quinta-feira, 13 de março de 2025

A estrada construída para a COP30 em Belém que vai desmatar a Amazônia

 

Governo estadual promove a rodovia como "sustentável", mas moradores e ambientalistas criticam impacto ambiental (foto: Paulo Koba)

Uma nova rodovia de quatro faixas que corta dezenas de milhares de hectares de floresta amazônica protegida está sendo construída para a COP30 (30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima), que acontece em Belém do Pará.

O objetivo é facilitar o tráfego para a capital paraense, que vai receber mais de 50 mil pessoas — incluindo líderes mundiais — na conferência em novembro.

O governo estadual promove a rodovia como "sustentável", mas moradores e ambientalistas criticam impacto ambiental.

A Amazônia desempenha um papel vital na absorção de carbono para o planeta e na preservação da biodiversidade, e críticos dizem que esse desmatamento contradiz o próprio propósito de uma conferência climática.

Ao longo da estrada parcialmente construída, a densa floresta tropical se ergue dos dois lados — um lembrete do que já esteve ali.

Toras de madeira estão empilhadas nas áreas desmatadas, que se estendem por mais de 13 km floresta adentro até Belém.

Escavadeiras e máquinas abrem caminho pelo chão da floresta, aterrando áreas úmidas para pavimentar a estrada que cortará uma área protegida.

Claudio Verequete mora a cerca de 200 metros de onde a estrada vai passar. Ele costumava ganhar a vida colhendo açaí de árvores que antes ocupavam o local.

"Tudo foi destruído", diz ele, apontando para a clareira.

"Nossa colheita já foi derrubada. Não temos mais essa renda para sustentar a família."

Ele afirma que não recebeu nenhuma compensação do governo estadual e que atualmente está vivendo com suas economias. Também teme que a construção da estrada leve a mais desmatamento no futuro, agora que a área se tornou mais acessível para empresas.

"Nosso medo é que um dia alguém chegue aqui e diga: 'Toma esse dinheiro. Precisamos dessa área para construir um posto de gasolina ou um galpão.' E então vamos ter que sair daqui", diz.

Claudio Verequete diz que as árvores das quais ele colhia açaí foram cortadas (Foto: Paulo Koba)

"A gente nasceu e cresceu aqui na comunidade. Para onde vamos?"

Sua comunidade não terá acesso à estrada, devido aos muros que a cercam em ambos os lados.

"Para nós, que moramos ao lado da rodovia, não haverá benefícios. Os benefícios vão ser para os caminhões que vão passar por ela. Se alguém ficar doente e precisar ir até o centro de Belém, não vai conseguir usar a estrada."

Já o governo do Pará diz que "as comunidades estão sendo beneficiadas com infraestrutura e serviços" decorrentes da construção da estrada.

"A avenida de cerca de 13 km é uma importante obra de mobilidade para a Região Metropolitana de Belém, vai beneficiar mais de 2 milhões de pessoas e foi licitada antes mesmo de Belém ser definida como sede da conferência. Esse projeto não faz parte do pacote de investimentos para a COP, que contempla cerca de 30 obras estruturantes desenvolvidas pelo governo do Estado", disse o governo em nota.

A via deixa duas áreas de floresta protegida desconectadas. Cientistas estão preocupados com o risco de fragmentação do ecossistema e de interrupção no deslocamento da fauna.

A professora Silvia Sardinha é veterinária especializada em vida selvagem e pesquisadora em um hospital universitário de animais que fica de frente para o local onde a nova estrada está sendo construída.

Ela e sua equipe reabilitam animais silvestres feridos, principalmente por causas humanas ou atropelamentos.

Depois de recuperados, eles são devolvidos à natureza – algo que, segundo ela, será mais difícil com uma rodovia logo ao lado.

"Desde o momento do desmatamento, há uma perda. Vamos perder uma área para soltar esses animais de volta à natureza, o ambiente natural dessas espécies", afirmou.

"Animais terrestres não poderão mais atravessar para o outro lado também, reduzindo as áreas onde podem viver e se reproduzir."

O governo do Pará argumenta que corredores para a passagem de animais silvestres estão sendo construídos.

"O Governo do Pará está implementando diversas soluções estratégicas para assegurar a sustentabilidade da via, incluindo a construção de ciclovias, a utilização de energia solar para sua iluminação e a implantação de 34 passagens de vida silvestre ao longo do percurso para permitir o livre tráfego da fauna local."

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, afirmam que esta será uma cúpula histórica por ser "uma COP na Amazônia, não uma COP sobre a Amazônia".

Lula diz que o encontro será uma oportunidade para focar nas necessidades da região, mostrar a floresta ao mundo e apresentar o que o governo federal tem feito para protegê-la.

Mas a professora Sardinha diz que, embora essas conversas aconteçam "em um nível muito alto, entre empresários e autoridades governamentais", quem vive na Amazônia "não está sendo ouvido".

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