Nossos grandes inimigos são os invisíveis, de dentro ou de fora. Nos demais que a gente bota nome e identidade, sempre dá para enfrentar ou fugir- sempre melhor um covarde vivo do que um herói morto, diz a sabedoria popular. O Dicionário da Oxford, acaba de escolher brain rot como palavra do ano. Ela significa “deterioração mental” pelo consumo indiscriminado de inutilidades e besteirol da internet. Não negue, sei que você que está me lendo já queimou pelo menos uns cem neurônios e já esteve- ou está e não percebe- com exaustão mental pela vida nas telas. O pior é que a depender do que restou de juízo em bom estado você está achando isso bom, normal e até divertido.
O manual de nossa sobrevivência inclui o autoengano como mecanismo fundamental, afinal, sem ele já teríamos pegado nosso boné e batido em retirada, por isso acreditamos escolher a vida virtual que levamos, quando não passamos de manipulação. Cada vez mais estamos nos tornando o “quê”, pois, nos transformarmos em produto, consumidores seriais, compulsivos, interessa aos donos do mundo- sim, eles existem. Do mesmo modo que o ódio- emoção mais visceral, ativa, persistente- tornou-se um instrumento político maior do que o amor- passivo, acomodado, mutável. Na atualidade todos temos algo para odiar. Sei que você vai vestir a carapuça- reconheça ao seu odiado cronista.
O inimigo invisível por trás desse esfacelamento é vulgarmente chamado pela alcunha de “algoritmo”. São sequências sistemáticas nos programas de navegação para obtenção de um resultado. Bote aí no caderninho: não existe liberdade na internet. Você não escolhe, é escolhido. A informação chega a você após vigilância, seleção, direcionamento, não ao acaso.
Por isso, precisamos denunciar o algoritmo( ou seus donos) por assédio moral, cultural, social e a broxada de domingo. Pela insônia, estouro do cartão e o Botox labial. Pelas despesas e tragédias com o chip da beleza, versão do smartphone e frustração com o tamanho do bilau. Pela inveja corrosiva da vida alheia, conta do analista, ódio ao vizinho de cima. Pela treta no condomínio, indiferença familiar, desespero emocional de seus filhos. Pelas dancinhas miseráveis, músicas ordinárias- nós vibramos na intensidade do que ouvimos- e o universo descartável. É desapegar ou ficar lelé da cuca.
Agora só preciso descobrir como fazer isso no algoritmo com o que me restou de cérebro.
𝗖𝗲𝘀𝗮𝗿 𝗢𝗹𝗶𝘃𝗲𝗶𝗿𝗮 - Tabaréu, feirense, médico, professor, apaixonado por palavras, pessoas e a vida. Sou de mato, vinhos, cafés, pratos, prosas - falada e escrita. Essa tem sido minha receita.
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