quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Parabéns a todos os colegas médicos!!


César Oliveira
É impossível atravessar a vida sem um médico, ou vários, para chamar de seu: seja ao nascer, viver, ou partir. O médico, no exercício pleno do ofício, é o aliado mais próximo de combate aos moinhos das ameaças, um Quixote que sabe que um dia perderá, mas que segue adiando a derrota inevitável, dia após dia, cuidado após cuidado. Todo médico é, em essência, um confessionário, onde a fragilidade desnuda-se e apela por proteção, e compreensão, sem julgamento; e onde as lesões devem encontrar a cura, algumas vezes; o alívio, frequentemente; o consolo, sempre.
A referência mais antiga a essa citação é do século XV, em francês (Guérir quelquefois, soulager souvent, consoler toujours), mas já deve ser uma provável tradução do latim medieval, já que nele existe a frase medicus quandoque sanat, saepe lenit et semper solatium est”: o médico às vezes cura, muitas vezes alivia e sempre é um consolo. Há traduções em outras línguas, como inglês: "To cure sometimes, to relieve often, to comfort always"; italiano: "Guarire qualche volta, alleviare spesso, confortare sempre"; espanhol: "Curar algunas veces, aliviar frecuentemente y consolar siempre". Embora com variações e muitos médicos enganosamente apontados como autores, inclusive, Hipocrates, ela contém as lições que nos balizam, ainda que seja um novo milênio.

Ao médico que pensa ter chegado ao Olímpo- sim, somos senhores de pequenos milagres- ela sinaliza que a cura é pontual e que o desconhecido é sempre maior do que o saber dominado, que somos limitados e imprecisos e que só a reinvenção permanente e obsessiva do estudo, do esforço, da humildade do conhecimento, pode nos distanciar do erro, da imperícia e da negligência. "A vida é breve, a arte é longa, a oportunidade passageira, a experiência enganosa, e o julgamento difícil", ensinava Hipócrates, na frase que Sêneca popularizou. A soberba - em alguns, por imaturidade emocional; em outros, por defesa prévia-, nem aprimora, nem protege, e sempre é preciso lembrar como diz o personagem Aranha, o super-herói: com grandes poderes vêm grandes responsabilidades.
Por outro lado, somos técnicos submetidos a condições massacrantes de trabalho, com sacrifícios permanentes de horários, em uma atividade de alta letalidade, urgente, tensa, que não permite o erro, sob a ameaça da lei e da consciência. E mais: que por motivos diversos aceita trabalhar em condições de absoluto improviso e inadequação. Apesar da roleta russa profissional cada um traz na memória prodígios realizados a partir do mínimo e da escassez, e, pelo menos a prática do alívio, quando impedidos de curar.
Se o conhecimento e a tecnologia crescem de forma exponencial ainda somos os mesmos humanos: indefesos diante da doença, frágeis diante da dor, desamparados diante das perdas. Por isso buscamos nos médicos a salvação da vida, sob risco iminente de morte; o alívio do sofrimento que amputa a soberania do corpo; e a especiaria do amparo para a alma quando ela parece liquefeita.
Por isso, para isso, e só por isso, somos médicos, mas só iremos longe se não esquecermos nunca que estamos apoiados sobre os ombros de um gigante: a Medicina.

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