A neozelandesa Idris King sofria de frequentes crises de enxaqueca quando procurou o britânico Matthew Manning,
conhecido por ter o dom da cura. Em uma sessão de menos de 10 minutos,
Manning impôs suas mãos sobre sua cabeça, e Idris sentiu seu cérebro
tremer. Depois, teve a sensação de que algo fora arrancado de sua coluna
no momento em que Manning colocou as mãos sobre seu pescoço. Saiu da
consulta e nunca mais teve uma crise de enxaqueca. Em 1988, o tratamento
espiritual de Manning ajudou o duque de Bedford na época, Robin
Russell, a recuperar a visão perdida depois de um derrame, do qual
ninguém acreditou que sairia vivo. Na realeza, o príncipe Philip, marido
da rainha Elizabeth II, também recorre ao tratamento nada ortodoxo do
britânico.
Discreto, Manning, 59 anos, atende pacientes duas vezes por semana em
uma clínica em Exmor, região rural e idílica no oeste da Inglaterra.
Seu método consiste em impor as mãos sobre o paciente por não mais que
20 minutos e canalizar o que ele chama de “um tipo de amor
incondicional”. Segundo ele, não é preciso ter fé no tratamento para que
a terapia funcione. Não há, porém, garantia de cura – ele perdeu a
mulher para o câncer há 10 anos. Também é desaconselhado abandonar os
tratamentos convencionais. O alento é o índice de acertos do britânico,
que coleciona um currículo extenso de pacientes que se dizem curados e
recebe o aval de médicos como o oncologista Karol Sikora, chefe do
programa de câncer da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Impor as mãos sobre os doentes é uma técnica milenar. De maneira
intuitiva, os povos antigos conheciam bem o poder terapêutico de impor
as mãos. Faz sentido: o tato é o primeiro sentido a ser desenvolvido e
costuma permanecer totalmente ativo até o fim da vida. Um recém-nascido
depende do toque da mãe para sobreviver – e a partir desse sentido, ele
começa a descobrir o mundo. É por esse mesmo motivo que a primeira
reação que temos ao sentir dor é colocar a mão sobre o local lesionado: o
simples ato dispara o sentido imediato de autoproteção e reduz a
ansiedade, o que tem repercussões positivas na imunidade. No Novo
Testamento, os registro dos milagres dos apóstolos de Cristo começavam
com a imposição das mãos sobre os enfermos – e terminavam com um cego
voltando a enxergar ou com os passos de um paraplégico.
No espiritismo, o passe espírita usa as mãos para transferir a
chamada energia vital. A doutrina acredita que as doenças físicas são
oriundas de doenças da alma, que podem ser tratadas por uma “energia
cósmica”, captada e canalizada pela pessoa que dá o passe. Os
umbandistas, mórmons e messiânicos também elevam os braços para tentar
curar males físicos. Até terapias sem conotação religiosa, como o reiki,
usam o mesmo método e compartilham da ideia de que não somos só pele,
carne e osso, mas também energia.
Não restam muitas dúvidas de que o toque tem um algum efeito
terapêutico. Se não pode promover curas, pelo menos ajuda no
relaxamento. A dúvida é: sujeitos como Manning, padres, médiuns e
terapeutas de reiki podem mesmo ter esse poder de curar os males do
corpo? Existe um nome para isso: psicocinese, a habilidade de fazer com
que uma intenção consciente tenha impacto no mundo e nas pessoas. Apesar
de estar associada a eventos mágicos, como queimar lâmpadas com a força
do pensamento, as evidências científicas mais contudentes são vistas em
indivíduos mesmo.

Na Rússia dos anos 20 e 30, o fisiologista Leonid Vasiliev começou a
testar a influência mental de um indivíduo sobre outro colocando
voluntários a 18 metros e a 1,6 mil quilômetros de distância. Vasiliev
identificou mudanças na respiração, condutividade elétrica cutânea e nos
estados de vigília e sono de quem recebia uma sugestão mental. Os
estudos do russo serviram de modelo para o cientista William Braud. Ele
colocou voluntários recrutados por anúncios de jornais em salas
diferentes. Nenhum possuía qualquer habilidade paranormal. Sentados em
poltronas confortáveis, um dos voluntários recebia dispositivos grudados
ao corpo, que mediam o suor, considerado um indicador de excitação
emocional. Na outra sala, o sujeito que influenciaria a mente podia se
valer de qualquer truque mental que quisesse para fazer o outro suar
mais.
Foram feitos 13 experimentos, e o coeficiente de sucesso ao acaso
esperado era de 5%, mas a taxa foi de 40%. O melhor, como descreve a
neurocientista Diane Powell em Poderes Paranormais, foi o relato dos
voluntários. Um deles disse ter a impressão de ver alguém entrando na
sala e sacudindo a sua cadeira pelas costas. A surpresa foi descobrir
que o influenciador usou essa mesma imagem mental para provocar a
alteração fisiológica remota. O estudo revela uma faceta tão
sobrenatural que parece roteiro de filme de ficção científica: todos nós
teríamos alguma capacidade de influenciar as células de outra pessoa.
Seja como for, trata-se de um experimento isolado. Não existe evidência
científica de fato.
Sucesso em laboratório
O britânico Matthew Manning deu objetivos nobres à habilidade
psicocinética que julgava ter após uma viagem à Índia, em 1977. Aceitou
passar cinco anos sendo testado por cientistas da Fundação Mente e
Ciência, do Texas, da Universidade da Califórnia e da Universidade de
Londres.
Primeiro, os pesquisadores queriam testar se Manning era capaz de
influenciar células isoladas em laboratório. Assim, eles tirariam da
jogada um possível impacto do efeito placebo, quando a crença do
indivíduo influencia o resultado de um tratamento – até hoje a
explicação mais aceita para os supostos benefícios dos tratamentos
espirituais. O teste consistia em monitorar a atividade de um tipo de
enzima, conhecida pela sigla MAO, antes e depois de Manning impor suas
mãos por 5 minutos sobre as culturas de células. A MAO está envolvida em
doenças como depressão, déficit de atenção e vícios. Em 80% dos casos, a
ação da enzima foi significativamente alterada após o trabalho do
curandeiro. Em dois testes semelhantes, Manning venceu o acaso e
conseguiu evitar a morte de hemácias e inibir a proliferação de células
cancerígenas.
Em uma sessão de reiki, a habilidade psicocinética do terapeuta
também é decisiva. Tanto que os terapeutas da milenar técnica japonesa
precisam cumprir três estágios de formação. A primeira etapa é aprender a
aplicar a técnica em si próprios. Conforme a filosofia do reiki, os
principais órgãos, glândulas e juntas do corpo são os centros de energia
(ki significa energia) e o toque gentil e concentrado do terapeuta
teria o poder de canalizá-la para promover o bem-estar.

Para testar a eficácia da técnica, o pesquisador da Universidade
Federal de São Paulo (Unifesp) Ricardo Monezi dividiu idosos em dois
grupos. O primeiro fez sessões de reiki com terapeutas com mais de 5
anos de experiência. No segundo grupo, eram atores que encenavam a
aplicação da técnica. Na comparação dos benefícios, o primeiro grupo se
saiu melhor, com uma redução significativa nos níveis de estresse e
ansiedade.
O médico Paulo de Tarso Lima, chefe do Grupo de Medicina Integrativa
do Hospital Albert Einstein, de São Paulo, acredita, porém, que a
explicação por trás dos benefícios dos tratamentos espirituais está em
um único lugar: dentro do próprio paciente. “A maioria desses métodos
estimula processos biológicos inatos de combate a doenças”, diz. “Não é o
padre, o pai de santo ou o rabino que promovem a cura. Eles facilitam a
ativação de mecanismos fisiológicos básicos, que acionam o sistema
parassimpático, que por sua vez modula a resposta inflamatória e a
imunologia do organismo contra todo tipo de doença”, defende.
Além do caso da enzima MAO, um estudo conduzido pelo médico Giancarlo
Lucchetti, da Universidade Federal de Juiz de Fora, mostrou que os
passistas, pessoas credenciadas pelo espiritismo a dar passes, superaram
outras terapias de imposição de mãos em um teste que mediu a capacidade
das técnicas para inibir a proliferação de bactérias em laboratório. Ou
seja, nem tudo é efeito placebo.
Nesse ponto, os físicos podem estar mais próximos do que os médicos
de uma resposta. No final dos anos 70, surpreso com as habilidades
sobrenaturais de Matthew Manning, Brian Josephson, prêmio Nobel de
física em 1973, se arriscou a provar a paranormalidade com a física
quântica – opção que até hoje lhe rende críticas. Para detalhar melhor
sua hipótese, Josephson comparou um surfista a um paranormal. Estranho?
Sim. Josephson explica: ao entrar no mar, um surfista aproveita as ondas
para nadar sem fazer tanto esforço. Do mesmo modo, um paranormal deve
ser capaz de redirecionar energias no nível subquântico para seu próprio
objetivo – no caso de Manning, curar dores do corpo e da alma.
Mas os cientistas não fazem ideia de que energia é essa.“Não sabemos
qualificar ainda a natureza dessa energia”, diz o psicobiólogo Ricardo
Monezi, que tem em seu grupo três físicos, um deles cético convicto,
dedicados a buscar meios para medir essa grandeza enigmática.“Precisamos
de equipamentos ultrassensíveis para mensurá-la. E eles ainda não
existem”, diz o pesquisador do Núcleo de Medicina e Práticas
Integrativas da Unifesp. (Superinteressante)
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