domingo, 4 de dezembro de 2022

 




*Colcha de retalhos*

 

 ‘Patchwork’, arte de unir retalhos.

Junção de alhos com bugalhos,

algo dedicado e delicado,

ora é riscado,

ora é cor,

ora é bordado.

 

Façamos dos retalhos, palavras. 

                     Juntá-las por passatempo,

com arte, reunir retalhos

da experiência existencial,

de nossos tecidos-sonhos,

domina os sentidos

a alma, acalma.

 

Panos? Papéis.

Agulhas? Canetas.

Linhas? Tintas azuis ou pretas.

 

O ‘patch’ das palavras é pura magia.

 

Desafio para se costurarem na colcha,

retalhos vivazes, abrasadores de mentes,

harmonia tranquila, pacificadora de espíritos,

admiráveis colírios aos olhos nela debruçados

 

Nada melhor - um encanto -

recortar coloridos tecidos

das mãos de Machado,

Florbela e Bilac, nascidos.

 

Há fatos na vida, emoção pura.

As inspirações poéticas, mais ainda.

As vividas paixões,

esperanças da vida perfeita,

ai de mim!

Tudo se converte em instantes

de sonho e de saudade.

Simples assim.

 

Ah! Machado de Assis,

velho amigo,

confidente de segredos nunca revelados!

Estavas coberto de razão.

“Viver é um tédio profundo,

é tudo sempre o mesmo,

eternamente.”

 

Florbela Espanca no Livro das Mágoas,

três casamentos sucessivos,

tratando da monotonia do viver,

em tempos velhos, repressivos,

foi mais longe:

“tanto ser o mesmo lago plácido dormente;

e os dias, sempre os mesmos, a correr ...”

 

Olavo Bilac, (ad)mirando a Via Láctea,

noite afogada em escuridão abismal,

ouvidos antenados ao espaço sideral,

teve as estrelas por mulheres de prata vestidas,

emanando súplicas de amor.

 

O vate então, em êxtase, vaticinou:

“só quem ama pode ter ouvidos,

capaz de ouvir e entender estrelas.”

 

Bilac,

viu nas estrelas as mulheres que amou;

 

Machado,

no dia-a-dia de prosaica vidinha, entediou-se;

 

Florbela,

malgrado três casamentos, abismou-se.

 

Devaneando,

escafedo-me às humanas mesmices.

Enquanto costureiro,

arremato na mesma colcha,

poéticos retalhos de distintos pensadores.

Assim, quem dita a história sou eu.

 

Enquanto gatos da casa encarecem carícias,

e o jornal, sobre a mesa, guarda as notícias,

tenho intentado

somar, às horas do dia,

encanto à magia

do viver prolongado.

 

Para tanto, tenho versado

dando à vida,

uma colcha colorida

a capricho estendida,

sobre o tempo do passado.



Nenhum comentário: