"Sou loiro - grisalho
-, tenho olhos azuis, 1,80 m de altura, peso 80 quilos e o meu tipo sanguíneo é
O negativo. Possuo ascendência portuguesa, inglesa, alemã e indígena."
Com esse texto, o analista de sistemas João Carlos Holland, de 61 anos, anuncia
a si próprio em grupos de doações de espermatozoides em redes sociais.
Acredita-se que ele seja um dos maiores doadores de sêmen para inseminação
caseira. Iniciou a prática em outubro de 2015, e desde então acredita ter
conseguido colaborar com a gravidez de ao menos 24 mulheres, a partir de cerca
de 150 doações feitas até o início de novembro.
Na inseminação caseira, o doador coloca o esperma em um pote de coleta
de exame - para preservar o conteúdo - e o entrega à mulher, que precisa estar
em período fértil.
Esse é o único contato que os dois mantêm durante o procedimento. Em
seguida, ela introduz o líquido na vagina por meio de uma seringa - prática
considerada insegura por uma especialista ouvida pela BBC Brasil -, levanta as
pernas e permanece em posição ginecológica por aproximadamente 30 minutos.
Cerca de duas semanas depois, faz o primeiro exame para descobrir se conseguiu
engravidar.
Em algumas situações, a mãe e o doador fazem um contrato para definir os
direitos que o homem terá sobre a criança. Na maioria dos casos, o acordo prevê
que ele abra mão do bebê e conceda plenos direitos à mulher. No entanto, o
texto pode ser questionado judicialmente por uma das partes para exigir
direitos como pensão alimentícia ou permissão para visitar a criança.
Os casos mais comuns, entre as mulheres que decidem optar pela prática,
são de casais homossexuais. Há também solteiras, que buscam criar o filho de
modo independente. Existem ainda, embora em menor quantidade, casais heterossexuais
que procuram o método em razão da infertilidade do homem.
Segundo o Ministério da Saúde, esse método não possui nenhum tipo de
regulamentação. Mas ressalta que, por se tratar de uma decisão particular, que
a pessoa faz por conta própria, não é possível haver controle. A Agência
Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), diz que não regulamenta a prática e
não possui informação sobre o assunto. Na Justiça, por sua vez, não há nenhum
tipo de orientação que criminalize a prática.
Alheia às entidades oficiais, a inseminação caseira tem ganhado mais
adeptos. No Facebook, grupos e páginas sobre o assunto vêm crescendo nos
últimos meses. Há grupos com mais de 5 mil integrantes.
Dono de uma página dedicada ao tema, Marcos*, que afirma ter 32 anos e
ser servidor público, diz que a maioria das mulheres que chega até ela
"não pode fazer o procedimento em clínicas particulares, por conta do
custo elevado".
Uma
fertilização in vitro custa, em média, R$ 15 mil.
'Praticando
a imortalidade'
Nas páginas e nos grupos, um dos nomes mais conhecidos é justamente o de
Holland, em razão dos diversos casos de doações que resultaram em nascimentos
de bebês.
"Fico muito feliz em ajudar as mulheres a realizarem o sonho da
maternidade. Acredito que estou exercendo a empatia e praticando a
imortalidade, porque, quando eu morrer, meus genes vão ficar com todos os
filhos", diz.
Além das inseminações caseiras, Holland tem 15 filhos com quatro
mulheres com quem já se relacionou. Ele conta que sustenta 13 deles - dois são
maiores de idade e independentes. O analista de sistemas hoje é casado, e sua
mulher é a maior incentivadora das doações de sêmen. Ela é a responsável por
agendar os procedimentos - são ao menos seis por mês - e recepcionar as
mulheres.
As doações de esperma são feitas na casa de Holland, em São Paulo. As
mulheres ficam em um quarto, destinado somente à prática, enquanto ele e a
esposa mantêm relação sexual em outro cômodo. A esposa dele entrega o sêmen à
mulher, que então realiza a inseminação caseira.
Ele costuma fazer exames clínicos uma vez por ano, para atestar que está
com boa saúde. "Como é um procedimento feito por meio de seringa, e eu não
tenho contato direto com a mulher que quer engravidar, acredito que os exames
não precisam ser tão frequentes", justifica.
O analista de sistemas assegura que não cobra pela doação, pede somente
que as mulheres paguem uma taxa diária de R$ 100 para permanecerem na casa.
Muitas delas passam até cinco dias ali, pois vêm de outros Estados - ele já
doou para moradoras de Rio de Janeiro, Goiás, Bahia e Pernambuco, entre outros.
Holland exige que a receptora seja maior de idade e informe sobre o
nascimento do bebê, caso o procedimento dê certo.
"Não avalio questões financeiras, pois muitas delas têm baixo poder
aquisitivo. Sei que elas querem muito se tornar mães, então fico tranquilo,
pois tenho certeza de que vão amar muito seus filhos. Tenho pena dos bebês que
nascem 'por acaso', sem que as mães queiram, porque sei que são crianças que,
mesmo com dinheiro, vão sofrer por falta de amor."
Ele não faz nenhum tipo de contrato com as mulheres para as quais doa
sêmen, mas pede a elas que não cobrem pensão alimentícia no futuro. "Se
isso acontecesse, eu não teria condições de continuar doando, pois já são pelo
menos 24 crianças, além das doações em que as mulheres não nos contaram se deu
certo."
Em alguns casos, após o nascimento as mães pedem para que ele assine um
termo no qual abre mão da paternidade. "Eu sempre assino, sem
problemas."
Há também situações, diz, em que elas pedem que Holland registre a
criança. "Isso aconteceu duas vezes. Eu concordei e fui ao cartório
registrar, junto com a mãe."
Mas o analista
de sistemas também conta ter virado alvo de críticas por sua decisão de se
tornar doador de sêmen.
"A minha família acha que isso é loucura. Meus colegas de trabalho
também não entendem. Eu compreendo quem pensa assim - é porque são pessoas
criadas em uma cultura capitalista e individualista, em que filhos, muitas
vezes, são sinônimos de despesa e de problemas futuros. Então é normal que
fiquem estupefatos." Leia matéria completa no BBCBrasil.BBCBrasil
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