Interessadas em ocupar um espaço 
estratégico na arena política sobre crianças e adolescentes, dezenas de 
igrejas tentarão eleger representantes nas eleições para os Conselhos 
Tutelares, que ocorrerão em quase todos os municípios brasileiros, em 6 
de outubro. 
Entre os temas que mobilizam as entidades está o controle da abordagem de questões de gênero e sexualidade nas escolas. 
A
 disputa opõe católicos e evangélicos, e espelha o crescimento de 
igrejas protestantes no Brasil. Uma busca feita no Facebook revela 
dezenas de candidatos, de todas as regiões do Brasil, que se apresentam 
como pastores evangélicos — a maioria de igrejas em bairros periféricos.
 Alguns citam passagens bíblicas no material de campanha.
As eleições são abertas a todos os eleitores. Como o voto é 
facultativo, candidatos apoiados por organizações capazes de engajar 
eleitores, como igrejas, saem na frente. 
A ofensiva preocupa 
entidades de defesa de direitos de crianças e adolescentes, que temem a 
transformação dos órgãos em instâncias religiosas e em trampolins 
políticos (leia mais abaixo). 
'Compromisso com Deus'
Uma
 das denominações evangélicas envolvidas nas eleições para os conselhos é
 a Igreja Universal do Reino de Deus. Em 15 de setembro, a igreja 
publicou em seu site um artigo intitulado "Conselho Tutelar: é nosso 
dever participar". 
"Talvez nunca na história da humanidade 
crianças e adolescentes tenham precisado tanto de quem defenda seus 
direitos, que dia a dia são desrespeitados pela mídia que expõe material
 inapropriado, pelos maiores de idade que os agridem de alguma forma e 
até pelas próprias famílias que não suprem suas necessidades básicas", 
diz a Universal.
O texto exorta os fiéis a votar em candidatos "que, acima de tudo, tenham compromisso com Deus". 
Procurada
 pela BBC News Brasil, a Universal não quis responder a perguntas sobre a
 eleição e questionou se a reportagem também citaria o papel da Igreja 
Católica no pleito, enviando em anexo um texto do jornal da Arquidiocese
 de São Paulo.
No texto, publicado em agosto, a coordenadora 
arquidiocesana da Pastoral do Menor em São Paulo, Sueli Camargo, 
conclama os católicos a participarem da eleição para frear o avanço 
evangélico nos conselhos.
"Quando nos ausentamos, deixamos espaço 
aberto para outras denominações religiosas, como os evangélicos, que 
estão presentes não só nos conselhos, mas em diversos campos da política
 e nem sempre estão preparados para ocupar esses cargos", afirmou 
Camargo ao jornal.
Questionada pela BBC sobre a declaração, Camargo diz
 não se opor à presença de qualquer evangélico nos conselhos. "O 
problema é quando essa atuação faz o conselho perder sua essência, que é
 a defesa da criança", afirma. Segundo ela, muitos candidatos 
evangélicos encaram os conselhos como "trampolim político" para outros 
cargos eletivos.
Quanto à abordagem de temas sexuais e de gênero 
nas escolas, no entanto, Camargo afirma que candidatos católicos têm 
visões parecidas com as dos evangélicos. "Também somos contra essa 
ideologia que é pregada", diz ela, sem detalhar a que ideologia se 
refere.
Camargo diz que a Arquidiocese de São Paulo tem 
incentivado a participação de leigos católicos na eleição, formando 
candidatos e estimulando o voto dos fiéis. Segundo ela, porém, a 
Arquidiocese não pede votos para candidatos nem indica padres para os 
cargos.
O que é o Conselho Tutelar
Criado
 pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em 1990, o Conselho 
Tutelar é um dos principais órgãos de democracia participativa no 
Brasil. 
Entre suas atribuições está notificar o Ministério 
Público sobre violações de direitos de crianças e adolescentes, 
solicitar a troca de guarda familiar e fiscalizar as políticas públicas 
para menores. Em cada município brasileiro há pelo menos um conselho, 
composto de cinco membros eleitos.
São Paulo, maior cidade do país, abriga 52 conselhos tutelares, com 260 integrantes ao todo. 
O
 mandato dos conselheiros dura quatro anos, e eles recebem salários 
definidos pelas Câmaras de Vereadores (cerca de R$ 1,5 mil por mês em 
média, segundo dados do — hoje extinto — Ministério do Trabalho e 
Emprego). 
Alguns municípios submetem os candidatos a uma prova e 
exigem experiência no atendimento a crianças e adolescentes. Em muitos 
outros, porém, basta que os candidatos morem no município, tenham mais 
de 21 anos e "reconhecida idoneidade moral". 
Em vários aspectos, a
 campanha para conselheiro tutelar se assemelha a uma disputa por cargos
 legislativos. Candidatos criam páginas em redes sociais para pedir 
votos, divulgar atividades de campanha e exibir vídeos com apoiadores 
ilustres. 
Muitos que se elegem como conselheiros posteriormente 
concorrem a vereadores, e é comum que vereadores recompensem cabos 
eleitorais apoiando-os na disputa para conselheiros. As práticas não são
 ilegais.
Especialistas em direitos de crianças e adolescentes 
dizem que conselheiros movidos pela fé ou por interesses políticos podem
 causar mais danos por omissões do que por ações de sua autoria. Isso 
porque várias de suas decisões precisam do aval do Ministério Público e 
da Justiça para serem concretizadas, o que limita o poder dos 
conselheiros. 
Por outro lado, caso deixem de agir em casos que 
avaliem contrariar suas crenças religiosas — como o de crianças vítimas 
de homofobia nas escolas —, eles podem perpetuar cenários de violação de
 direitos. Nessas situações, caso se comprove que descumpriram as 
funções, os conselheiros podem sofrer sanções e até perder o cargo, 
embora isso raramente ocorra. Click no link e continue lendo no BBC News Brasil

 
 
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