De um lado
para o outro. Para frente e para trás. Um quase agachamento. Em meio ao
corredor de um hospital em Vitória, no Espírito Santo, Elizeni Garcia de
Campos, a Liz, de 41 anos, movimenta pernas, quadril, levanta as mãos e gira ao
ouvir o hit Despacito.
Entre passos
embalados pelo ritmo, a barriga endurece e ela entende o sinal de mais uma
contração: é a filha, Marina, que está chegando.A gaúcha
dançou em agosto deste ano ao fim de quatro dias de trabalho de parto. A dança
também aconteceu três anos e meio depois de uma cesariana, a que acabou se
submetendo contra sua vontade.
O que Liz
sempre quis foi parto normal. Mas, no momento de ter o primeiro filho, diz ter
sido empurrada para uma "cirurgia" seguida de "abalo emocional,
depressão e medo de", em uma nova gravidez, "bater na trave de novo e
ser impedida de realizar o sonho". Não foi o que
aconteceu dessa vez. Naquela segunda-feira, dia 7, deu à luz de forma natural à
Marina, do jeito que escolheu. "Foi cercada de carinho".
Dois meses
depois, na mesma cidade, a empresária Camila Rocha, 28, também dançou à espera
do filho, João Homero. E sorriu em meio a um "vai nascer" que deixou
escapar durante a coreografia. Ela se "sentiu muito acolhida e
segura" no momento e estava certa de que o processo "não precisava
ser tenso e sofrido".
Exemplos de
técnicas usadas nos chamados "partos humanizados", as coreografias
realizadas nos minutos finais de gravidez das duas brasileiras foram
registradas em vídeos, postadas em redes sociais e alcançaram milhares de
visualizações e compartilhamentos.
A mais
recente, de Camila, foi divulgada em 10 de outubro e vista por mais de 180 mil
pessoas apenas na publicação original, feita pelo ginecologista e obstetra
Fernando Guedes da Cunha.
"Humanização"
Mas o que é o "parto humanizado" -
conceito que está por trás daquelas coreografias?
Cunha define como "tratar com respeito a
mulher - respeitando acima de tudo a autonomia dela - e agir de maneira a
promover um ambiente adequado e seguro" para o parto.Esse tratamento, porém, não é esperado apenas no
parto normal. Também vale para a cesariana, procedimento que representa mais da
metade dos partos realizados no país mas que só deveria ser indicado se a mãe
ou o feto demonstrassem alguma "anormalidade" e precisassem de
"ajuda" no processo, diz o médico João Alfredo Piffero Steibel,
membro da comissão de assistência ao abortamento, parto e puerpério da
Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).
"Não existe nenhuma situação em que o parto
humanizado não seja possível, pois isso significa fazer um atendimento adequado
para quem está precisando", frisa.
Era esse
atendimento que estava "nos sonhos" de Liz desde a primeira gravidez. "É que não se trata só da via de nascimento,
de ter o parto vaginal, mas de um conjunto. De ter um médico que te respeita,
de ter a sua doula por perto, de ter apoio físico e emocional, de ter um espaço
adequado", enumera.
Camila, que teve os dois filhos de parto normal,
também sempre quis a "humanização". Ela justifica: "É um momento único na
vida da mulher e podendo ser em um ambiente favorável, acolhedor, com as
pessoas que você ama por perto, é muito melhor".
Liz concorda
e define a humanização no seu segundo parto como momento de "cura". Foi
com esse sentimento, de cura, que a gaúcha dançou no dia do nascimento de
Marina. Um mês antes de a filha nascer, viu um vídeo em que duas grávidas
dançavam Despacito, música do cantor porto-riquenho Luis Fonsi e do
rapper Daddy Yankee. Gostou da ideia e marcou na postagem o marido, o médico e
sua doula.
No dia do
parto, porém, diz ter sido surpreendida. "Morrendo de dor", tomou
analgésico - para aliviar o quadro sem perder os movimentos - e começou a
caminhar pelo hospital com o médico. Ouviu então dele: "É agora que a
gente vai dançar".
A coreografia
foi criada na hora. Ensaiaram na sala de parto e, depois, posicionados no
corredor, se entregaram à performance filmada pela enfermeira obstétrica.O vídeo foi
postado nas redes sociais e tomou uma proporção que ela não esperava. "A
dança foi um momento de descontração, depois de um processo tão cansativo, de
dor. Foi um momento de acolhimento", diz Liz.
Ela executou
cada passo na presença da mãe, do marido, da equipe médica e da doula. A filha
nasceu cerca de 40 minutos depois em um parto que, "com ou sem
dança", afirma, teria sido humanizado. "A dança foi um plus, um
momento de alegria quando a dor não estava presente. Foi um êxtase".Para Camila,
a ideia da dança partiu do médico e, apesar de não ter sido planejado, foi uma
forma de "humanizar, relaxar". "O momento não precisava ser
tenso e sofrido", resume.
Mãe também de
Helena, de 1 ano e 2 meses, ela afirma que o primeiro parto "foi muito
mais sofrido e demorado". "Por
isso, no segundo escolhi um médico que fosse adepto do parto humanizado",
conta. Camila conta
que, no caso da primogênita, ficou muito tempo no hospital entre a bolsa ter
estourado e o bebê nascer. "Foram 12 horas em um ambiente não acolhedor.
Dessa vez, foi apenas 1 hora e 50 minutos entre internar e o nascimento. Passou
muito rápido", lembra. João Homero
nasceu 10 minutos depois de ela ter dançado Paradinha, da cantora
brasileira Anitta.Click aqui e leia materia completa no BBCBrasil .
Um comentário:
Só hoje vi a reportagem no seu site. Marina já fez 2 anos!! Obrigada por compartilhar. Elizeni
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