David Neeleman nasceu e viveu em São Paulo até os sete anos de idade,
mas fala português com um sotaque tão forte que parece americano.
Dono de uma fortuna de 3,8 bilhões de dólares, acionista de seis
companhias aéreas nos Estados Unidos, na França, em Portugal e no Canadá e no
Brasil – onde fundou a Azul – e missionário mórmon, com sete filhas e dois
filhos, ele agora sugere um sotaque parecido para a política e a economia
brasileiras.
Em entrevista à BBC Brasil nos corredores da Universidade de Harvard,
nos EUA, Neeleman, que tem dupla cidadania americana e brasileira e mora com a
família nos EUA, defendeu um Estado mínimo, com faculdades públicas pagas e
investimento prioritário em segurança.
Diz que o governo brasileiro gasta muito e que os brasileiros esperam
demais dos políticos – enquanto os americanos esperam apenas que eles "não
atrapalhem".
Suas teses
funcionam como janela para o que defendem alguns dos membros da minúscula fatia
ocupada por bilionários na sociedade brasileira (exatos 36 homens e seis
mulheres): cortes no funcionalismo público, redução de impostos para
empresários, renovação nos partidos e estímulos fiscais para investidores.
"O dinheiro (público) tem que ser cuidado, é dinheiro sagrado, do
povo."
Ativo no
Instagram, onde publica imagens esquiando em Utah ou se exercitando em frente a
um laptop com a filha (coleciona 18 mil seguidores, muitos vindos de sorteios
de passagens grátis), ele dividiu mesa sobre "Competitividade, gestão e
tecnologia" com outros super-ricos que compartilham de suas visões na
Brazil Conference, realizada no último fim de semana por iniciativa de alunos
de Harvard e do MIT.
O principal patrocinador do evento é o empresário brasileiro Jorge Paulo
Lemann, 29º homem mais rico do planeta, segundo a revista Forbes, com
patrimônio estimado em 27,4 bilhões de dólares.
Na conversa com a BBC Brasil, Neeleman se esquivou de apontar um
favorito para as eleições de 2018, mas diz que PT, PMDB e PSDB são corruptos e
que o país precisa de um presidente "patriota".
"A forma de governo do lado da esquerda, os esquerdistas, os
comunistas, nós já vimos que não funciona", afirma, defendendo alguém
"mais para o meio até um pouco para a direita".
"Com Lula preso ou não, precisamos de sangue novo", acredita.
Leia os
principais momentos da entrevista com o empresário.
BBC
Brasil - O que espera do próximo presidente?
David
Neeleman - As pessoas no Brasil pedem e esperam muito dos
prefeitos. Aqui nos Estados Unidos, o bom prefeito é o que não atrapalha. Isso
vale para políticos de maneira ampla. No Brasil, os impostos são altos, o
tamanho do governo é enorme. Se fosse presidente, eu olharia para todas as
despesas com pessoas que o governo emprega para ver se são necessárias.
O dinheiro tem que ser cuidado, é dinheiro sagrado, do povo. Então tem
que ter um governo muito mais eficiente, um governo que dá incentivos para empresas
para virem para o Brasil, investir, criar novas fábricas e contratar mais
gente. Quanto mais gente trabalha, maior é a receita do governo. Não é só
aumentando impostos. Isso acaba com a economia.
BBC
Brasil - O que poderia ser enxugado?
Neeleman
- O tamanho do governo em comparação ao PIB é
altíssimo, em comparação aos Estados Unidos ou à Europa. Claro que tem que ter
um social, tem que cuidar das pessoas. Tem que ter Bolsa Família e coisas
assim.
Mas muitos que estão trabalhando nas empresas (estatais) são aposentados
do governo, ganhando muito dinheiro. Todo esse dinheiro que poderia ser
colocado na economia, fazê-la crescer, educar mais pessoas, trazer mais
empresas. Tudo isso pode ser feito de maneira muito mais eficiente do que é
hoje.
BBC Brasil
- Saúde e educação: o senhor também defende um modelo mais próximo dos EUA?
Neeleman
- No Brasil, ninguém devolve o dinheiro para a
universidade. Por que não? Porque o governo paga tudo. Uma vez dei uma palestra
na Unicamp e perguntei quantos naquela sala de 400 pessoas tinham estudado em
escolas públicas para estar lá. Uma pessoa só. Todas vieram de (escolas)
privadas, depois o governo pagou a universidade. Então, as pessoas mais ricas
recebem de graça.
Claro, tem que ter bolsa para alguém que é pobre, da favela, e consegue
chegar na Unicamp. Muito bom. Mas, se os pais estão pagando por escola
particular até chegar lá, tem que pagar, cara, o que tiver que pagar. Mas tem
que ter para todo mundo e agora temos tecnologia e muitas coisas que se pode
fazer. E temos que ter melhores professores - não vai ter professores melhores
se não pagar mais.
BBC
Brasil - Então, universidades pagas, mas com bolsas para os que passam e não
têm dinheiro.
Neeleman
- Sim. E tem muitas universidades do Brasil que são
privadas também, muito mais do que públicas. Mas nos primeiros anos da educação
é onde o governo tem que colocar dinheiro. Sabemos que quando se tem mais
educação há menos violência, menos crimes, a educação levanta a sociedade mais
do que qualquer outra coisa.
Mas hoje o governo não tem dinheiro para gastar porque está gastando em
outras coisas. E segurança também, uma coisa realmente mais importante. Se você
não pode andar na rua e se sentir seguro, sentir que tem uma regra de leis
sendo cumprida... a maior responsabilidade é esta para um governo.
BBC
Brasil - Sobre este tema, foi bem-vinda a intervenção federal com militares na
segurança pública no Rio?
Neeleman
- Alguma coisa tinha que ser feita, infelizmente o
orçamento do Rio não tinha dinheiro, então eu acho que em muitos casos isso não
deveria ser feito, mas neste não tinha opção.
BBC
Brasil - Vê entre os pré-candidatos algum que carregue as bandeiras que
defende?
Neeleman
- Têm vários. Eu só quero alguém que não seja
corrupto, um patriota que quer ajudar o Brasil a ser melhor.
BBC
Brasil - Qual dos candidatos não é corrupto?
Neeleman
- Tem muitos.
BBC
Brasil - Por exemplo?
Neeleman
- Tem bastante. A forma de governo do lado da
esquerda, os esquerdistas, os comunistas, nós já vimos que não funciona. Então,
o mais para o meio, até um pouco para a direita, é melhor para a economia.
Porque os outros, não funcionam.
Querer cobrar
impostos e dar mais para as pessoas não funciona. Isso acaba com o governo,
como acabou com todos os outros. Então, prefiro um governo que realmente seja
menor e com um ambiente bom para os negócios. O Brasil tem tudo para crescer, o
governo só tem que sair da frente.
BBC
Brasil - O que a prisão do ex-presidente Lula diz sobre a política e a sociedade
brasileira?
Neeleman
- Acho que todos os partidos têm corrupção no Brasil.
Os maiores todos têm problemas. As pessoas estão cansadas disso. Querem gente
que sabe que não as estão roubando. PT, PMDB, PSDB, nenhum deles escapa disso.
As pessoas só querem gente que realmente ame o Brasil e queira melhorar
as condições das pessoas, para que as pessoas com condições não se mudem para
Portugal, para os Estados Unidos, a Europa, porque estão cansadas do Brasil.
Nós precisamos dessas pessoas aqui e incentivá-las a ficar porque precisamos de
um clima bom para fazer negócios.
Se Lula está preso ou não, nós precisamos de sangue novo.
BBCBrasil
Nenhum comentário:
Postar um comentário