Carpins
Certa feita, um deles indagou-me o significado da palavra “estepe” surgida no texto da historinha. Expliquei-lhe tratar-se de termo sulista, não frequente no dialeto das bandas nordestinas: aqui, estepe é “força” ou “pneu de socorro”.
No mesmo instante, fui acorrido por lembrança de fato enterrado no passado e sem contra resposta justa, no tempo devido, por ignorância minha.
Ano da graça de
1962. Fora, profissionalmente, transferido dos pagos gaúchos para a Paulicéia,
então não tão desvairada. Entre outras funções, seria secretário do gerente da
filial paulista, pessoa da qual guardo inesquecíveis momentos. Chamava-se Paulo
Viotti. Dono de invejável fluência verbal e rico vocabulário, não admitia
rascunho prévio de suas cartas. A diária correspondência era ditada - eu, à
máquina datilográfica, ainda não elétrica, papel carbono para as duas cópias de
praxe. Perfeccionista, patrulhava erros do vernáculo. Formado em química,
estava na profissão errada. Grande mestre.
O fato ficara travado em minha mente. Donde – cáspita - gaúchos daqueles tempos e de certas regiões, haviam tirado o termo ‘carpim’ para conceituar a meia masculina?
Anos mais tarde, descobri ter sido a corruptela da grafia e do significado de um galicismo. Do francês escarpin nos chegara escarpim, palavra que tinha como uma de suas acepções, “calçado de tecido que se usava por debaixo das meias”.
Tarde demais. Eu já morava na Bahia e Paulo Viotti, fulminado, ainda bastante jovem, por um câncer de próstata, fora-se.
Valeu, meu Viotti
querido! Estou calçando um novo par de ‘carpins’ comprado nesta semana
e, sempre lembrando de ti, acendo um charuto em tua homenagem!
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