sexta-feira, 13 de agosto de 2010

“Um” discurso entre muitos outros


Por José Olympio Mascarenhas

Do velho Áureo, entre muitos discursos que tenho gravado, escolhi um trecho de um deles no qual está polemizando com um político adversário e conta a história do Santanópolis.

“... Não pretendo traçar um paralelo entre a minha vida e a existência de ninguém. Fui, entretanto, um menino pobre, cresci pobre, percorri ganhando modestamente com sacrifícios imensos, o pão de cada dia, os nossos índios sertões quando não dispunham ainda de estradas como um simples dentista prático. Passei fome. Nenhum desdoiro sinto em confessar. Venci todas as dificuldades e todos os obstáculos com os meus esforços. Formei-me em odontologia homem feito quando já me pesava nos ombros a responsabilidade de família. Estabeleci-me nesta cidade onde passei a exercer a minha clínica. Concebi então o grande sonho da minha vida, a fundação de um ginásio. Empreguei na sua realização todas as minhas energias. Fui tido como um visionário. Raros foram os homens que acreditaram na viabilidade da minha obra. Feira de Santana era então uma cidade bisonha cujo extraordinário desenvolvimento que a coloca hoje entre os centros populacionais que mais crescem no Brasil, nem ao menos ensaiava os primeiros passos, já haviam falhado, lamentavelmente, outras tentativas de dar a Feira um estabelecimento de ensino secundário, como o Ginásio Donato de Souza, que teve de vender móveis para pagas os alugueis da casa. Fundei, entretanto, o Santanópolis que é um dos grandes centros educacionais da Bahia. A verdade é que ao pensar em dar algo do meu a minha terra, pensei em um ginásio para a educação da sua juventude. Muitos têm objetado e possivelmente muitos ainda poderão objetar que um ginásio é uma casa de negócios. É verdade, contudo, é que podendo instalar um alambique para dar a uma cidade os instrumentos do vício e da corrupção com certeza absoluta do fácil e imediato sucesso financeiro, preferi um ginásio cujos lucros seriam incertos. O que muita não pode compreender é que o ginásio era também para mim a realização de uma vocação inelutável da qual dificilmente eu poderia fugir a de professor. Hoje sinto a satisfação imensa, o prazer insuperável de ver em centenas de moços que passaram pelo Santanópolis, brasileiros que ajudei a educar e que a minha obra deu uma oportunidade a mais na vida, aí estão todos eles, os que puderam e os que não puderam pagar os estudos que todos receberam igual tratamento, a labutar pela vida, alguns modestamente, outros ocupando posições de destaque. Sinto orgulho de todos eles, são o grande fanal da minha vida, haverão de iluminar os dias da minha velhice e aí estarão após a minha morte a atestar que eu procurei ao menos ser útil à causa da humanidade.
Estão os meus prezados ex alunos espalhados por todos os pontos do nosso imenso Brasil, exercem as mais diversas profissões, transitam, entretanto, sob o sol meridiano do trabalho honrado, orgulho-me de todos, são meus diletíssimos filhos espirituais, não procuram eles a sombra das madrugadas nevosas para esconder atividades criminosas e ilegais como os contrabandistas. O povo precisa conhecer os falsos líderes para desmascará-los. Aqueles que vêm falar em nome dos trabalhadores e nunca trabalharam, aqueles que tendo nascido em berço dourado e que se viciaram no ócio e na preguiça, jamais deram uma parcela sequer de colaboração pelo progresso, pela prosperidade e pelo bem estar do povo. Aqueles que só aparecem para tirar proveitos pessoais, sargaços perdidos na profundeza da indiferença e da misantropia, quando as paixões se encapelam e as convulsões invertem os valores morais. Aqueles falsos profetas, cristãos novos a pregar a doutrina que nunca professaram. Aqueles exploradores de fáceis emoções populares dispostos a sacrificar o povo crédulo para satisfazer a megalomania dos recalques e das frustrações, aqueles falsos líderes, enfim, que em seu descontrole podem estar pensando que realizam na vida com engodo e com a mentira, com a trapaça, um grande e decisivo papel, mas que serão tragados desenganadamente, mais dias, menos dias, pela sobra do esquecimento que encobre e faz desaparecer tudo o que é falso, inconsistente, tudo que não tem realmente autenticidade”.

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