Ana Arruda
Callado, jornalista e escritora, foi a primeira mulher a ocupar a chefia de
reportagem de um jornal no Brasil. A viúva do escritor Antônio Callado esteve
recentemente em Londres e visitou a BBC, onde Callado trabalhou de 1942 a 1947.
Ela compartilha aqui com a BBC Brasil sua história de pioneirismo no
Jornalismo:
Em 1966, o Diário
Carioca, um jornal com grande prestígio na cidade e que se vangloriava de ser
pequeno - tinha apenas 12 páginas -, iniciou uma reforma.
O novo dono,
Horácio de Carvalho, chamou o jurista Prudente de Morais Neto para a direção do
jornal. Este escolheu Zuenir Ventura, que havia se destacado na Tribuna da
Imprensa, para a Chefia de Redação. E para a Chefia de Reportagem? Discutiram o
tema e chegaram a um nome: Ana Arruda, que no Jornal do Brasil havia assinado
reportagens importantes.
Houve grande
propaganda em torno do fato de uma mulher, pela primeira vez, ter ocupado esta
função. Um jornal inovador, foi a mensagem. Para mim, um desafio e uma comprovação: eu tinha
chegado lá; estava entre os jornalistas que admirava.
Sofri, em
Belém, por parte do assessor de imprensa da prefeitura um assédio que me fez
muito medo. 'Você acha que me engana com essa história de repórter? Mulher
viajando sozinha eu sei o que é' - foi a abordagemAna Arruda Callado
Eu havia
feito vestibular para o Curso de Jornalismo da Faculdade Nacional de Filosofia
no início de 1955. Terminara o Curso Científico no Colégio de Aplicação da
então Universidade do Brasil e não perguntem por que escolhi ser jornalista,
quando minhas disciplinas preferidas no colégio eram Matemática e Física.
Ninguém mais
do colégio optou por esse caminho. Na turma da FNFi, as outras mulheres eram
funcionárias públicas que buscavam um diploma para ascender no emprego. Uma
única, Mary Akierstein, queria, como eu, seguir a carreira. E seguiu, por pouco
tempo, e hoje é Mary Ventura, esposa de Zuenir.
O curso
universitário era apenas uma etapa necessária para conhecer melhor a profissão
e amadurecer um pouco. Afinal, eu tinha apenas 17 anos. Mas estava decidida,
apesar de ninguém da minha família ter seguido o jornalismo. Sendo uma das doze
filhas de meus pais (eles tiveram e criaram bem ainda mais três homens), ouvi
daquele pernambucano nascido no final do século 19 o seguinte conselho:
"Estudem, minhas filhas, tenham uma profissão, ou vocês vão ser escravas
de homens".
Havia tido, anos
antes da faculdade, uma experiência marcante. Era da Ação Católica e um dia
apareceu, em uma de nossas reuniões, um rapaz chamado Cícero Sandroni, com um
convite. Estava sendo criado um jornal do movimento, o Roteiro da Juventude, e
precisavam de colaboradores. Imediatamente me apresentei. Além de Cícero,
trabalhava no jornalzinho uma moça do Colégio Sion, Laura Austregésilo de
Athayde, filha do conhecido jornalista e mais tarde presidente da Academia
Brasileira de Letras.
Fiz umas
pequenas matérias até que, um dia, surgiu a grande oportunidade. Cícero queria
ir ao cinema com a moça, mas esta, séria, impôs uma condição: só aceitaria o
convite se o jornal já estivesse, como ele havia prometido, na gráfica. Ele
pediu minha ajuda e lá fui eu conhecer pela primeira vez um jornal de verdade,
a Última Hora, e logo pela oficina.
Os gráficos
me ajudaram muito, achando graça naquela menina metida a jornalista. Fechei o
jornal - e Cícero e Laura estão casados há mais de 50 anos.Leia mais no BBCBrasil
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