Tinha sido um ano difícil para a Tribuna
Feirense, assim, nos reunimos para uma confraternização de fim de ano: equipe e
nosso fundador Valdomiro Silva. Duas presenças eram novidades: Atila, meu
filho, que estando na cidade me acompanhou e Borega, nosso chargista, que se
desbancou das bandas de Salvador, para o encontro. Uma das raras oportunidades
em que pode vir. Umas doses mais tarde – não se pode negar- o espírito mais
leve das tensões que a crise anunciava, meu filho pegou o violão. E, assim,
presentes os raros- o violão, o destino e Borega- tudo teve início. Ele tocou
uma música que falava de um andarilho no universo de minha memória- sertão-
depois outra na mesma toada e sentimento- carro de boi- que encantou a todos e
a mim de forma particular, pela rara beleza.
Perguntado, Borega, disse as que as
músicas eram de seu pai. Confesso que me espantei, pois, não conhecia. Ele
disse que havia apenas gravações esporádicas. Entre ouvir e cobiçar não demorou
duas notas. De imediato, nasceu ali, a proposta de resgatar as músicas de
Giberval Melo- pai de Borega e já falecido-, gravar um CD e distribuí-lo com a
Tribuna Feirense.
Primeiro, Borega, teve de confirmar se a
ideia persistia no dia seguinte, curado a ressaca. Confirmado, foi revirar o
baú entre o entusiasmo e a emoção. Da banda de cá, víamos os meios de
viabilizar os custos do projeto, mas os tempos ficaram críticos e demos com os
burros n’água. Como não gosto de dar a palavra em vão e se os cavaleiros- como
eles dizem- estavam na missão, não dava para voltar. Foi assim que Borega,
Luciano e Rafael, desceram de Salvador para uma reunião objetiva, numérica e
confirmatória, que eles andavam meio ressabiados quando viram a soma das
coisas. Nada que umas garrafas de vinho na varanda e umas músicas tocadas ao
fim da tarde não nos convencesse que era irreversível o projeto.
Daí por diante foi andar, reunir,
noticiar, optar por tamanho, gravar. Só que os passos da arte feita com o
refinamento do Matita é licor que exige maturar, que se faz com esmero e
acabamento refinado. Assim, atravessaram todo 2016 violando prazos e polindo o
Reino dos Encourados. Agora, inaugurado o ano, o primeiro CD com “código de
barra”, como brincamos, do Matita, nasceu e quer se mostrar. Vem premiado,
desde antes, com Baião Bachiado, escolhida como melhor música instrumental no
Festival da Educadora. É muita banca para quem não tinha, ainda, nem pose
definitiva.
Hoje, esta especiaria está sendo
entregue aos ouvidos e escutar de Feira e do resto do mundo. Aqui nascido, aqui
se lança primeiro e bota perna na sua feitura de filho pródigo. Não pertence
mais aos seus feitores e sim ao que guardam em si a espera da música maestra,
do instrumental pelejado como ofício dos deuses. Sirvam-se. O banquete é de
vocês. Deixem a alma se encantar com a ternura de Timidez, a força poética e
personalidade de Decisão, se refestelar na rede com a trilogia das santas
canções da vida sertaneja que são Carro de Boi, Andarilho e Velho Sertanejo.
Bebam da sabedoria poética de Licor de Jenipapo e do amor em Desejos, além da
raridade do registro de Giberval Melo cantando, com seu irmão Marcelo
acompanhando-o ao violão.
A nós, da Tribuna, cabe apenas o orgulho
de cumprir mais uma vez nosso compromisso com Feira, suas coisas, memórias e
histórias. A mim, pessoalmente, emociona a cumplicidade do acaso que permitiu
este acontecimento, fazendo com que um pai, já ido, abra um caminho a seu filho
e que este filho reaproxime-se de seu pai, afine sua conversa com ele, e tome
como ponto de partida, o exato ponto em que se apartou dele- ou, talvez, nunca
tenha, era só questão de afinar o tato-, para andar de mãos e sons dados com
ele.
Cultivem sua audição. A obra é prima.
Cultivem sua audição. A obra é prima.
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