terça-feira, 4 de junho de 2024

Lágrimas no escuro

          

Maura se aproximou de mim para oferecer almoço e notou que duas lágrimas escorriam dos meus olhos. E perguntou: O que foi que houve? E respondi: você já viu alguém chorar pela morte de uma pessoa que nunca viu? Pois é: Estou chorando porque recebi a notícia de que Tiago Preto acaba de falecer. Eu nunca vi Tiago Jesus Santos, um humilde trabalhador que lubrificava carros para tirar o sustento. Mas, sabia quem era ele através das estórias que ouvia o jornalista Evandro Matos contar em seu programa Viola, Sertão e Cidade, na Rádio Jacuípe.

         Eram causos muito divertidos que brotavam da cabeça daquele homem simples, de pouca instrução, mas, de uma espiritualidade enorme. Pelo que as pessoas falam dele, Tiago não precisava fazer força para agradar. Sempre alegre, rindo, inventando e contando estórias que divertiam todos a sua volta. Eu não preciso conhecer pessoalmente alguém assim para saber que se trata de uma boa pessoa, de grande coração e alma maior ainda. Fiquei triste.

        

Tiago Preto

           Todos os domingos Evandro Matos abria o programa dando a previsão do tempo na versão de Tiago Preto. Era sempre a mesma: “A temperatura do tempo está em seu corpo. Se estiver frio, o cabra tá pra morrer. Se passar de 160 é problema. E vorta, se chover tem  a missão, se não chover tem sempre. E vamo se prepará que a bocada é quente”. Eu não sei se alguém conseguiu decifrar o que ele queria dizer, mas, que é engraçado, é.

         Vi um vídeo em que ele conta que um comerciante chegou num lugar onde ele estava e disse aos presentes que estava comprando gado. Queria saber quem tinha para vender. Tiago disse: Eu tenho. No que ele perguntou: Que tipo de gado o senhor tem? Garrotes acima de 13 arrobas. O homem serviu um whisky pra ele e outro pra Tiago e afirmou: - Negócio Fechado. Amanhã pela manhã venho aqui para terminar de fechar.

         No dia seguinte o homem chegou e perguntou a Tiago pelos bois. – Que bois? Perguntou Tiago. Os que você me vendeu ontem”. Os colegas de Tiago esclareceram: O senhor está perdendo seu tempo. Ele não tem boi nenhum. Furioso, o boiadeiro respondeu: “Eu não lhe dou um tiro na cara porque você não pode pagar a bala”. E saiu resmungando enquanto todos caíram na risada.

         Como todas as almas simples que colocam um pouco de alegria em nossas vidas com seus causos e brincadeiras, assim era Tiago Preto. Ninguém sabe ao certo a sua idade. Pelos cálculos de alguns parentes, estava com quase 90 anos. Pelas contas de uma neta, estava com 98, completados em 14 de maio passado. Vivendo aqui em Riachão há pouco mais de dois anos, eu lamento não o ter conhecido pessoalmente e convivido mais com ele. Gente como Tiago Preto é difícil de se encontrar e quando encontramos é como se Deus tivesse nos dado um presente.

         Morreu Tiago Preto. Viva, Tiago Preto!

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