A ex-senadora Marina Silva viveu uma
experiência intensa na última eleição. A morte de Eduardo Campos foi perda
pessoal, além de política. Depois enfrentou a artilharia de uma campanha que
não conheceu limites éticos e foi acusada de pretender fazer o que jamais
admitiria: retirar comida dos pobres, ou livros de estudantes. Na sua
experiência de vida, ela conheceu a falta de alimentos e livros.
Depois da eleição, ela se recolheu para
escrever um pouco. Marina enviou ao blog um poema escrito nesse período de
reflexão. Como faz em momentos de intensa experiência, dolorida ou alegre, de
encantamento ou de profunda decepção, Marina Silva recorre à linguagem poética
para falar consigo em baixa voz e, ao mesmo tempo, anunciar o que ocupa sua
mente e sua alma.
O poema abaixo emerge da experiência desta
eleição. No plano humano essa experiência rara, posto que possível para muito
poucos, tem dimensões que nem sempre são sequer vislumbradas pela maioria das
pessoas. Por isso esse poema que aqui publico é carregado de mais do que a
poesia, é testemunho dado de uma perspectiva muito singular, é recurso pessoal
de uma sensibilidade para atravessar momentos intensos e, embora profundamente
íntimo, é também de interesse público.
Sinos dobrarão por ti
quando a vida já não for
de esperança -só medo,
de alegria -só dor,
nesse Brasil dividido,
e entregue a seus temores?
É estrela o que ainda brilha
ou reflexo de lentilhas
-da alma que se trocou
por um pedaço de pão-
caído no mesmo chão
onde o verbo foi senhor?
Detém o ódio, liberta o amor,
lembra a canção, seca o pranto,
traz à presença o calor
da mão que um dia afagou
teu mais real desencanto.
Deixa que o brilho da alva
traga da paz plena calma
ao coração sofredor.
Canta ainda, alma moída,
não deixa cessar a vida
que a liberdade pariu,
que o perdão redimiu,
que a promessa guardou
nas passagens desse tempo
de um Brasil sonhador.
Publicado no blog http://www.matheusleitao.com.br/
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