quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Crônica


Os motoristas

Ser motorista já foi uma boa profissão. E ainda seria, não fossem o péssimo estado de conservação das estradas e os constantes assaltos seguidos de assassinato dos motoristas. É uma vida dura e solitária, é verdade, mas também é aventureira, romântica. Os motoristas de caminhão, em particular, são sujeitos curiosíssimos. Eles cortam o país de cima abaixo e de baixo pra cima, diariamente, comendo poeira, arriscando a vida dormindo mal, e nem sempre são bem remunerados. Mas sua solidariedade e bom humor são lendários.
Eles são narcisistas, vaidosos, consideram-se excelentes amantes, falam com sotaques diferentes, mas não negam ajuda um ao outro. Mas se tem uma coisa que um caminhoneiro preza, é o seu veículo. Um bom motorista de caminhão é como um bom vaqueiro, que cuida melhor do seu cavalo do que de si mesmo. Um caminhoneiro sabe que sua vida depende do bom estado de conservação do seu carro, e por isso tem para com ele mil cuidados.
Eu conheci um motorista que tinha uma caminhonete F 4000, com a qual ele fazia fretes entre Feira de Santana e Santo Estevão. Carregava de tudo. Leite, feijão, farinha, milho, porco, galinha, carneiro, etc. Ele levava também alguns passageiros. Mas deste dinheiro dos passageiros ele não gastava um centavo. Depositava tudo numa conta bancaria que só era movimentada para manutenção do caminhão. “Tá uma belezura, minha azulzinha”, gabava-se ele.
Já um outro conhecido nosso, tinha uma Kombi tão velha e descuidada, que quando o pessoal avistava ele vindo pela estrada, se escondia no mato, pois sabia que, se embarcasse, a qualquer momento teria que descer para empurrar a Kombi. Mas deixemos de lado os maus motoristas, e cuidemos dos bons.
Havia um cidadão que possuía uma F 4000 que ele utilizava para levar mercadorias para as feiras-livres nas cidades da sua região. Ele tinha o maior cuidado com o veículo que só ele mesmo guiava. Nem aos seus filhos ele confiava sua caminhonete. Ele também tinha um ajudante que era “tato”. Pra quem não sabe, “tato” é essa espécie de gago que fala “atim”. Deu pra entender? Por exemplo: Chofer, ele chamava de “toté”. Sacaram?
Pois é. Lá um belo dia o dono da caminhonete ficou adoentado e não poderia perder uma feira-livre de uma grande cidade das redondezas. Mandou o ajudante carregar a mercadoria e chamou seu filho mais velho, fazendo mil recomendações, para que ele fosse dirigindo o veículo. Saíram, o rapaz e o ajudante, com o dia ainda clareando. Cheio de cuidados, lembrando as recomendações do pai, o rapaz dirigia numa velocidade segura.
O ajudante, porém, sentindo que poderiam chegar tarde, começou a pressionar: “Toté, ramo andá, qui nóis tá atadado”. O rapaz começou a apertar o pé no acelerador, e ajudante foi se animando: “É isso aí toté! Bota pá lá toté! Isso é qui é toté”. Incentivado pelo ajudante, o rapaz apertou o pé ainda mais. Porém, numa curva mais difícil ele perdeu as contas e saiu da estrada, indo parar dentro de um brejo, atolando o veículo.
Quando o carro parou, o rapaz ainda pálido, assustado com a besteira que tinha feito, olhou pro lado e ouviu o ajudante protestar com sarcasmo:
“Tu é lá toté, fi da pé!”

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