*Charutos amantes*
Belo dia, você é apresentado ao charuto. Se o for por um amigo as coisas ficam mais fáceis. Se Você, entretanto, decidiu optar pelos puros, cambiando os cigarros por estes, ou porque julgou o ato de fumá-los charmoso e requintado, não conhecendo alguém da confraria, a iniciação se complica.
Ingressar na arte e no prazer de fumar, requer conhecimento do ato em si, bem como de aspectos da intimidade e da vida dos mágicos rolinhos de fumo. No começo, eu sei, é difícil. Afinal o neófito não está acostumado a toda uma simbologia onde significante e significado se mesclam, transformando-se em azuladas fumaças.
Baseado em minha
experiência, afirmaria que o novato, para ingressar na Ordem Charuteira, não
deveria começar tentando acender seu primeiro charuto. Acendê-lo já é parte do
rito e, fatalmente, por força do seu despreparo, será logo reconhecido com um estranho no ninho.
Ninguém sai do namoro para o casamento de forma instantânea. Para casar, é recomendável que o cônjuge conheça o máximo possível da vida do futuro consorte. Por isso, durante o enlevo inicial, ouvir amigos mais experientes no métier, mal nenhum faz. Ao contrário.
Nada de pressa. Inimiga da perfeição a pressa, a quem pretende aprender a degustar charutos, provoca – quantas vezes vi – engasgos, enjoos, tonturas, mal-estares. Não se deve ir com muita sede ao pote. Ai daquele que, sem ser iniciado, atreva-se! Faz-se mister, presença amiga e experiente para mostrar como beber a água toda, sem afogar-se ou, no caso, como degustar o puro sem a inadequada pressa de amores furtivamente mal vividos. E, findo o charuto, aprendendo a curtir o retrogosto, saber arquivar no relicário íntimo, os aromas, perfumes e sabores daqueles momentos de prazer vividos na ímpar companhia consumida.
Com um detalhe: charutos não são amantes fugazes, assim encarados não servem. São amores quando chegam, respeitado o ritual iniciático, chegam para a vida inteira. Não se deve, também, levar em conta a frequência, se diária, semanal ou mais espaçada. Quem dá o ritmo é o iniciado, na medida que o mesmo lhe apraza.
Importante é você, após ingresso na Ordem, a cada momento eleito para o declarado gesto de amor, proceder com crescente arte, engenho, perfeição e zelo. Como recomendo aja sempre ao dar vida a seus charutos.
Sempre como se fosse
um novo amor, vivido com a experiência acumulada de amores antigos.
Hugo A. de Bittencourt Carvalho, economista, cronista,
ex-diretor das fábricas de charutos Menendez & Amerino, Suerdieck e
Pimentel, vive em São Gonçalo dos Campos – BA
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