sexta-feira, 10 de abril de 2015

Alex Ferraz

Um país sem governo

Vejo na TV notícia chocante sobre milhões de medicamentos estocados em Minas Gerais e que não prestam mais, pois venceu o prazo de validade. Esses remédios DEVERIAM ter sido distribuídos à população, mas ficaram lá, intocados, durante mais de um ano, num imenso depósito. O prejuízo chega a cerca de R$ 13 milhões.

Mudo de canal e vejo outra notícia chocante: um menino de 13 anos morre esperando para ser transferido de uma clínica para o Hospital da Criança, em Feira de Santana, hospital este que, segundo a organização que o mantém, está praticamente fechando as portas por falta de pagamento por parte do Estado.

Ainda nem tive tempo de mudar de canal e vem a informação de que, em Ilhéus, pacientes aguardam vários dias por cirurgia em hospital porque os médicos se debatem em torno de controvérsias sobre carga horária e abandonam o serviço.

Aí vamos para o lixo, literalmente: prefeituras não acabaram com os lixões – que contaminam o ar e água e provocam doenças -, conforme determina lei que deu prazo para isso até 2014. Estressado – infelizmente nós, jornalistas que realmente se entregam à profissão, nos deixamos contaminar emocionalmente por tamanha sucessão de desordem e desgraças -, mudo de canal e eis que...Dou de cara com a notícia de que no Piauí tem uma cidade onde a prefeitura está funcionando numa casa alugada, porque a sede ficou sem luz devido a milhões em dívida para com  concessionária elétrica.

Desço e entro no carro para vir para o  trabalho, e eis que, no rádio, o comentarista fala sobre um suposto “golpe” da operadora Oi, que estaria desativando orelhões de propósito a fim de aumentar seu já imenso grupo de assinantes e destes seguir extorquindo em promoções bizarras e caríssimas.

Enquanto dirijo, ouço sobre mais caixas explodidos, policiais que mataram uma criança no Rio e ameaçaram a mãe  e agora saem de “licença médica”, milhares de pessoas ainda vagando em busca de água contaminada por causa das obras eternas da Embasa para consertar adutora e caos no trânsito na cidade de Salvador.

Aí, experimento o caos: ao subir a Rua Rodolfo Pimentel, importantíssima ligação de Avenida Bonocô com a Avenida D. João VI (em Brotas), dou de cara com dezenas de motoristas fechando o cruzamento e, presos no eterno engarrafamento daquela avenida, impedem que os carros que seguem para o lado oposto acessem a pista. Não há UM só agente de trânsito no local.  Como de resto, não se vê agentes em praticamente nenhum local da cidade, salvo quando, nas madrugadas, vão colher fortunas de quem tomou um chope.

O rádio, de novo. Uma mulher se queixa de que há meses vem solicitando uma lâmpada para uma perigosa rua de seu bairro. Ninguém resolve, assim como, aliás, jamais resolveram a péssima e perigosa iluminação  do túnel Américo Simas.

Enfim, de grandes problemas nacionais, até os mais bizarros locais, percebe-se nitidamente que a máquina pública não funciona, está desgovernada. Ninguém fiscaliza, pelo visto, distribuição de remédios importantíssimos para milhões de pessoas, e caríssimos, a ponto de eles se deteriorarem; ninguém consegue regular de verdade o sistema de transporte público; ninguém atende aos mais simples pedidos de uma população que paga altíssimos impostos, ganha muito mal e sofre em filas nas madrugadas para ser sorteada, ou não, em atendimento médico, depois de transportar-se em ônibus que são assaltados à média de seis por dia, em Salvador. Uma lâmpada! Uma simples lâmpada!

Do funcionário mais baixo, na escala hierárquica, ao chefe da seção ou secretaria, ministério, agência dita reguladora, nota-se absurdo desdém para com o atendimento daqueles que lhes pagam os salários, sejam merrecas, sejam fortunas.

Na Câmara Municipal, na Assembleia Legislativa, no Congresso, a preocupação, óbvia, é UMA SÓ: encontrar meios de ganhar cada vez mais dinheiro, fazendo tratos (ou destratos) políticos em busca do poder, na sanha avassaladora para engordar as contas bancárias dos parlamentares. Isso envolve, como sempre, a aprovação de leis, embutidas em PECs ou explícitas, favorecendo inúmeros grupos, que também vão ganhar cada vez mais.

No governo, mais taxas, mais impostos, perseguição implacável a assalariados que escorregaram aqui ou acolá e devem merrecas à Receita, enquanto a presidente sanciona lei reduzindo em 70% as multas e em 50% as dívidas históricas de clubes de futebol para com esta mesma Receita. Agora, eles, os clubes, de onde dirigentes tiram fortunas e sempre se tornam milionários, têm até 20 anos para pagar! Aliás, recentemente, uma autoridade deixou escapar e caiu nas redes sociais: “No  Brasil, quem paga imposto é otário.”

Ufa! Vamos parar por aqui e beber uma cerveja bem gelada, caríssima, por sinal. E procurar direitinho o bar, porque podemos ser assaltados ou massacrados no bojo de alguma chacina. Só assim para enfrentar tudo isso. Ou então, dar no pé para o exterior, como alguns privilegiados têm feito, cada vez mais.

Alex Ferraz é jornalista, e repórter e colunista diário da Tribuna

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