"O jornalismo está sendo destruído
pela internet, e isso nos leva a um futuro incerto e muito perigoso."
Esta é a visão do psicólogo Robert Epstein, doutor pela Universidade de
Harvard que se dedica a estudar a atuação nas redes sociais das gigantes
de tecnologia e defende uma interferência direta nessas empresas.
Segundo
ele, as pessoas não têm mais como discernir o verdadeiro do falso,
porque "a informação vem de todos os lados, sem os filtros, que eram os
processos de apuração do jornalismo". "Um impacto como esse (das redes
sociais) jamais existiu na história humana."
Em entrevista à BBC News Brasil, o atual diretor do Cambridge
Center for Behavioral Studies, dos EUA, defendeu que haja uma
intervenção direta nas empresas que controlam as redes sociais, para que
a disseminação de notícias falsas - as chamadas "fake news" - não
interfiram em processos eleitorais.

Ele
acusava a empresa de ter difundido notícias favoráveis à candidata
democrata Hillary Clinton no começo da campanha para as eleições
presidenciais americanas em 2016. Hillary acabou derrotada pelo atual
presidente, Donald Trump.
O
então diretor de pesquisa do Google, Amit Singhal, rejeitou as
alegações e disse que a empresa "nunca interferiu na ordenação de
resultados de buscas feitas sobre temas políticos ou algum outro
assunto, com o objetivo de manipular a opinião de seus usuários."
Epstein
insiste, porém, que o setor de tecnologia precisa de mais
monitoramento, sem o qual a atuação dessas corporações gigantescas pode
ser extremamente nociva à democracia.
Para ele, "ninguém, nenhuma empresa, nenhuma entidade deve ter tanto poder concentrado, e ficar imune ao monitoramento."
A
premissa de Epstein é que empresas como Google, Facebook e WhatsApp são
"forças do caos", que não prestam contas de suas metas e processos a
ninguém. "Elas são as forças mais poderosas do mundo atual e, com elas,
todas as redes sociais."
Epstein acredita que, atualmente, uma das
maneiras mais eficazes de exercer influência política, por exemplo, é
"doar dinheiro a um candidato para que ele use a tecnologia para
garantir sua vitória nas urnas."
Ele disse não ter se surpreendido
com a proliferação de mensagens falsas durante a campanha eleitoral no
Brasil, que para muitos foi um dos fatores determinantes do resultado
das eleições, apesar de pesquisa do Ibope ter indicado que a influência
das redes sociais não foi tão grande quanto imaginado.

Há
seis anos, Epstein se dedica a estudar a operação do Facebook e
principalmente a do Google, a maior plataforma de busca do mundo.
"Já
existia um bom volume de textos científicos sobre como os resultados de
buscas na internet influenciavam as escolhas e compras dos usuários.
Especificamente, a ordem em que as respostas às buscas eram apresentadas
acabava por determinar a decisão final do usuário."
Fascinado
pela quantidade de informação disponível, Epstein reuniu num pequeno
grupo alunos e amigos, e com eles começou a fazer testes.
Em vez
de "compras", Epstein propôs testar a influência da ordem de
apresentação dos resultados de buscas em questões políticas durante a
campanha eleitoral.
Baseado em pesquisas semelhantes, Epstein esperava um impacto entre 2% e 4%.
"No primeiro teste, a ordem de apresentação de resultado da busca alterou em 48% a intenção de voto", ele diz.
"No segundo teste, a alteração foi de 63%."
"Fiquei horrorizado", ele diz.

Em 2014, Epstein levou seu
laboratório de pesquisa para a Índia. Ele queria repetir os testes na
eleição que elegeu o novo parlamento da "maior democracia do mundo", com
815 milhões de eleitores.
"Os resultados foram idênticos aos dos
Estados Unidos", Epstein diz. "Os eleitores indianos foram igualmente
afetados pelo modo e ordem em que os candidatos eram apresentados em
buscas."
"Estas são questões muito sérias", Epstein continua,
"quem controla essas empresas? Como funcionam internamente? A quem eles
respondem? O impacto de empresas como essas jamais existiu na história
humana."
"Vivemos numa era de profundas transformações e de
poderes que jamais acreditamos ser capazes de influenciar o modo que
pensamos e que agimos", acrescenta ele.
"E o pior ainda vem por
aí", ele diz - os "realfakes" ou "deepfakes", aplicativos capazes de
criar fotos e vídeos colocando uma pessoa em qualquer cenário ou
situação, fazendo e dizendo algo que nunca teria feito ou dito na vida
real.
"Vamos começar a ver esse tipo de fakes muito em breve sendo usado em larga escala", ele alerta.
"A manipulação dos resultados de busca pela
alteração do algoritmo e pela criação de "eventos efêmeros, a capacidade
de plataformas de eliminar contas sumariamente e divulgar, através de
conteúdo fornecido por terceiros, informações falsas - como se viu
recentemente no Brasil, com o WhatsApp -, acontecem porque nossas
instituições ainda estão vivendo num mundo onde nada disso existe", diz
Epstein.
O pesquisador está, neste momento, desenvolvendo um
sistema de monitoramento de plataformas online que, segundo ele, pode
ser a única saída para conter a disseminação de informação manipulada.
"A
única solução viável que vejo são sistemas de monitoramento capazes de
captar imediatamente distorções e conteúdo falso, e fornecer provas de
ambos", diz Epstein.
"Provas substanciais, capazes de apoiar um processo legal, um litígio e outras medidas legais."
A
meta a longo prazo, ele diz, é "tornar plataformas online mais
responsáveis e dar mais apoio ao jornalismo, restaurando sua capacidade
de disseminar informação."
Mas, ele acrescenta, "um sistema
desses é caro. É preciso investimento para isso. Mas, para enfrentar a
tecnologia, só mais tecnologia".
BBCBrasil
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