domingo, 24 de janeiro de 2021

Astronomia de fundo de quintal

 


Dona Etelvina, na plenitude dos seus 47 anos de idade, era uma morena, tostada pelo sol do sertão e apesar de tudo bonita. Seu Isidoro, ou Duzinho, boa altura e forte, de uma brabeza aparente, trabalhava duro na sua pequena propriedade, cuidando da família como um leão. Cinco filhos, sendo quatro mulheres e um homem. Rita, 23 anos, a mais velha, já era casa. A segunda Berenice, de 19 anos, estava encaminhada.

Valter, frangote de 18 anos, já se ufanava de ser homem e andava de namoro com uma colega de escola. Até ai tudo bem, mas ainda tinha Marizete “Zetinha” na doçura dos seus 13 anos e Margarete, na casa dos 17, a terceira filha por ordem de nascimento. Morena-jambo, corpo perfeito, rosto anguloso, cópia da italiana Sofia Loren, na verdade Sofia seria a cópia, pois Margarete era muito mais bonita, o dengo de seu Duzinho que marcava seus passos.

Aos 15 anos já chamava atenção da rapaziada, mas quem conhecia a brabeza do “velho”, preferia não se aventurar. Aos 16 causava “choque elétrico” na moçada. Aos 17, tirava múmia da tumba, sem dificuldade e foi ai que os gaviões começaram a se movimentar em torno da presa. Zé de Almerinda, Tonho de Malaquias, Pedro de Coité, muita gente, mas ela não se engraçava.

Ai surgiu a manifestação de João do Feijão, rapaz trabalhador de seus 26 anos, que tinha herdado uma roça do pai e prosperara no plantio do feijão. Poderia ser um bom candidato, mas não passava no crivo de seu Duzinho que já havia lançado “edital” na praça: “quem se aproximar de minha menina entra no porrete”. E  como era homem de cumprir o que dizia preparou um belo porrete de madeira de lei, ensebou como  manda o figurino e “deitou-o” atrás da porta do seu quarto. Na sua inquietude, olhando para a sua Sofia Loren, produziu outro porrete, por via das dúvidas.

Caminhado para os 18 anos Margarete começou a gostar de olhar a lua no quintal, coisa natural diante da beleza desse astro, notadamente no sertão. O diacho é que até no quarto-minguante, quando nada se tem para ver, ela corria para as profundezas do quintal como se fosse uma astrônoma, munida, às vezes de uma tesourinha de aparar unhas, outras vezes levando uma mariola, doce que a mãe fazia e ele nem gostava.

Bode velho, experiente, Duzinho começou a desconfiar daquela astronomia de fundo de quintal. Ensebou o porrete titular e o reserva também, e deixou o tempo correr. Pouco depois de sete da noite, como se diz na zona rural, embrenhou-se entre mangueiras, cajueiros, sapotizeiros e estacionou seu 1.82m, atrás de um umbuzeiro que “conversava” baixinho. Lá estava a bela, a belíssima Margarete, iniciando uma “luta corporal” com João do Feijão.

Homem precavido e sabedor do que pretendia, Duzinho irrompeu a cena comum dessas novelas repetitivas, onde o casal canastrão é idolatrado pelo público para surpresa dos dois enamorados. Tentando salvar a situação o galã gritou “sou eu seu Duzinho,  João do Feijão!” e Duzinho “eu sei seu miserável,  mas vá plantar seu feijão em outro lugar. Na minha filha não” e baixou o porrete...

 

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