domingo, 4 de outubro de 2020

“Projeto Centro” chega com 40 anos de atraso

        

 Os problemas do centro comercial de Feira de Santana são bem antigos. No início da década de 80, a Câmara de Dirigentes Lojistas pediu e o prefeito construiu um “Calçadão” na rua Sales Barbosa, no coração do centro comercial da cidade. Com o fim da feira-livre, confinada no Centro de Abastecimento, a ideia era tornar o lugar atrativo e de fácil acesso para os clientes das lojas ali instaladas. Porém, ninguém contava com a invasão de ambulantes (camelôs) que, com a conivência do poder público, tomou totalmente a rua. Começava ali uma guerra entre ambulantes e lojistas que já dura quase 40 anos e já se estendeu por todo o centro da cidade.

         Nos anos 90 a Prefeitura transferiu os ambulantes da rua Sales Barbosa para a praça Presidente Médici, nos fundos da Catedral de Santana, num local que hoje é conhecido como “Feiraguai”, devido ao grande número de produtos importados do Paraguai que ali eram comercializados. Porém, uma nova leva de ambulantes voltou a ocupar a rua Sales Barbosa. O problema estava longe de ser resolvido.

         Para os lojistas não melhorou nada e o problema só se agravou. E, cansados de promessas, passaram a exigir do poder público, compromissos, exigindo que a Prefeitura abrisse licitação e contratasse uma empresa especializada para elaborar um projeto que atendesse aos interesses de lojistas e ambulantes. Seriam necessárias reuniões entre as partes interessadas para sugerir mudanças, que não descaracterizassem o projeto original. E teria que ser contratada uma empresa com referências anteriores para executar as obras, que tenha executado projetos em cidades onde este problema foi resolvido. Qualquer proposta diferente dessa seria considerada como “discurso eleitoreiro”.

 

 Evandro Oliveira, professor e historiador, afirma que avenidas como Getúlio Vargas, Senhor dos Passos e Maria Quitéria, são exemplos que mostram a falta de preocupação dos governantes com o futuro da cidade, com o ordenamento urbano. A população vive incomodada com a ocupação das ruas centrais pelo comércio ambulante e feirantes que vendem hortigranjeiros, atuando livremente.

 “Favelização”

 
O centro de Feira de Santana transformou-se em uma verdadeira favela. A rua Marechal Deodoro teve metade do seu leito ocupado por bancas de hortifrutigranjeiros e as calçadas tomadas por barracas de bugigangas. A situação não é muito diferente no calçadão da Sales Barbosa e outros espaços, como a rua Conselheiro Franco e Avenida Getúlio Vargas começaram a ser ocupadas desordenadamente. Há cerca de 15 anos, o então presidente do Rotary Clube de Feira de Santana, Armando Sampaio, em uma reunião, não conteve a indignação e criticou duramente o que chamou de  "favelização" do centro de Feira de Santana, considerando a leniência com a ocupação dos espaços públicos como uma ação eleitoreira, intensificada nos últimos anos, com o cenário agravando-se a cada dia.

Sampaio não se limitou aos efeitos maléficos ao comércio convencional, que sofre prejuízos com o bloqueio ao acesso as lojas estabelecidas. Falou sobre a agressão à estética e às dificuldades, enfrentadas pelos pedestres para se locomover na rua Marechal Deodoro, expondo-se a risco de acidentes e transtornos no trânsito. Reclamou da falta de ordenamento e de fiscalização.

Evandro Oliveira faz uma viagem no tempo, quando o centro de Feira se limitava a três ruas. Cita a construção da Prefeitura, na esquina da Getúlio Vargas com a Senhor dos Passos, um marco na história urbanística da cidade e conta, com humor, que o Paço Maria Quitéria foi um capricho do intendente Arnold Silva. A Prefeitura funcionava em um prédio de Augusto Fróes da Mota. "Arnold não queria ficar em um imóvel que pertencia ao seu adversário", conta.

 Fiscalização

A abertura das Avenidas Getúlio Vargas e Maria Quitéria foi planejada, com visão de futuro. A avenida João Durval Carneiro foi resultado do que Evandro Oliveira denomina de urbanismo acidental: surgiu com a mudança da linha de trem, cuja estação saiu da Rua Senador Quintino e uma nova foi erguida no bairro que passou a se chamar, por razões óbvias, Estação Nova.

"Temo pelo progresso da nossa terra", lamenta o centenário professor e ex-prefeito Joselito Amorim. "Feira está crescendo desordenadamente. O exemplo dos nossos antepassados, com avenidas largas, não está sendo seguido. Depois do Anel de Contorno, nada foi feito, as construções irregulares, sem fiscalização, transformaram a região em um verdadeiro labirinto", protesta.

Segundo analisa, na área fora do contorno, as construções não obedecem a alinhamentos, não há ordenamento, sem a definição de quarteirões, acumulando problemas. Professor Amorim cita bairros que foram surgindo com organização, como o Jardim Cruzeiro, com suas ruas largas e amplas, simétricas. "Feira cresce de forma caótica. O centro é uma vergonha, uma favela. Fora do contorno é uma desordem, sem fiscalização da Prefeitura, construções são erguidas sem a licença", critica.

 

A cidade resiste

Agora, quase 40 anos depois, um prefeito corajoso e nada eleitoreiro, Colbert Martins Filho, colocou em execução o “Projeto Centro”, que faz parte de um conjunto de obras e ações do seu antecessor, José Ronaldo de Carvalho, com o objetivo de melhorar a mobilidade urbana e “salvar” o centro da cidade do processo de favelização. É claro que a oposição reagiu e tem atrapalhado o que pode a execução do projeto, não fosse as inúmeras ações na justiça para bloquear o progresso, e o pior, é que conta com o apoio do governo do Estado para estas ações. É um momento político conturbado em todo o Brasil, agravado por uma terrível pandemia causada por um vírus chinês, e às vésperas das eleições municipais que ocorrem em novembro próximo.

Há  quem aposte que a cidade resistirá a tudo isso e seguirá o caminho que for melhor para a maioria da população

. Saliente-se que desde a revolução de 64 a cidade passou mais de 20 anos elegendo prefeitos da oposição, e mesmo sem o apoio do governo do Estado, cresceu, vivendo dos seus próprios recursos, graças ao seu povo e à sua localização privilegiada. Como se costuma dizer em Feira de Santana. “A Princesa não se rende a aventureiros e opressores”.

 Cristóvam Aguiar

 








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