terça-feira, 30 de abril de 2019

Beth Carvalho partiu para outro plano. Mas, sua voz não se calará.

Queria prestar uma homenagem a essa grande mulher, que sempre amei, sempre fui fã... a consideram madrinha do samba, eu a considero rainha. Presto essa homenagem com esse texto incrível do André Gabeh.
Essa imagem diz tudo sobre essa mulher, para mim, indescritível.
Em 2018, com a mobilidade cada vez mais reduzida pelos efeitos do problema na coluna, Beth fez um show histórico. Ao lado do grupo fundo de Quintal, mostrou sua força ao cantar deitada seus sucessos no show Beth Carvalho encontra Fundo de Quintal – 40 anos de pé no chão.
 Vamos ao texto do André.
 "Beth Carvalho é uma voz que está na alma do brasileiro, mas no suburbano ela está registrada no osso, na pele, no estômago, em cada glândula sudorípara.
Sem exagero.
Quantas colheres nós não batemos na panela acompanhando o ritmo das músicas de Beth?
O ritmo do torresmo fritando. O estalado da folha de louro pro tempero do feijão. O garfo batendo no prato.
To mentindo??
Eu nunca peguei um disco de Beth e pus pra tocar. Nunca.Nunca precisei. Os discos de BETH se materializavam sob as agulhas suburbanas dos anos 70 e 80 e onde houvesse mais de uma pessoa reunida ao redor do samba, lá estaria aquela voz rouca da ruiva de sorriso aberto e olhar molinho.
Beth, Clara Nunes, Roberto Ribeiro, Jamelão, Martinho da Vila, Alcione... são vozes das nossas senzalas libertas, são trilhas sonoras de nossos cotidianos. Encontre alguém que nunca cantou VOU FESTEJAR, mesmo que mentalmente, e verás que encontrar o Santo Graal é coisa pra iniciantes.
Subimos e descemos quantas colinas com essa mulher? Conhecemos tantos artistas novos graças a essa mulher?? Beth tinha mais afilhados que a fada do dente. E a gente, que tem o hábito cretino de amar implicando, fazia varias chacotas com esse titulo de MADRINHA DO SAMBA.
Branca.
Bem branca.
Mas duvido que o samba não se sentisse em casa dentro dela. Duvido. Samba sem arabesco, sem melação, sem influências do Gospel. SAMBA!! Gogó, ritmo, força e inconsciente coletivo desnudado.
Essa mulher cantou deitada e eu reverenciei isso. Disseram que era demais, que ela não precisava daquilo, e eu concordei, mas passarinho canta até quando lhe quebram as asas; abacateiro precisa dar abacate. Entendi o que ela estava fazendo e senti empatia na dor e no gozo.
A obra permanece. Perdurará até que um meteoro acabe com nossa civilização e seus rastros. Mas vai embora grande parte do som dos pés gastando nosso chão em sambadas calorosas. Vai se embora aquela que ensinou a ninar com samba corrido ( todo erezinho suburbano foi sacudido amorosamente ao som de COISINHA DO PAI e dormiu de desespero por ouvir aquele estribilho milhares de vezes).
Foi embora a mãe de todo cantor de bar que um dia precisou lançar um ANDANÇA pra chamar o público pra si.
Até a nossa saudade, o nosso banzo nostálgico de tempos que não voltam mais, perde uma porta voz. 72 anos... pohan.
Deixarei aqui quatro capas dos discos dela que mais me marcaram, tres pelo repertório e um por conta dos dentes e olhos assustadoramente brancos na foto da capa. Achava muito estranho ( desse não lembro o repertório ).
Creio que ela estivesse precisando se livrar de tantas dores e sofrimentos, mas como não tenho certeza se partir era sua vontade eu desejo que ela esteja bem e que haja um lugar lindo pra recebe-la na luz.
Morreu no outono, época das folhas secas que ninguém cantou melhor do que ela.
Muito obrigado.

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