sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Cronica da Semana


Lengo Mariano, o Bon Vivent

Lengo Mariano é realmente um boa vida. Estando em cima da terra e em baixo do céu, para ele tudo está bom. Cursou apenas o primário, que terminou a duras penas. Filho único, família não rica, mas, remediada, Lengo perdeu o pai quando ainda era adolescente. Ficou muito apegado à mãe, que protege com fidelidade e coragem caninas. Não deixa a mãe saber que ele é um depravado. Fuma, bebe e cheira. Apronta todas, mas, para a mamãe, ele é um santo.
Apesar das suas aprontações, ninguém consegue ter raiva dele. O cara é brincalhão, gozador, divertido mesmo. E, se faz mal a alguém, é só a ele mesmo. Seu pai deixou alguns imóveis, e ele vive da renda do aluguel destes imóveis. Paga as contas da casa em que vive com a mãe, cuida bem dela, e o que sobra ele gasta em farras.
Assim sendo, no mesmo momento em que ele aparece comprando fiado ou pedindo dinheiro emprestado, logo ele aparece pagando o que deve a fazendo farra, pagando bebida para os amigos. E não se furta ao trabalho, seja qual for, para angariar um dinheiro rápido. Dia desses, ele estava na praia e o dinheiro acabou. Não demorou muito e o viram numa van que faz linha entre Feira de Santana e Cabuçu, pendurado na porta, dando uma de cobrador e gritando: “Feira de Santana, quem vai”! À noite ele já estava numa barraca torrando o dinheiro que ganhou.
Certa vez, procurou uma tia e pediu a ela ajuda para comprar um carrinho de cachorro-quente e todos os aviamentos necessários. Iria pagar suas férias de verão vendendo cachorro-quente na praia. Pelas suas contas, ele pagaria o empréstimo e ainda ia sobrar dinheiro. A tia disse que financiaria o projeto, desde que levasse com ele o filho dela, seu sobrinho, vagabundo igual a ele.
Trato feito. E lá se foi Lengo Mariano e o sobrinho para Cabuçu. Os dias, os meses, foram se passando, e a tia, que se livrara da incômoda companhia do filho, recebia, com certo contentamento, as noticias trazidas pelos amigos. O negócio ia muito bem. O carrinho de cachorro-quente de Lengo só vivia cercado de fregueses. A tia só estranhou quando ele apareceu um dia lhe pedindo mais dinheiro para comprar aviamentos. “Sofremos um prejuízo e temos muito fiado na rua. Mas, graças a Deus, são veranistas ricos, que compram muito e podem pagar”.
Ao final da temporada o sobrinho de Lengo Mariano voltou pra casa da mãe, sem um tostão no bolso. Para voltar para casa, tiveram que vender até o carrinho de cachorro-quente. O que a tia não sabia (ou se sabia não levou em conta) é que ambos, tanto Lengo quanto o filho dela eram cachaceiros e mulherengos inveterados. Tudo que ganharam torraram em farras.
Mas, como tudo que é bom dura pouco, um dia a casa cai. E caiu. Numa farra numa cidadezinha da região, ele se envolveu numa briga de bar e acabou preso. Não haveria maiores conseqüências se ele, ao ser apresentado ao delegado, embriagado, não tivesse agarrado na bochecha da autoridade e bradado: “Diga aê, lindão”! O delegado mandou trancafiá-lo, e viajou para Feira de Santana. Era uma sexta-feira e ele só retornaria na segunda.
Ao ser trancado na cela, com mais de oito presos, ele foi logo gritando: “Quem que manda aqui”? Levantou-se um sujeito alto, forte, e disse com cara de poucos amigos: “Sou eu”! Mandava - disse Lengo – quem manda agora sou eu. E quero comprar também essa cama. Tome aqui”. E entregou R$ 80,00, ao preso.
Alguns amigos que estavam com ele, mas não foram presos, estavam do lado de fora da cela, esperando e decidindo o que fazer diante daquela situação. Lengo pegou dinheiro, deu a eles e mandou que buscassem comida, bebida, cigarros, baralho e dominó. Como os carcereiros simpatizaram com ele, não foi difícil conseguir o que queria.
Foram bons dias aqueles. Todo dia era uma novidade. Filé a parmegiana, pizza, feijoada, e até um churrasco foi improvisado no xadrez da delegacia, com a participação de alguns policiais e um grupo de pagode de mesa. Até um jovem promotor, que passara por lá a fim de visitar o delegado, gostou, e caiu na farra de Lengo Mariano.
Mas, como disse antes, tudo que é bom dura pouco. Chegou segunda-feira, trazendo o delegado de volta. O advogado de Lengo entrou logo em entendimentos com ele, explicando que Lengo era apenas um menino crescido, que não fazia mal a ninguém. E, mediante o pagamento de uma pequena fiança, conseguiu a sua liberação.
Ficou na história de Patu a saída de Lengo da Cadeia. “Fica! Fica! Fica”! Gritavam os presos, emocionados, alguns às lágrimas, que chegaram até a ensaiar um “abaixo-assinado” para que Lengo continuasse com eles. No caminho de volta, o advogado lhe disse: “Olha. Essa cidade é pequena e as pessoas não têm simpatia com forasteiros. Principalmente destes que aprontam. Deixe passar algum tempo antes de voltar aqui”.
No final de semana seguinte Lengo estava lá, visitando e confraternizando com os velhos companheiros de cela.

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