sexta-feira, 24 de abril de 2015

Brasil versus Suécia








Pode parecer o título de uma partida de uma antiga Copa do Mundo, mas refiro-me aqui a uma reportagem que assinei nesta Tribuna – sempre com muito orgulho de escrever neste jornal – e que mereceu repercussão assinada por minha querida e competente colega Lilian Machado, na edição de ontem.

Na minha matéria, reportei, com base em entrevistas e dados oficiais, sobre os salários nababescos dos políticos brasileiros, os quais, mesmo em sua maioria notoriamente não tendo base cultural que lhes permita sequer falar por cinco minutos sem cometer deslizes gramaticais, para não falar em outros, ganham dez vezes mais do que um professor universitário pós-graduado.

Pois bem. Na matéria de Lilian, alguns cientistas políticos contestaram a comparação feita com a Suécia, mediante entrevista que reproduzi com uma jornalista brasileira que lá vive há vinte anos, onde ela relata, inclusive em livro que escreveu, o comportamento ético, sóbrio, elegante, dos políticos suecos.

Eles lavam suas próprias roupas, têm apartamentos modestíssimos e escritórios espartanos. Os cientistas baianos disseram que não há como comparar o Brasil com a Suécia e utilizaram como argumento para essa assertiva dados históricos da Suécia etc, etc. Blá-blá-blá.

Bem, em um ponto eles têm razão.Realmente não há como comparar o caráter da maioria esmagadora dos políticos brasileiros com os da Suécia, nem com aqueles do Japão, nem da Alemanha, nem da Áustria, nem da Holanda, nem da Austrália, ufa! Daria quase a volta ao mundo para parar, talvez, no Haiti, na Índia, em Bangladesh, no Panamá ou na Venezuela.

Senhores, o que na dá para comparar é o caráter, a maneira de encarar a atividade, a sociedade e suas obrigações para com ela. O que não dá para comparar é ver políticos, aqui, que vivem UNICAMENTE para locupletar-se, enquanto outros, em plagas civilizadas, têm a exata noção da sua função e de suas obrigações mínimas para com a sociedade.

O que não dá para comparar é ter políticos, legisladores enfim, que se dedicam exclusivamente a criar leis para beneficiar interesses corporativos, pagar com isso o que receberam de empresas privadas para se eleger, enfim, pessoas que não pensam um minuto sequer na situação desgraçada em que vive a maioria do povo brasileiro.

Não há história nem circunstâncias outras que possam justificar a diferença enorme entre um político de país minimamente ético do que acontece nesta bandalheira em que vivemos. Aceitar ganhar salários milionários, privilégios absurdos, ao mesmo tempo em que seus eleitores, na sua maioria, vivem em barracos aos quais chamam de casa, construídos em vielas barrentas às quais chamam de rua, mendigando atendimento médico nas madrugadas para ser sorteado e hospitais públicos, com consultas marcadas para até seis meses, ou ainda conviver com as doenças provocadas num país onde somente quarenta e poucos por cento da população tem saneamento básico, onde não há um mínimo de segurança pública, aceitar conviver com isso, sem NADA fazer para mudar, é simplesmente canalhice. Não há outra palavra.

Os cientistas que tentam justificar isso conhecem muito bem o que estou falando, sabem como as coisas se passam em outros países. Repito: a questão é de caráter. A questão é não mentir, não roubar e cuidar, de uma vez por todas, para que os problemas da população, e não os deles, políticos, sejam resolvidos.

Erodir  erário para ter apartamento de luxo, salários milionários, privilégios incabíveis e ainda mentir para a sociedade é demais. Não podemos aceitar mais isso. Nem podemos esperar mais 500 anos para que nossa colonização, pela visto nefasta, tenha suas mazelas corrigidas.

Mas, aí eu entendo, é difícil fazer isso quando temos também um povo viciado, em parte, neste tipo de relação. Um povo que não titubeia em corromper e ser corrompido, nas menores coisas, para levar vantagem em tudo.

Talvez os cientistas sociais tenham razão: a vida nossa é assim, fazer o quê? Sou um tolo, pois é.

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