segunda-feira, 11 de novembro de 2024

Segunda é dia de CRÔNICA: A última crônica

Por limitação ou ausência um dia vou escrever uma última crônica. Não mais serei encontrado nas páginas ou postagens do dia seguinte. É plausível que o mundo continue existindo depois disso, mas é bom não confiar. É provável, também, que ninguém note a falta- isso sim é certeza- mas agirei como se não fosse comigo. Estando a par sobre o boato de meu encerramento fico me perguntando como gostaria que parecesse este derradeiro texto.

Certamente desejaria que se tornasse a melhor de todas, dessas repetidas de boca em boca, tipo primeiro beijo de amor que guarda mais esperanças do que pode vir a ser do que certezas de já ter sido, mas a pretensão é boba, porque se não aconteceu nas anteriores não será vencido pelo ferrugem que escreverei esse monumento.

Claro, pediria perdão pelas coisas inventadas como verdadeiras e vice-versa, que todo cronista vive de disfarces. E diria que, se alguém tiver se beneficiado de qualquer coisa que tenha escrito, nada me deve. Foi Deus, com sua mania de escrever o certo por linhas tortas.
Ela seria otimista como são as temidas lagartas que se transformam em borboletas acreditando que o mundo vai prestar atenção em seu voo trôpego e belo, porque acreditar é sempre melhor que descrer.
Agradeceria a todos de todos os lugares e formas inclusive àqueles que eu nunca soube quem era, para o bem e para o mal, porque, em verdade, nunca escrevemos só já que o mundo é sempre coautor. Deixar de escrever é se despovoar de todos os universos existidos e imaginários.
Talvez ela se declare um novo pequeno milagre feito todas as anteriores por terem me trazido até aqui, afinal, como em certas contravenções, sempre estive valendo só o escrito.
Não, decididamente não deixaria lições, pois o erro ou acerto de cada um é intransmissível- essa foi uma lição que aprendi. Aliás, ela não teria promessas, não indicaria o caminho da salvação, nem pediria a remissão dos pecados cometidos- lições que não ouvi.
É possível que tendo um balanço final pudesse contar de perdas e danos, sucessos e glórias, mas de coisa alguma vale esse inventário de pertences. A felicidade é ir se desapegando do desejo de possuir e do tédio de ter, e, enfim, livre, ser o legítimo dono de nada. E de tudo.
Gostaria que fosse parecida com um ninho de passarinho, simples, mas o necessário para criar vida nova. Feito uma rosa de minha mãe, a benção dos filhos, as unhas de sal de meu pai.
Acho, no entanto, que ela não seria nada do anteriormente citado. Escreveria só uma linha.
-Eu estive aqui. E foi bom!

𝗖𝗲𝘀𝗮𝗿 𝗢𝗹𝗶𝘃𝗲𝗶𝗿𝗮 - Tabaréu, feirense, médico, professor, apaixonado por palavras, pessoas e a vida. Sou de mato, vinhos, cafés, pratos, prosas - falada e escrita. Essa tem sido minha receita.

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