Assombrações nas estradas
Ele
desceu do carro, pediu ao motorista que permanecesse no carro e entrou no mato.
Demorou e o motorista já estava agoniando, sem coragem para ir procurá-lo e sem
saber se deveria ir buscar ajuda. Finalmente ele voltou e calmamente relatou o
que acontecera. Segundo ele, quando as onças apareceram, ele viu dois espíritos
com elas. Eram almas de vítimas de acidente fatal naquele local que estavam
perdidas. Ele as encontrou e orientou para seguirem para onde deveriam ir.
Daquele dia em diante ninguém mais relatou avistamento das duas onças. Julguem
vocês mesmo se foi verdade ou mentira. Para mim, a estória é bem plausível, mas
cada um é livre para pensar o que quiser.
Nessas
estórias de “assombrações”, tudo pode ser. Alguém impressionável viu coisas
inexistentes. Fenômenos naturais, como fogo fátuo, assombram os caminhantes
noturnos, ou apenas fatos simples que, no momento, devido às circunstãncias
parecem ser inexplicáveis. Jorginho, um amigo meu, era viajante e trafegava com
uma caminhonete movida a diesel, à noite, pelas estradas do Sul da Bahia. O
carro começou a falhar e parou. Aconteceu algo comum em motores diesel. Deu
“entrada de ar”. Motorista experiente, ele tentou extrair o ar, mas não
conseguiu fazer o carro funcionar. Como já era mais de meia noite, naquele ermo
de antigamente, ele resolveu dormir dentro do carro e esperar o amanhecer para
pedir ajuda.
Por
volta de duas horas, ele acordou com um barulho. Abriu os olhos e ficou atento,
mas não ouviu nada. A lua crescente iluminava um pouco a noite e, de repente,
uma mão espalmou no para-brisa com força e desapareceu, deixando uma marca
ensanguentada. Os cabelos se arrepiaram todo e ele começou a rezar. Logo em
seguida ele viu uma luz veermelha piscando. Criou coragem, olhou e era o
giroflex de uma viatura que se aproximava. Ele desceu do carro e começou a
fazer acenos desesperados. Era a Polícia Rodoviária. Ele contou aos
patrulheiros tudo que aconteceu até o momento em que ele acordou com o “tapa
ensanguentado” no para-brisa. Os policiais, usando lanternas, logo descobriram
alguém caído ao lado do carro. Estava morto. Parecia ter sido atropelado.
Aí
tudo mudou. Os policiais começaram a desconfiar dele. O coitado jurava por
todos os Santos da Bahia de que estava falando a verdade, mas os caras queriam
logo algemá-lo e levá-lo preso para a delegacia mais próxima. Foi quando um dos
policiais, ainda vasculhando a área com uma lanterna, descobriu rastros de uma
frenagem e o mato todo quebrado bem perto do carro dele. Chamou os outros e,
com mais lanternas, descobriram que era uma ribanceira e lá embaixo um ônibus
virado. Mais tarde se descobriu que o ônibus, descontrolado, veio pela pista
contrária e caiu na ribanceira. Por um triz não acertou o carro de Jorginho. A
“assombração” de Jorginho fora um pobre sobrevivente, que conseguiu subir a
ribanceira e bater no para-brisa da caminhonete estacionada, como a pedir
socorro. Mas, era tarde demais. Morreu bem ali. Mas Jorginho se safou duas
vezes. Uma por não ter sido atingido pelo ônibus desgovernado. Outra porque os
policiais descobriram que ele não teve nada a ver com a morte da “assombração”.
NE: Publicada em 2021
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