*Flores brancas e
amarelas*
Mil
palavras belas eram poucas quando eu traduzia seus olhares.
Exceção feita a isso, nada de especial capaz de despertar inveja alguma ou manifestações de amor mais dedicado.
Com
a maior das atenções, sintonizava-se comigo.
Nada alterava seu humor esperto, seus silêncios compraziam-me, mais ainda quando, ao manifestar seu calado afeto, acercava-se de mim.
Ao ouvir minha voz, rápido como um raio, emergia do nada.
Eu, acostumado a tais aparições miraculosas, na eventual ausência das mesmas, punha-me preocupado com quem tinha espaço no recanto de meus incompreensíveis afetos. Tanto, por não entender qual razão entristece um homem, velho e descrente, ao enfrentar certas perdas.
Nos últimos dias, o querido felino deixara de aparecer, para farejar a placa do carro, à minha chegada. Até o dei por perdido. Quem sabe – pensei com meus botões –, alguém se encantara com seu olhar falante, pelo ralo, pisar tranquilo, compreensível miar.
Qual o quê! Dois dias após, ressurgiu. Esquálido, de mim aproximou-se como a implorar socorro. Condoí-me ao ver o amigo das silenciosas horas, em insistentes ais, à exaustão, repetidos.
Ontem, dia da lavagem da Igreja do Bonfim, em Salvador, em paralelo a similar evento em minha província, quando da visita ao sítio, deparei-me com o companheiro quase inânime. Eclodira um tumor em seu ombro esquerdo. Acorri à veterinária: antibiótico, anti-inflamatório, inúmeros cuidados.
Hoje, ao abrir o portão, nenhum sinal
de vida do menos belo dos belos. Fui encontrá-lo onde o acomodara na véspera,
agora no estertor dos moribundos. Mesmo assim, ao reconhecer minha voz, tentou
levantar-se, esforço inútil.
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