*Dependências*
Vou lhes contá como
é triste,
vê a velhice
chegá,
vê os cabelo
caíno,
vê as vista
encurtá.
Do “Cordel da
Velhice” – autor desconhecido
Mesmo de óculos, penduricalho facial do qual dependo -
inseparável companheiro desde a juventude - eu não mais alcançava distinguir sem
esforço, as veias e pequenos detalhes das capas dos meus charutos.
A me propor degustá-los,
havia de trazê-los para quase junto aos olhos, com a distância usual para
aspirar seu aroma. Uma visita ao oftalmologista resolveu o problema.
Hoje, quando se fala
em dependências, raramente ocorre a imagem dos cômodos de uma casa. Acodem logo,
ideias relativas às limitações impostas pela vida: quando não forem drogas - algumas
socialmente aceitas – outras, ilícitas.
Todos conhecem a
expressão “Fulano é dependente de beltrano para tudo”. A depender do contexto, poderá
ser uma questão de ordem pecuniária, uma referência a limitações físicas, etc.
Particularmente, sou
cheio de dependências.
Sou dependente de óculos,
para meus olhos verem o carinho dos amantes.
Sou dependente das mãos,
para apalpar e sentir junto a mim aquilo que aprecio.
Sou dependente da mulher
e dos dois derradeiros filhos, trindade da perfeição, a família da melhor
idade.
Sou dependente do computador,
para quando quero, estar em contato com o mundo.
Sou dependente de meus
charutos, fiéis escudeiros e amigos de minhas jornadas interiores.
Sou dependente dos oitenta
anos vividos com seus impostores limites a joviais desejos.
Para finalizar sem
esgotar, sou dependente de meus leitores, viciado por dizer-lhes das coisas
pensadas, sem terem perguntado algo.
Hugo A. de Bittencourt
Carvalho,
economista, cronista, ex-diretor das fábricas de charutos Menendez &
Amerino, Suerdieck e Pimentel, vive em São Gonçalo dos Campos – BA.
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