A palavra é cada vez mais usada nas conversas sobre política. Mas qual sua origem e o que ela significa? Veja a resposta
Em tempos
de polarização política, é cada vez mais comum ouvir pessoas se chamando
de “comuna” ou “coxinha”. Mas sempre aparece aquele mais entendido que
resolve xingar o outro de “fascista”. Faz sentido? Ele realmente sabe o
que a palavra significa? E você?
A palavra “fascismo” vem do italiano fascio, que significa “feixe”. Na Roma Antiga, o fascio (também conhecido como fascio littorio), era um machado revestido por varas de madeira. Ele geralmente era carregado pelos lictores, guarda-costas dos magistrados que detinham o poder. O fascio podia
ser usado para punição corporal, e também era um símbolo de autoridade e
união: um único bastão é facilmente quebrável, enquanto um feixe é
difícil de arrebentar.
No século 20, o político italiano Benito Mussolini se apossou desse símbolo para seu novo partido. Em 1914, ele fundou o grupo Fasci d’Azione Rivoluzionaria (mais tarde, em 1922, surgiria o conhecido Partido Nacional Fascista). O uso do fascio
não foi à toa. A Itália enfrentava uma profunda crise desde sua
unificação tardia (concluída em 1870), e as consequências da Primeira
Guerra Mundial (1914-1918) pioraram a situação. Mussolini prometia, com o
fascismo, trazer de volta os tempos áureos do antigo Império Romano.
Em 1919, os italianos Alceste de Ambris e Filippo Marinetti publicaram o Il manifesto dei fasci italiani di combattimento, texto hoje conhecido como Manifesto Fascista, que propunha
um conjunto de medidas para resolver a crise da época. Nas décadas
seguintes, o termo “fascismo” passou a ser usado para designar as
políticas adotadas por Mussolini e seus seguidores.
O regime de Mussolini começou oficialmente em 1922, quando ele assumiu o cargo de primeiro ministro da Itália, e foi um sistema
político nacionalista, imperialista, antiliberal e antidemocrático. Ele
implantou um governo totalitário que privilegiou conceitos de nação e
raça sobre os valores individuais. O fascismo italiano quase
acabou em 1943, quando os países Aliados invadiram a Itália, durante a
Segunda Guerra Mundial. Mas os nazistas ainda deram uma segunda chance
ao ditador: os alemães reocuparam a Itália, resgataram Mussolini e o
levaram para o norte do país, onde ele tentou restituir seu governo. No
fim, em 1945, os Aliados tomaram o norte e Mussolini foi capturado e fuzilado por guerrilheiros da resistência italiana. Seu corpo foi exposto em praça pública. Com a derrota da Itália (e das forças do Eixo) na guerra, “facista” virou um termo pejorativo.
Mas, o que
exatamente foi o fascismo nem os maiores estudiosos sabem definir com
precisão. Não existe nenhuma definição universalmente aceita do
fenômeno, seja quanto sua abrangência, origens ideológicas ou formas de
ação que o caracterizem. Algumas das principais características
atribuídas ao fascismo italiano -nacionalismo, corporativismo, racismo-
não estão presentes em todos os regimes ditos fascistas.
George Orwell, no seu “O que é Fascismo?”,
afirma que as definições populares do termo vão de “democracia pura” a
“demonismo puro”. Ele mesmo afirma que é uma palavra “quase inteiramente
sem sentido”. Isso se deve, principalmente, ao fato de o fascismo não
possuir um arcabouço teórico forte, e ter sido determinado, na prática,
pelas atitudes de Mussolini. Nas palavras do próprio: “Não temos uma
doutrina pronta; nossa doutrina é a ação.” Outros
movimentos são bem mais formalizados. O marxismo, por exemplo, antes de
ser uma prática política, é uma doutrina com base teórica nos escritos
de Marx e Engels. O nazismo, mais próximo do fascismo, teve no livro Mein Kampf
(Minha Luta), escrito em 1925 por Adolf Hitler, seu manual de
instruções. Mas as regras do regime de Mussolini foram basicamente
definidas na hora, no calor do momento.
O fascismo
propriamente dito ocorreu em um contexto bem específico da história,
mas há quem considere que o regime de Franco, na Espanha, ou o de
Salazar, em Portugal, também tenham sido fascistas. Talvez dessa
indefinição surja a generalização. Hoje, a palavra virou sinônimo de
“extrema direita”, mas é usada até para se referir a “totalitarismo” e
“autoritarismo” – o que não faz sentido, já que o regime comunista de
Stalin foi ainda mais autoritário que o de Mussolini.
Em suma: a
própria definição de fascismo é relativa. E as pessoas vão continuar
usando essa palavra cada uma à sua maneira. Mas, na próxima vez em que
você escutar alguém usando o termo, saberá do que se trata: alusão a um
antigo instrumento de poder romano, que virou símbolo de alguns dos
piores momentos do século 20. (Super Interessante)
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