O Comendador Bastos
Cabra fiel tava ali. O Comendador Bastos nunca jogou água fora da bacia. Comerciante tradicional, respeitado, era um homem do tempo em que a palavra dada era garantida por fio do bigode do cavalheiro. E bigode bem que ele o tinha. Um largo e vasto bigode. Casado com dona Semírames, nunca tirara a aliança do dedo, desde o dia em que com ela trocara juras de amor ao pé do altar.
O comendador era conservador em tudo. Na maneira de falar,
de vestir, de comer e, dizem, até na hora de “virar o zoinho”. O certo é que o
homem, em plena década de 80 ainda usava cueca samba canção, camiseta de meia
por baixo da camisa de linho com mangas compridas e sapato bico fino. Ia à
missa todos os domingos e era frequentador assíduo das reuniões do Lions e da
Maçonaria.
E foi por causa destas reuniões que a coisa começou a pegar.
Alguns membros, mais afeitos às mudanças dos tempos, costumavam sair mais cedo
das reuniões e dar uma esticadinha até um barzinho, uma boate ou, quiçá, um
motel, colocando como desculpa por chegar tarde em casa a demora das
infindáveis reuniões.
Ocorre que, como o comendador Bastos não era afeito a estes
desvios, ia direto pra casa tão logo terminavam as reuniões. E assim sendo,
quando dona Semírames se encontrava com as amigas, e delas ouvia as queixas
contra as demoradas reuniões, não entendia e argumentava que seu marido, o
comendador Bastos, sempre chegava cedo em casa.
As senhoras começaram a desconfiar e a fazer perguntas, o
que levou os demais membros da confraria a discutir o assunto e tomar
providências.
“Precisamos enquadrar o comendador. Ele tem que se juntar a
nós ou então a vaca vai pro brejo”, argumentavam.
Passando da palavra à ação, arquitetaram um plano para
“laçar” o comendador. Contrataram umas meninas para, na próxima reunião,
participarem de um programinha, e incumbiram uma, particularmente, de “colar”
no comendador e fazer com que ele participasse da farra, sem ter como se
desculpar.
No dia acertado, a reunião terminou mais cedo e as meninas
já estavam esperando na porta do clube. Aquela a quem coube “grudar” no
Comendador, muito despachada, foi logo se atirando em seus braços, chamando-o
de “meu coroa lindo”, declarando-se perdidamente apaixonada, deixando o
comendador definitivamente “laçado”.
O que aconteceu a seguir, ela contou depois. Foram à boate,
dançaram um pouco, beberam e, claro, foram a um motel. Lá chegando, ela logo se
pôs em trajes de Eva, tomou um banho e deitou-se à cama, lânguida, provocante e
convidativa para uma grande noite de amor. Por sua vez, o comendador se pôs em
trajes menores (cueca samba canção, camiseta e meias) e partiu pros finalmente.
Estava ele ali, naquele “papai e mamãe” quando a menina,
talvez até para justificar o pagamento que estava recebendo, começou a soltar
alguns gemidos sensuais: “Ai, que gostoso, ai, como é bom, ai...” .
O comendador não se fez de rogado. Empertigou-se todo,
cofiou o bigode, e bradou solenemente:
- Ai, também, minha filha!...
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