quinta-feira, 20 de setembro de 2012

O carteiro, a patroa e a empreguete



         Dona Susancleide era casada como Senhor Esperindeus há mais de três décadas. Aos 55 anos ela ainda conservava traços da beleza que ostentara na juventude. Seu corpo ainda era bem delineado e nem a menopausa arrefeceu de todo a sua libido. Por isso mesmo ela tinha sonhos calientes nas noites tépidas desse patropi ou mesmo no frio do inverno. Sonhava com as aventuras vividas com o marido, ainda jovens, em viagens de ônibus que cortavam estradas nas madrugadas com destino a paraísos de sol e liberdade, onde a lida diária ficava para trás e a mão atrevida do jovem marido lhe causava arrepios de tesão inontida.
 
         O senhor Esperindeus do alto dos seus 60 anos “bem vividos”, como se orgulhava de afirmar, era um homem recatado, austero honesto funcionário da Fazenda Pública, que em toda a sua vida laboral só faltara ao trabalho no dia do seu casamento e quando seus pais faleceram. Era também membro da Loja Maçônica Areópago Feirense, irmão da Santa Casa de Misericórdia, membro do Rotary Clube e fiel fervoroso da paróquia de Santana dos Olhos D’água.

         Com todos estes predicados, não admitia desonestidades ou traições conjugais. “Um homem tem que garantir as calças que veste”, repetia sempre, disposto a servir de exemplo para seus semelhantes, principalmente para os jovens afoitos. Embora admitindo que “gozou” muito a juventude, orgulhava-se de nunca ter pulado a cerca em todos os seus anos de homem casado e pai de família. “Cleidinha é a mulher da minha vida. Não preciso de mais ninguém”, dizia sempre, referindo-se carinhosamente à esposa.

         E dona Susancleide era mesmo tudo o que o marido falava dela. Esposa fiel, trabalhadora, mãe amorosa e amante fogosa. Para ela, era Deus no céu e  marido na terra. Mas já havia cerca de dois anos ou mais que um probleminha estava afligindo dona Susancleide. Inicialmente ela suspeitou que o marido estava pulando a cerca, mas, logo constatou que a idade finalmente o estava vencendo. Resolveu então buscar auxílio profissional e abriu seu coração com a Dra. Regina Falcão de Orleans e Magalhães, sua ginecologista.

         Profissional cônscia das suas limitações e responsabilidades, a Dra. Regina recomendou que dona Susancleide convencesse o marido a consultar um médico especialista em Reprodução Humana. Também indicou um colega e deu a dona Susancleide algumas publicações especializadas, tomando a precaução de informar que o problema poderia estar na mulher e não no marido. “A senhora não tem nenhum problema orgânico, mas pode haver alguma coisa na senhora que pode não estar agradando ao seu marido”, cuidou de salientar.

         Dona Susancleide foi pra casa pensando nas palavras da médica e não perdeu tempo. À noite, os dois na cama, entre quatro paredes, onde apenas os travesseiros guardam os segredos da alcova, após mais uma “brochada” do marido, ela sugeriu: “Pêpê, porque você não procura um médico? Olha, eu li numa revista que isso é normal com homens de 60 anos ou mais, e até mesmo com jovens acontece.

         “Você tá maluca Cleidinha? Vê lá se vou falar das minhas intimidades pra ninguém. Vai que esse doutor dá com a língua nos dentes e me desmoraliza? Eu viro alvo de chacota de toda a vizinhança. Meus colegas de trabalho então, vão perder o respeito por mim e começar a fazer piadinhas. Não senhora. Não vou procurar médico nenhum. Isso deve ser alguma indisposição. Você vai ver. Logo vai passar”, reagiu o marido.

         Mas dona Susancleide sabia que aquilo não ia passar e que a tendência era piorar. Ela já tinha ouvido algumas amigas indiscretas falando sobre seus maridos que “brocharam” com a idade. Algumas até demonstrando alguma satisfação com isso. Mas ela não. Queria seu marido firme e forte como nos velhos tempos.

         Numa das revistas especializadas que a Dra. Regina havia lhe dado, lera um artigo sobre impotência sexual masculina e as maravilhas do Viagra. Ela não pensou duas vezes e mostrou o artigo para o marido, sugerindo que ele deveria tomar aquela pílula maravilhosa. Mas, novamente, o marido reagiu mal: “E com que cara você acha que eu vou entrar numa farmácia para comprar isto? O balconista vai rir logo da minha cara e em pouco tempo a cidade toda vai ficar sabendo”.

         Mas dona Susancleide estava decidida. “Se você não compra, compro eu. Ou você prefere ser corno”? Esbravejou uma Cleidinha, atrevida (embora, interiormente nada convicta), para espanto do marido. E antes que ele tomasse fôlego para dizer alguma coisa, ela foi logo esclarecendo que iria comprar a droga em algum lugar onde ninguém a conhecesse.

         Comprou, o marido tomou, e novamente brochou. O caso era mais sério do que se pensava. Foi aí que ela, lembrando da Dra. Regina, de que o problema poderia estar nela e não no marido, lembrou-se também de uma amiga que lhe falara sobre as fantasias sexuais que realizava com o marido, para não deixar arrefecer o fogo do amor.

         Segundo a amiga, quando o sexo começava a cair na rotina, ela e o marido fantasiavam. Ela se vestia de odalisca e dançava a dança do ventre pra ele. Outra vez ele se vestia como um cowboy (ela tinha tesão por cawboys), e entrava pela janela do quarto no meio da noite como quem iria ter um encontro com a amante cujo marido estava em viagem. E assim, encenando papéis despertavam a libido e tinham fantásticas noites de amor.

         Dona Susancleide expôs então um plano para o marido: Aos sábados a empregada só trabalhava até o meio dia e os filhos só os visitavam aos domingos. Então, ela estaria só em casa. Ele deveria se vestir de carteiro (ela havia lido um conto erótico em que a esposa traia o marido com um carteiro) e entraria pela janela do quarto, onde ela seria “surpreendida” pelo amante. Embora relutante, o marido aceitou.

         No sábado, perto do meio dia, ele saiu de casa dizendo que iria beber com os amigos e que só voltaria no final da tarde. Mais tarde, deduzindo que a empregada já teria indo embora, ele cumpriu com o script. Entrou pela janela do quarto do casal, vestido de carteiro, e surpreendeu a “amante” com quem viveu uma intensa tarde de amor.

         Naquele dia, dona Susancleide dormiu feliz. No domingo os filhos notaram a cara de total felicidade da mãe, e até comentaram que ela parecia mais jovem. O pai também estava mais alegre, mais solto, menos rabugento que o de costume. Na segunda-feira a empregada não apareceu para trabalhar. Quando apareceu na parte da tarde, dona Sunzancleide pediu explicações e, em resposta, recebeu um envelope cheio de fotos do carteiro entrando pela janela do seu quarto.

         Quando dona Susancleide pediu explicações, ela disse: A senhora fica aí posando de santa mas trai seu marido. E agora eu sei e tenho provas. Daqui pra frente eu quero ter vida boa nesta casa. A senhora vai fazer  meu trabalho, vai aumentar o meu salário e vai comprar boas roupas para mim, iguais as que a senhora usa. Ah! E quero perfumes também. Vai me dar tudo que eu pedir, se não quiser que eu conte tudo pro seu marido.
         “Você anda assistindo muita novela”, disse dona Susancleide antes de despedir a empreguete.

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