quinta-feira, 24 de março de 2011

Luau na Baía de Todos os Santos



A varanda do Boteco do Vital é um local pródigo em pacotes turísticos. Às vezes até parece uma agência de viagens tais são os roteiros mirabolantes de viagens fantásticas programadas ao embalo de reuniões sócio-etílico-culturais dos seus frequentadores. Sentados ali já viajamos pela ‘Oropa’, França e Bahia, sem sair das nossas cadeiras. Roteiro escolhido, viagem marcada, prego batido e ponta virada. Mas no dia aprazado ninguém aparece para embarcar.

Eu sou um dos poucos que destoam dessa estória, porque ainda teimo em honrar compromissos e realizar o que planejo. “Se Anália não quiser ir, eu vou só”, já cantava Dorival Caymmi. Quando alguém inventa uma viagem, nem que seja pra Chácara de Caguto, ali em São Gonçalo, eu vou. E quem quiser ir mais eu vamo, quer ir mais eu vombora. Porque eu, já fui.

E foi assim que se assucedeu quando Walter Pankeka convidou os amigos do “Clube dos Cafajestes” para participar de um luau a bordo de uma escuna na Baía de Todos os Santos. Todo mundo se animou, inclusive eu, mas, depois percebi que na data marcada eu estaria em São Paulo. Mas, para minha surpresa, numa deferência toda especial a mim, Walter disse que eu era quem escolheria a data, contanto que fosse de lua cheia.

Conferi no calendário e a próxima lua cheia era no dia 19 de março. Sem atentar para o fato de ser “Dia de São José”, que quase que invariavelmente chove, abrindo as águas de março, acertamos a viagem. Como sempre, na data marcada ninguém estava lá. Só eu, teimoso como uma mula, entrei num ônibus para Salvador e fui encontrar Walter. Quando saí de Feira de Santana já estava chovendo.

Chegando lá, encontrei Walter e fomos para a praia, pois o sol, por volta das 13 horas, já começava a aparecer. É válido salientar que também os amigos de Salvador não confirmaram presença no passeio. Tomamos umas e outras, fomos até um restaurante comer umas lambretas, conversamos, nos divertimos e, por volta das 17 horas, fomos para casa nos preparar para o passeio. Aquela altura o sol já tinha brilhado forte e o céu era de brigadeiro.

Chegamos ao cais e um garoto se aproximou, olhou para a cara de comendador de Walter, com aquele vasto bigode grisalho, e perguntou se era ele “o homem do passeio”. Claro! Como dizer que não! O garoto então nos conduziu a um estacionamento particular onde deixamos o carro. Já no cais, a escuna estava atracada, esperando os passageiros para o tão esperado passeio.

Walter procurou um cidadão e perguntou a quem ele deveria pagar a passagem. “Alguém vai procurar o senhor aí. Pode ficar tranquilo”, informou o sujeito. Embarcamos. A escuna demorou ainda um pouco para sair, porque esperava por alguns músicos. Mas logo chegaram e a viagem começou, com direito a boa música, ao vivo, e farto buffet. Ainda meio ressabiado quanto ao pagamento, vi algumas pessoas pegando cerveja num freezer. Aproximei-me e perguntei a um cidadão como faria para poder pegar uma latinha. “Pode pegar ai”, disse ele. Não me fiz de rogado, peguei duas e levei uma para Walter
.
Uma mulher se aproximou com uma bandeja servindo salgadinhos, e eu perguntei quanto era. “Ora, o senhor já pagou pelo passeio, pode pegar à vontade”. Walter pegou um pastel e saiu procurando alguém que lhe dissesse como pagar pelo passeio. E novamente alguém lhe disse que ficasse tranquilo que no devido momento seria cobrada a taxa de R$ 70,00. Tudo bem. Já que é assim, vamos cair na gandaia.

Gente que só a zorra, mulher dando no meio da canela, bebida e comida á vontade, e aquela imensa lua cheia a iluminar o mar. Já fazia um bom tempo que a gente navegava e eu fui ao banheiro. Foi quando senti um tombo. Perguntei o que foi e um tripulante me disse que o barco havia encalhado num banco de areia.

Quando subi para o convés Walter, com sua experiência de ex-proprietário de escuna, já acalmava os mais nervosos, explicando: “Calma gente. Hoje é uma data especial, em que a lua se encontra mais próxima da terra (fenômeno conhecido como super lua), e isso afetou a maré, que baixou demais. Logo a maré vai subir novamente e a gente sai daqui. Aproveitem a festa que não há perigo nenhum”. E eu gritei de lá: “Falou o velho lobo do mar”.

E parti para pegar outra cerveja. Na volta, com uma latinha em cada mão, tive que passar por um lugar estreito onde as pessoas se espremiam para passar uma pelas outras. E no barco havia uma coroa fogosa que parecia estar no cio, arrastando a asa pra todo mundo. E foi justamente por ela que tive que passar. Só que ela estava de costas, e quando eu fui passando o barco deu um solavanco e eu fui direto me encaixar na traseira da coroa. Pedi desculpas e sai meio desconcertado, mas ela me olhava e ria com cara de tamanha felicidade que Walter disse: “Agora ela vai lhe alugar o resto da viagem”.

Algumas horas depois a maré subiu e o barco desencalhou, continuando o passeio. Àquela altura eu já nem me lembrava do pagamento, mas, quando o barco atracou no cais, eu disse comigo mesmo: “Agora é que deve começar a cobrança”. Mas, todo mundo foi saindo e indo embora sem pagar nada. Eu olhei para Walter e disse: “Vamos embora também”.

Descemos a rampa sem sermos incomodados, e quando chegamos à saída do cais, Walter encontrou o sujeito ao qual ele havia perguntado pelo pagamento, bateu no ombro dele e disse: “Quando tiver outro pode contar com a gente”!

Os amigos que ficaram em terra não sabem o que perderam.

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