domingo, 16 de março de 2025

Ninguém sabe, ninguém viu

 


Vamos conversar?

 

Ao nos reconhecermos

seres pensantes,

movidos por vitais necessidades

- para supri-las -

interagimos  com a natureza.

 

Nela procuramos atender, ao início,

as demandas primordiais.

Teto, Vestuário,

Alimentos, Proteção.

Mais a frente,

outras tantas

somam-se ao rol

dos direitos da vida humana.

O escudo para tudo?

A incansável busca da felicidade.

 

Você há de perguntar:

Como isso funciona na cabeça da gente?

Eu lhe diria serem atávicas tentações

por paradisíacas paragens.

 

As linguagens sacras,

em sua maior parte,

concentram-se em tal matiz,

ser-se  eternamente feliz.

 

Como isso é confortável, crê-se.

Mesmo sabendo que arautos

da eterna felicidade,

cobrem alguns ‘caraminguás,

para auxiliá-los no pastoreio.

 

Contra tanta bondade,

resistir, quem há de?

Você, também, há de indagar se,

em tal trama psicológica,

há conexão entre presente e futuro.

 

Explico.

Semelhante conexão ocorre

quando exageramos na compra de algo.

Queremos, em lance único,

saciar a  fome do presente e a do futuro.

Este, porém, “a Deus pertence”,

não é assim que reza a sabedoria popular?

 

E quando

-  ante hipotética necessidade –

compramos algo, só por estar com preço atraente?

É ou não, algo parecido com as negociações

visando o futuro ignoto?

 

Mais que consumidores,

somos consumistas movidos a impulsos

ante a performance da camisa da moda;

ao aroma de uma fragrância;

ante a novos recursos tecnológicos

nem sempre utilizados;

ao sorriso de uma paquera;

ante o prazer de abarrotar o armário da despensa...

 

Um interminável rosário

de vontades (in)satisfeitas.

Insatisfações tais,

exploradas pela publicidade

da onipresente máquina capitalista,

esta na permanente busca de recordes de produção.

 

- Quer dizer, então,

que a publicidade costuma priorizar

as vantagens do consumo,

sem muito alertar quanto

às suas eventuais consequências?

 

Perfeitamente!

Exclui-se o caso das ‘bulas-bíblias ’-

dos remédios, letrinhas quase ilegíveis –

por imposição legal,

associada ao risco de processos judiciais.

 

Tirante tal caso emblemático,

pouco é esclarecido quanto a outros produtos.

Os avanços em tal campo

têm sido modestíssimos.

De destaque, excetuam-se as ações

para a redução de consumo do tabaco.

 

Os métodos de convencimento da opinião pública,

não costumam alertar os consumidores,

quanto aos prováveis danos a eles

ou ao meio ambiente.

 

Reina um silêncio, quase absoluto.

Vicejam idiotices por todos os cantos.

O que, associado às revisões históricas em curso

e à velocidade das transformações de usos e costumes,

não assimiladas pela maioria,

provocam um verdadeiro rebuliço

nas sociedades como um todo.

 

Excesso de produção de lixo,

poluição industrial,

há de se compreender,

são outras decorrências do consumismo.

 

O crescente consumo de artigos eletrônicos,

fabricados com ‘obsolescência programada’

– expressão eufemística –

produtos ‘feitos para durar pouco’,

mais o avassalador avanço da indústria de plásticos,

em quase tudo quanto se  imaginar possa

- especial destaque às embalagens –

é uma bomba de efeito retardado no colo do planeta.

 

- Sigamos conversando!

Onde, porventura, estarão os copinhos plásticos,

nos quais eu e meus amigos dos matinais encontros –

há anos muitos -  bebemos nossos cafezinhos?

 

Precisamos melhor entender,

os efeitos dos fragmentos de tais recipientes,

nos animais e no ecossistema de água doce.

Quanto menores os fragmentos,

maior o potencial de danos sócio ambientais.

 

Na falta de legislação reguladora,

não há monitoramento das prováveis consequências.

A famigerada ‘vontade política’

é sufocada pelos lobbies empresariais.

 

Os micros plásticos se acumulam

nas profundezas do oceano, das lagoas e dos rios.

Cada tipo de plástico possui distinta composição,

a qual pode originar resultados tóxicos específicos.

Isso, sem se computar gastos de energia

na produção e na distribuição,

bem como na contaminação do solo.

 

- Você quer saber a grandeza da produção

anual mundial de lixo como um todo?

 

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU),

são produzidos, a cada ano,

mais de 2 bilhões de toneladas.

 

Nestes 2 bilhões, como em média

-  cada pessoa gera 343 quilos-lixo anuais -

o Brasil participa com 78 milhões de toneladas,

das quais 14% são oriundas de plásticos.

Nossa taxa geral de reaproveitamento

ou reciclagem não chega a 4% ao ano.

 

No ranking mundial, estamos em quarto lugar

entre os maiores produtores de lixo plástico.

Perdemos, apenas, para Estados Unidos, China e Índia.

 

E o que é pior.

Segundo estudiosos, a reciclagem dos plásticos,

não passaria de um ‘mito’.

Dos sete tipos existentes,

apenas dois deles são reciclados

em expressiva quantidade.

O restante...

 

- Precisamos conversar, mais?

- Como será o amanhã?

 

Talvez, reste torcer para o término

da matéria prima fóssil – leia-se, petróleo.

Além, é claro, da adoção de soluções,

com vistas ao desenvolvimento sustentável,

quais sejam:

incentivar a coleta seletiva,

priorizar energia e matéria prima renováveis,

reutilizar embalagens,

produzir com menor geração de resíduos e emissões,

praticar o consumo consciente.

 

Enquanto isso...

 

Para chamar a atenção sobre o tema,

a Assembleia Geral das Nações Unidas, estabeleceu

em 2022, o Dia Internacional do Lixo Zero,

celebrado em 30 de março.

 

Tal data, por  aqui, passou despercebida.

Ninguém sabe, ninguém viu!

 

 

 

Hugo Adão de Bittencourt Carvalho (1941), economista, cronista, é autor do livro virtual

Bahia – Terra de Todos os Charutos, das crônicas Fumaças Magicas e Palavras ao Vento,

participa do Colares – Coletivo Literário Arte de Escrever. Vive em São Gonçalo dos Campos.

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