![]() |
César Oliveira |
Está no Gênesis. Deus, disse: “ Que exista a luz”. E a luz existiu. E
suas palavras permitiram a vida no paraíso, sem pagode e taxa
condominial. Depois veio a Coelba e nunca mais tivemos serviço com a
mesma eficiência. Desde então, a luz se tornou nossa metáfora predileta
para justificar a esperança, acreditando que já estamos a enxergar a
luz no fim do túnel, ainda que o túnel esteja cada vez maior e a luz
cada vez mais difícil de ser vista.
Diógenes, com a luz de sua
lanterna, vagava por Atenas, procurando um homem honesto. Hoje, o grau
de dificuldade tornou-se tão acentuado que apesar de toda energia
elétrica e cósmica consumida em Brasília, ainda não conseguimos
completar sua busca. Goethe, alemão, autor de Fausto, antes de morrer,
murmurou: “Luz. Mais luz.!! Não sabemos se já enxergava do lado de lá a
volta à escuridão ou queria apenas deixar um grand finale, coisa que
sabemos tão importante quanto a biografia. Como nunca se sabe quando
vai ser nossa hora é bom estarmos prevenidos e pensando em algo, que
uma frase pode ser tudo.
A primeira luz artificial,
antropologicamente falando, foi o fogo, até que Edson inventou a lâmpada
e as concessionárias de energia inventaram a selvageria da conta. Na
evolução fomos iluminados de várias formas. Do tição ao óleo de
tartaruga, passando aqui nas bandas sertanejas, pelos candeeiros e
fifós.
Tenho terna lembrança dessa forma singela de iluminação,
porque na fazenda onde morava não tinha luz elétrica. Usávamos
candeeiros, feitos com lata de óleo e um ou outro mais sofisticado, que
ficava na sala de visitas. À noite, lia o jornal para meu pai, com o
candeeiro correndo sobre as letras, e, sei lá porque, vou escrevendo
isso aqui e sendo tomado por uma súbita emoção e uma saudade que não sei
bem do que é, que cronista, embora não pareça, também é humano e tem lá
suas fraquezas. Tinha prazer quando podia trocar o pavio de algodão que
havia apreendido a trançar, e que executava como um Da Vinci a pintar
a Mona Lisa, embora eu nem goste muito dela.
Era uma luz
acolhedora, a das lamparinas artesanais. Depois apareceu um, metido a
besta, chamado Aladim, que passou a ocupar a sala, e, só na
adolescência, chegou a luz elétrica e a televisão. Mas foi sob a luz
do pavio, que mal disfarçava a escuridão, que descobri os segredos do
corpo de uma moça escura, entre a desconfiança de minha mãe e a
cumplicidade paterna.
A eletricidade produziu muitas mudanças.
Não preciso mais bater leite na garrafa para fazer manteiga, nem raspar
das panelas, as sobras do requeijão, nem rachar lenha para o fogão. Às
vezes, durmo lá, com os filhos. A casa, atualmente forrada,
infelizmente já não deixa passar sereno pelas telhas nas noites de
chuva, - quem já morou em casa assim sabe o que estou dizendo e quem
nunca experimentou não sabe a delícia que perdeu.
Uma noite,
estávamos a beira do curral, onde ficávamos conversando. A menor
cismou de perguntar porque tinha todas aquelas luzes no céu. A Via
Láctea - corrigiu meu filho maior, chamando a irmã de burra. Na falta
do que inventar disse a eles que o céu era muito grande, infinito, mais
do que nossos olhos juntos, ao mesmo tempo, podiam ver. E todos que
tinham a alma pura, os honestos, todos que viveram seus amores possíveis
e impossíveis, todas as famílias, iriam lá, se reunir. Mas, como era
muito vasto e escuro, Deus, que amava a todos, precisava iluminar os
caminhos e por isso usava candeeiros. E que, eu os amava tanto, que um
dia andaríamos por lá, juntos. Iluminados pelo candeeiro de estrelas
Obra do mestre dos mestres da arte feirense: juracy Dorea
Nenhum comentário:
Postar um comentário