quarta-feira, 21 de novembro de 2018

A média complexidade é de alta complexidade


César Oliveira
Sou professor de Medicina. Tenho por dever habilitar as mãos e, se possível, a alma de quem passa por mim. E, por isso, sempre lhes descrevo a magnitude, a beleza, o impacto de um ato médico. Lhes digo que temos de ser maximamente eficiente e minimamente invasivos à integridade física, econômica e afetiva do paciente. É oficio obrigatório semearmos otimismo no espírito dos que começam, pois, nos diz Hipócrates: " A vida é curta, a arte é longa, a oportunidade é fugaz, a experiência enganosa, o julgamento difícil"

A falta de resolutividade no sistema público, no entanto, é dilacerante. Na atenção básica, de baixa demanda técnica, há avanços, mas a partir daí o gargalo vai se tornando cruel, limitante e letal. Na alta complexidade alguns setores conseguem resolutividade ( terapia de substituição renal, oncologia, cardiologia, próteses) , embora sem atendimento pleno.
Na média complexidade- aquela que não mata agudamente, e impacta nas mídias, mas vai lesando progressivamente-, é de uma falta de solução brutal, excludente, que nos deixa , médicos, entre o desespero e a ira, entre o desalento e endurecimento da alma pela sobrevivência
Ambulatório pós ambulatório com alunos, consultas após consultas de pacientes que nos pagam , vemos o protelamento e manutenção das hidronefroses que lesarão os rins definitivamente porque não há onde retirar os cálculos, cirurgias prostáticas que não se resolvem, doenças reumatológicas sem diagnóstico e tratamento, biópsias que não são feitas, cirurgias ambulatoriais que não acontecem, enfim, uma vastidão de procedimentos ambulatoriais que vão minando a esperança, a qualidade e expectativa de vida do paciente.
Mais que mais médicos precisamos de mais saúde, mais resolutividade, mais respeito, ao cidadão.
Na rede pública, não tem dia fácil em ser médico...

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