Sutilezas linguísticas
Quem não lembra do ingênuo versinho “batatinha quando nasce, esparrama pelo chão”, prelúdio de “a menina que namora põe a mão no coração?” Pois bem, embora as batatinhas ao brotarem se esparramem pelo terreiro, muito mais claro seria se, como originalmente foi concebido, a forma verbal “esparrama” voltasse a ser “espalha a rama”. Vamos conferir? “Batatinha quando nasce, espalha a rama pelo chão”. Não ficou perfeita?
Já que estamos no campo das
(im)perfeições, às vezes uma alteração dá certo. Diria até que, no popular,
tenha ficado bem melhor do que na redação clássica. É o caso do adágio “Quem
tem boca vaia Roma”. Veja que aí está expresso o verbo ‘vaiar’, cunhado em
frase usada pelos antigos opositores do império romano. Hoje seria alguma
coisa, mais ou menos, tipo “Quem tem boca vaia Brasília”. Mas, tendo Roma perdido sua hegemonia, nada
mal o vulgo ter resolvido substituir “vaia”, por “vai a”, o que no fundo,
traduz inequívoca verdade.
E como quem tem boca vai a Roma ou a
Brasília, no meio do caminho poderá se deparar com alguém que seja “cuspido e
escarrado a cara do pai”. Outra besteira institucionalizada. Na verdade, há um
mármore afamado, oriundo da cidade de Carrara, Itália, muito usado para
esculpir estátuas. O correto, portanto, da frase que revela identidade entre
pai e filho seria “é a cara do pai, esculpida em Carrara”.
Não pretendo com tais registros firmar
posições sobre o que seja certo ou errado. Já vi, gente declarar que vai caçar
com a ajuda de um gato. Está aí, para não dizerem que minto, o usadíssimo
bordão “quem não tem cão, caça com gato”. Será mesmo? Alguém já tentou caçar
com um gato? A forma correta não seria “quem não tem cão, caça como o gato”?
Ficou no ar? Pois é, quem não tem cão, vai à caça como o gato, ou seja,
sozinho. Caça, da mesma forma que apreciei meu charuto, ao abordar tais
‘patranhas’. Sozinho.
Hugo Adão de Bittencourt Carvalho (1941), economista, cronista, é autor do livro
virtual
Bahia –
Terra de Todos os Charutos, das crônicas
Fumaças Magicas e Palavras ao Vento,
participa do
Colares – Coletivo Literário Arte de Escrever. Vive em São Gonçalo dos
Campos.
[email protected]
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