo', abraçava (o
homem gordo) e se esfregava nele. E, na verdade, eles não se conheciam.
Era só uma
adorável brincadeira. Mas se a gente fosse pensar 'ah, mas os gordos do Brasil
vão ficar chateados, vamos fazer com um magro', ia ficar sem graça.
Hoje essa
capacidade da publicidade de aderir a causas está vivendo um momento modal.
Está na moda, depois tem outra.
Hoje, muitas
editoras têm um personagem chamado leitor sensível. Sabe o que é isso? É um
cara para ler os livros e detectar se tem algum trecho que vai dar problema com
uma minoria. O leitor sensível é um censor disfarçado.
Click
no link e leia mais no BBCBrasil.
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