quinta-feira, 26 de outubro de 2017

'O momento não precisava ser sofrido': a história das grávidas que aliviaram tensão do parto com 'humanização' e coreografias



De um lado para o outro. Para frente e para trás. Um quase agachamento. Em meio ao corredor de um hospital em Vitória, no Espírito Santo, Elizeni Garcia de Campos, a Liz, de 41 anos, movimenta pernas, quadril, levanta as mãos e gira ao ouvir o hit Despacito.
Entre passos embalados pelo ritmo, a barriga endurece e ela entende o sinal de mais uma contração: é a filha, Marina, que está chegando.A gaúcha dançou em agosto deste ano ao fim de quatro dias de trabalho de parto. A dança também aconteceu três anos e meio depois de uma cesariana, a que acabou se submetendo contra sua vontade.

O que Liz sempre quis foi parto normal. Mas, no momento de ter o primeiro filho, diz ter sido empurrada para uma "cirurgia" seguida de "abalo emocional, depressão e medo de", em uma nova gravidez, "bater na trave de novo e ser impedida de realizar o sonho". Não foi o que aconteceu dessa vez. Naquela segunda-feira, dia 7, deu à luz de forma natural à Marina, do jeito que escolheu. "Foi cercada de carinho".
Dois meses depois, na mesma cidade, a empresária Camila Rocha, 28, também dançou à espera do filho, João Homero. E sorriu em meio a um "vai nascer" que deixou escapar durante a coreografia. Ela se "sentiu muito acolhida e segura" no momento e estava certa de que o processo "não precisava ser tenso e sofrido".
Exemplos de técnicas usadas nos chamados "partos humanizados", as coreografias realizadas nos minutos finais de gravidez das duas brasileiras foram registradas em vídeos, postadas em redes sociais e alcançaram milhares de visualizações e compartilhamentos.
A mais recente, de Camila, foi divulgada em 10 de outubro e vista por mais de 180 mil pessoas apenas na publicação original, feita pelo ginecologista e obstetra Fernando Guedes da Cunha.

"Humanização"
Mas o que é o "parto humanizado" - conceito que está por trás daquelas coreografias?
Cunha define como "tratar com respeito a mulher - respeitando acima de tudo a autonomia dela - e agir de maneira a promover um ambiente adequado e seguro" para o parto.Esse tratamento, porém, não é esperado apenas no parto normal. Também vale para a cesariana, procedimento que representa mais da metade dos partos realizados no país mas que só deveria ser indicado se a mãe ou o feto demonstrassem alguma "anormalidade" e precisassem de "ajuda" no processo, diz o médico João Alfredo Piffero Steibel, membro da comissão de assistência ao abortamento, parto e puerpério da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).
"Não existe nenhuma situação em que o parto humanizado não seja possível, pois isso significa fazer um atendimento adequado para quem está precisando", frisa.
Era esse atendimento que estava "nos sonhos" de Liz desde a primeira gravidez. "É que não se trata só da via de nascimento, de ter o parto vaginal, mas de um conjunto. De ter um médico que te respeita, de ter a sua doula por perto, de ter apoio físico e emocional, de ter um espaço adequado", enumera.
Camila, que teve os dois filhos de parto normal, também sempre quis a "humanização".  Ela justifica: "É um momento único na vida da mulher e podendo ser em um ambiente favorável, acolhedor, com as pessoas que você ama por perto, é muito melhor".
Liz concorda e define a humanização no seu segundo parto como momento de "cura". Foi com esse sentimento, de cura, que a gaúcha dançou no dia do nascimento de Marina. Um mês antes de a filha nascer, viu um vídeo em que duas grávidas dançavam Despacito, música do cantor porto-riquenho Luis Fonsi e do rapper Daddy Yankee. Gostou da ideia e marcou na postagem o marido, o médico e sua doula.
No dia do parto, porém, diz ter sido surpreendida. "Morrendo de dor", tomou analgésico - para aliviar o quadro sem perder os movimentos - e começou a caminhar pelo hospital com o médico. Ouviu então dele: "É agora que a gente vai dançar".
A coreografia foi criada na hora. Ensaiaram na sala de parto e, depois, posicionados no corredor, se entregaram à performance filmada pela enfermeira obstétrica.O vídeo foi postado nas redes sociais e tomou uma proporção que ela não esperava. "A dança foi um momento de descontração, depois de um processo tão cansativo, de dor. Foi um momento de acolhimento", diz Liz.
Ela executou cada passo na presença da mãe, do marido, da equipe médica e da doula. A filha nasceu cerca de 40 minutos depois em um parto que, "com ou sem dança", afirma, teria sido humanizado. "A dança foi um plus, um momento de alegria quando a dor não estava presente. Foi um êxtase".Para Camila, a ideia da dança partiu do médico e, apesar de não ter sido planejado, foi uma forma de "humanizar, relaxar". "O momento não precisava ser tenso e sofrido", resume.
Mãe também de Helena, de 1 ano e 2 meses, ela afirma que o primeiro parto "foi muito mais sofrido e demorado".  "Por isso, no segundo escolhi um médico que fosse adepto do parto humanizado", conta. Camila conta que, no caso da primogênita, ficou muito tempo no hospital entre a bolsa ter estourado e o bebê nascer. "Foram 12 horas em um ambiente não acolhedor. Dessa vez, foi apenas 1 hora e 50 minutos entre internar e o nascimento. Passou muito rápido", lembra.  João Homero nasceu 10 minutos depois de ela ter dançado Paradinha, da cantora brasileira Anitta.Click aqui e leia materia completa no BBCBrasil .

Um comentário:

Liz Campos disse...

Só hoje vi a reportagem no seu site. Marina já fez 2 anos!! Obrigada por compartilhar. Elizeni