sexta-feira, 17 de agosto de 2018

Gritemos, antes que sejamos mortos

O Brasil atingiu o recorde de 65.517 mortes violentas, segundo o Mapa da Violência, de 2018. Um genocídio. Mata-se por pouco e morre-se por nada, em média de 153 pessoas por dia. Somos todos vítimas potenciais, e contamos com a sorte cotidiana para enfrentar a roleta russa diária, das mais diversas formas de agressões. 
De tanta violência, de tantos casos aberrantes, estamos desenvolvendo técnicas de sobrevivência, que vai de segurança armada, grades, cercas elétricas, carros blindados, horários de circulação, até a simples oração entre os que têm menos recursos. E, assim, perdemos o sono, enquanto os filhos não chegam, à noite; evitamos ruas escuras, andamos correndo e vigilantes,  evitamos lugares vazios, saímos de qualquer lugar para entrar no carro com a agilidade de um atleta e o olhar desconfiado de um espião, tentamos evitar rotinas e muitos, com mais recursos, sequer desfrutam do patrimônio que possuem. Vivemos em estado de alerta constante, de sobressalto, pela permanente ameaça.

Ano após ano, os números vão se agravando, mas além da dureza dos dados, e dos  milhares que choram seus mortos- mais de 55% são jovens-, o que impressiona,  é a passividade com que somos abatidos  e a indiferença com que somos tratados por nossas autoridades. Nós não reagimos, não cobramos dos agentes do poder nenhuma ação, nenhuma proposta. Dia após dia, debatemos com ferocidade questões como banheiro trans, como se isso fosse mais letal do que as balas que nos atingem. Fingimos não serem os governantes, os responsáveis, e eles fingem não ter nada com isso.
Estamos diante de uma emergência nacional, com o poder das facções arregimentando milhares de presos, expandindo-se, nos levando a uma taxa de morte por cem mil habitantes que é 30 vezes maior do que na Europa; a um país que não produz drogas, mas que é um dos maiores exportadores. E ninguém, absolutamente ninguém- nem Executivo, Legislativo, ou Judiciário- propõem nenhuma ação.
Não é possível termos um Congresso calado e omisso, um Judiciário que se dedica ao ativismo ideológico e comportamental, e relativiza seu papel nesse tema, e um Executivo ocupado em lotear o poder e as verbas enquanto nós, que  pagamos elevados  impostos vivemos  o inferno da insegurança.
Não é possível que não se proponha um plano de segurança nacional, que não se crie forças-tarefas coletivas das instituições, que o dinheiro ilegal circule com uma liberdade que a Receita Federal não permite a quem esquece um recibo de dentista, que não se intervenha no sistema policial e no carcerário para mudar sua lógica, que nosso sistema de fronteira seja uma peneira sem lei, que não se busque reunir especialistas, contratar consultorias, de quem teve experiências exitosas. Desse ponto de vista, as Unidades Pacificadoras e a intervenção federal, no Rio, foram, ao menos, uma tentativa. É preciso analisar o que deu certo e errado, nessas experiências e criar um projeto de ação nacional, com as múltiplas intervenções necessárias.  A única opção que não é possível é manter o amofinamento e a omissão atual, enquanto as pessoas vão sendo mortas e seu patrimônio dilapidado.
Nós temos que gritar, nós temos de exigir, nós não podemos continuar a sermos mortos sob a cumplicidade imoral, antiética, e incompetente, de nossos Três Poderes. Vamos gritar juntos. (T. Feirense)

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