segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Ensinar os filhos em casa ganha força no Brasil e gera polêmica


Fotos Mariana Della Barba/BBC Brasil
Uma nova batalha vem sendo travada dentro e especialmente fora das salas de aula do Brasil. A polêmica gira em torno da chamada educação domiciliar, em que famílias optam por ensinar seus filhos na própria casa e não na escola.

De um lado da trincheira estão pais que defendem o direito de eles próprios - e não o Estado - decidirem como e onde os filhos serão educados. Ao se dizerem insatisfeitos com o sistema educacional do país, eles mostram aprovações dos filhos em exames como o Enem para corroborar a eficácia da educação domiciliar.
No outro lado da disputa estão o governo e alguns juristas alegando que tirar uma criança da escola é ilegal, além de alguns educadores, que criticam a proposta, especialmente com argumento de que essa prática colocaria as crianças em uma bolha.
Mais sedimentado em países como os Estados Unidos, o homeschooling (como também é conhecido pela expressão em inglês) vem ganhando fôlego no Brasil. Segundo a Aned (Associação Nacional de Educação Domiciliar), há mil famílias associadas no grupo. Mas Ricardo Iene, cofundador do órgão, calcula que, pela quantidade de e-mails que recebe, sejam mais de 2 mil famílias educando seus filhos em casa no Brasil.
O movimento também está conquistando espaço na esfera política. No próximo dia 12, haverá uma audiência pública em Brasília para discutir o tema, na Comissão de Educação e Cultura da Câmara. Na pauta, estará também o Projeto de Lei (PL) do deputado Lincoln Portela (PR-MG), que autoriza o ensino domiciliar.
Advogados da Aned veem na própria Constituição brechas que defendem o direito da família de educar seus filhos (veja box), mas a associação acredita que uma lei específica daria mais segurança aos pais que optam por esta modalidade de ensino.

Por que em casa?

"Quando meu filho tinha 7 anos, um garoto da escola, que tinha 10 anos, batia nele e o perseguia por causa do nosso sotaque baiano", conta Ricardo Iene, cofundador da Aned (Associação Nacional de Educação Domiciliar), que é natural da Bahia, mas mora em Belo Horizonte (MG) há cinco anos. "Também havia um garoto que ficava assediando milha filha."
Ricardo tirou os filhos Guilherme e Lorena da escola por estarem sofrendo bullying
"Fui várias vezes na escola, reclamar, conversar, tentar resolver esses problemas. Mas nunca adiantou."
O bullying foi um dos motivos que, há três anos, influenciou Ricardo a tirar da escola, Guilherme, de 13 anos, e Lorena, de 15 anos. Mas certamente não foi a única motivação. Tanto para o publicitário que vive em BH como para outros pais ouvidos pela BBC, é sempre um conjunto de fatores que o impulsionam a tomar essa decisão.
Mas um deles parece estar sempre presente: o desejo de estar mais envolvidos e presentes na criação dos filhos.
"Vemos crianças hoje em dia que entram na escola às 7 da manhã e ficam até bem depois das 17h ou 18h, porque elas ficam fazem balé, natação e várias outras atividades. Além da agenda cheia como a de um adulto dessas crianças, mal sobra tempo para o convívio familiar", diz M.L.C, mãe de 4 filhos, todos em homeschool, que não quis se identificar por temor de ser denunciada.

Limbo jurídico

Se, no campo da educação, há uma disputa de argumentos pró e contra o homeschool, na campo jurídico ela é ainda mais acirrada.
O governo afirma que a prática é ilegal. Consultado pela BBC, o Ministério da Educação respondeu: "O MEC entende que a proposta de ensino domiciliar não apresenta amparo legal, ferindo o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), a LBD (Lei de Diretrizes Básicas) e a própria Constituição Federal."
De acordo com a LDB, "é dever dos pais ou responsáveis efetuar a matrícula das crianças na educação básica a partir dos 4 anos." O ECA afirma que "pais e responsáveis têm a obrigação de matricular seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino". E o artigo 246 do Código Penal traz detalhes do que chama de abandono e intelectual, para os casos de quem deixa de prover instrução.
No entanto, advogados de famílias que praticam educação domiciliar citam interpretações na lei e lacunas jurídicas que, segundo eles, tiram a prática da ilegalidade.
"Segundo a Constituição, a educação é direito de todos e dever do Estado e da família", diz Alexandre Magno, diretor jurídico da Aned. "Então, o que está na Constituição se sobrepõe sobre o ECA e a LDB. Portanto, se os pais têm o dever de prover educação, têm soberania e liberdade para poderem escolher entre delegar a instrução para uma escola ou eles próprios se incumbirem disso."
Esse limbo jurídico também é reforçado por exames como o Encceja (Ensino Fundamental) e o Enem (Ensino Médio), que certifica alunos que completarem um determinada pontuação mesmo se não apresentarem diplomas das escolas. Algo que, para Alexandre, seria um aval para a educação domiciliar.
Ricardo também sentia falta do envolvimento de outros pais quando frequentava as reuniões na escola dos filhos, tanto das instituições públicas como das particulares. "Muitos pais nem participavam. E aí, ficava ainda mais difícil melhorar a situação da escola."
Outro ponto que impulsionou o publicitário e outras famílias a optarem pelo homeschool é o fato de não concordarem com alguns valores morais passados na escola. Ricardo diz que ele e outros associados da Aned costumam se incomodar especialmente com a abordagem de temas como sexo e homossexualidade. 

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