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César Oliveira |
O humano, com suas pulsões,
seus erros, só é limitado pela lei, pela fé, e, até certo ponto, pela
educação. Toda vez que começamos a ser lenientes com a Justiça, ou
sabemos que estamos fora do seu alcance; que perdemos a fé como
instrumento de moderação- o ateísmo é outra discussão-, ou, ainda,
quando a educação falha em instrumentalizar esse humano de valores - que
impõem sacrifícios necessários para conviver com o outro-, começamos a
dar vazão a essa violência despropositada.
Nosso resquício de
cérebro reptiliano reage com desenvoltura perigosa como reflexo de uma
sociedade não pacificada, conflagrada, impregnada de um discurso diário
de confronto, e egocentrismo. Em um mundo repleto de enfrentamentos
atiçamos diariamente o estreito limiar entre resistência e agressão
pura e bestial. Agressões, essas, que foram amplificadas pelas redes
sociais, em que cada um é o senhor dos gritos, e da razão, seja
individualmente, ou, coletivamente, nas seitas grupais. Essa overdose de
ódio latente cobrará, cada vez mais caro, o seu preço.
O seminal
filme , um Dia de Fúria, com Michael Douglas, de 1993, nos alertava
para essa realidade incipiente. O personagem Foster, estressado,
desempregado, divorciando-se, preso no engarrafamento, extravasa sua
raiva, de arma em punho, em uma série de incidentes.
A espiral
continua de desenvolvimento social, cientifico, tecnológico,
extraordinários, é, também, uma espiral de aprisionamentos e medos, e
sabemos que o medo é uma ilha, uma armadilha para as realizações.
Aprendemos a valorizar a individualidade, mas fomos cercados pela
solidão; libertamos o sexo de suas amarras e nos tornamos reféns das
relações líquidas, artificiais, frágeis, incapazes de uma realização
significativa e que nos deixam inseguros e oprimem. Avançamos nos
direitos, mas estamos nos tornando incapazes de qualquer renúncia
pessoal por projetos coletivos, mesmo que a dois.
Essa vida em
que cada vez parecemos menos com senhores de nosso destino gera uma
insatisfação permanente, ou exigência de suporte medicamentoso,
terapias, mas que mantém o mesmo ciclo de prisioneiros de nossa
liberdade.
Além disso, as pressões do cotidiano: emprego,
trabalho mecânico, dividas, péssimos serviços urbanos, cidade e
cidadania não acolhedora, opressiva, tornam o meio ambiente propicio ao
estresse. Por sua vez, a exigência de sucesso sem fracassos -, e sucesso
baseado em consumo desenfreado e mimético das redes sociais-, leva a um
estado de frustração, e redução da autoestima. Assim, em camadas,
vamos acumulando essa raiva latente, e ira, contra tudo, contra todos,
seja o som do vizinho, a escolha política, sexual, ou mesmo, uma
acidental queda de um copo. E a mínima perda, pode ser a gota d’água., a
gota que falta.
Nesse permanente estado de sentimentos a flor da
pele, a insanidade está sempre à espreita e a morte se torna um
encontro marcado para acontecer. O que ainda não sabemos é como iremos
nos libertar da fake liberdade que escolhemos.
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