domingo, 21 de fevereiro de 2021

Histórias da Princesa

     Hoje vamos falar um pouquinho sobre alguns bares populares em Feira de Santana. Vi e frequentei vários, alguns que vi abri e fechar e tem os que ainda hoje permanecem funcionando com outros donos, a exemplo do Ferro de Engomar que ainda na primeira metade do século XX era uma "Venda", e o Boteco do Vital que também se transformou e cresceu e ainda mantém  alguns fregueses daquela época.

Os Bares da Princesa através dos tempos

         Toda cidade tem seus bares ou pontos de encontro de amigos que marcam o dia a dia e ficam para sempre na memória da população. Alguns, mesmo com vida curta, ficam famosos, outros duram muito, muitas vezes até depois do falecimento dos seus donos. Na cidade princesa não foi diferente. Na década de 50 do século passado, até os dias de hoje, são incontáveis os bares e pontos de encontro de amigos que marcaram época. A juventude da década de 50 se reunia no Sueto, um barzinho estreito e comprido que ficava na rua Conselheiro Franco (Rua Direita), próximo à praça da Bandeira. Os mais velhos davam preferência a pontos mais tradicionais como o Café São Paulo, na Praça da Bandeira, ou o Meu Cantinho, na rua Sales Barbosa. Nestes locais se conversava de tudo, se fechava negócios, marcavam-se encontros, surgiam as fofocas e até se iniciavam e se desfaziam romances.

        

Lançamento de livro no Boteco do Vital

Cristóvam Aguiar lançando livro no Boteco do Vital
         A popularidade de um lugar desses depende de vários fatores, onde a higiene parece ser um dos últimos aspectos a ser considerado pelos clientes. Tome-se por exemplo o Boteco do Vital, surgido na década de 60, uma verdadeira birosca, tosca, cujo sanitário era uma portinha com um único vaso, e que os clientes chamaram “carinhosamente de “Câmara de Gás”. Ainda existe até os dias de hoje, cresceu, se modernizou e nem de longe lembra aquele botequim onde se ia tomar umas bicadas de cachaças de folhas ou cerveja com tira-gosto de galinha assada e jogar sinuca. Já foi palco de festas juninas, pré-micaretescas e até literária, com lançamento de livros. Ou então o Acapulco, um estreitíssimo espaço situado num canto do Mercado Municipal, na esquina das ruas Sales Barbosa com a rua Intendente Rui. Quem viu aquela birosca jamais imaginaria também que iria se transformar no grande bar e restaurante Acapulco, erguido na avenida Maria Quitéria.       
Abrigo Santana
O Predileto.

        Nas duas principais praças do centro da cidade, estavam localizados também os abrigos Santana e Predileto, sendo que este último ainda existe, como bar e lanchonete, já o primeiro foi demolido e em seu lugar construído um espelho d’água, depois um jardim, e colocada uma escultura de artista plástico Feirense, Juracy Dórea.   

Praça J. Pedreira atualmente

       Ainda na década de 60 surgiu o primeiro bar daquele que se tornaria mais tarde o maior e mais criativos donos de bares de Feira de Santana e promotor de eventos, o Pigalle, na Avenida Senhor dos passos, em frente ao cine Santanópolis, uma iniciativa de José Carlos Pedreira, o Zé Coió. Mas não durou muito. Fechou e em seu lugar surgiu uma loja de confecções masculinas. Pouco tempo depois, Raimundo Lacerda, (Redondo, para os íntimos), primo de Zé Coió, abriu a poucos metros de onde fora o Pigalle, na esquina da praça J. Pedreira com a Avenida Senhor os Passos, o Le Gouter, onde se reunia a rapaziada que usava cabelos compridos, calças com boca de funil e, mais tarde, de sino, andava de lambreta, mascava chicletes e amavam os Beatles e os Rolling Stones. Alguns até fumavam uns cigarrinhos que exalavam um odor esquisito. Esse durou muitos anos até que virou uma Casa Lotérica.       

Ferro de Engomar

        Não poderia deixar de mencionar o famoso Ferro de Engomar. Ainda na primeira metade do século XX, era o ponto da “Bahia-Feira”. Também funcionava uma ‘Venda’- secos e molhados, onde se destacava o legítimo bacalhau da Noruega que chega dentro do barril. Tempos depois, na segunda metade do século, transformado em ‘Bar’ virou ponto de encontro da gente feirense. Quem no entardecer, ou no sábado durante todo dia, na época de Edson, por exemplo, não saboreou o famoso “bolinho de bacalhau”? Esse, embora tenha mudado de donos diversas vezes, ainda está em funcionamento, na esquina da Avenida Senhor dos Passos com a Senador Quintino.

Descentralizando

         A cidade cresceu e os costumes foram mudando, mas os bares da moda e os pontos de encontro de pessoas jovens ou velhas continuaram existentes, só que passaram a predominar nos locais mais afastados, até mesmo nos limites extremos da cidade. Casos típicos são o Lagoa Grande, situado próximo à Lagoa do mesmo nome. Onde havia pista de dança. O outro foi A Moringa, situado também às margens da Avenida Eduardo Froes da Mota (Contorno) nos limites do Conjunto Centenário. E já se começavam a descobrir tradicionais bares de bairros, como o Suburbano, na Rua Quintino Bocaiuva (Rua do Fogo), Kalilândia, na praça da Kalilândia, Guirra Bar, na Avenida Maria Quitéria, Bar Caninha, no Ponto Central, Brisk Beer, na Maria Quitéria, o Timbau, no cruzamento da Maria Quitéria com a Getúlio Vargas, e inúmeros outros que foram sendo descobertos ou inaugurados e que caíram no gosto da população.

Cada um buscava ter algo diferente para atrair a freguesia, de preferência na culinária, ou num drink especial. A especialidade do Bar Caninha era tira-gosto de caça. Tatu, mocó, teiú e até jiboia, moqueados ou ensopados, eram servidos. E qual feirense não experimentou a batida de gengibre de seu China, ao lado do Mercado de Arte, ou a cachaça que vinha dentro de um coco seco gelado, no bar de João do Coquinho? Quem nunca comeu a Buona Pizza de Juliano ou não comprou sorvete e Picolé de João da Kibon? Quem nunca comeu caranguejo em Joãozinho da Goméia ou marcou ponto na frente do Colégio Santanópolis a partir das 16 horas para comer Acarajé e Ababará de Tonhão? E logo ali ao lado estava o Batidão, com drinks os mais variados.

        E o Ponto do Zequinha? Como Bar é mais recente, antes era uma "venda", e Zequinha era funcionário. Depois ele assumiu e começou um dos pontos mais famosos da cidade, onde reuniam-se políticos, jornalistas, empresários... sua especialidade a picanha. Lá, podia se conversar amenidades, trocar ideias, e até fazer negócios, pois não existia aquele som insuportável que agride os ouvidos. Durou até o ano passado, quando Zequinha passou para o plano espiritual.

Tudo isso era ponto de encontro dos amigos e oportunidade de fazer novas amizades.

A Rua Carlos Gomes e os Inferninhos

Praça do Nordestino, rua Carlos Gomes e o FTC

        Um destaque há que se dar à Rua Carlos Gomes. Uma pequena rua situada entre as ruas Visconde do Rio Branco e a Avenida Senhor dos Passos, tendo de um lado a referência do Feira Tênis Clube (o Aristocrático) e do outro o abrigo Nordestino e o cine Íris. Na década de 60 era chamada de “a Rua Augusta de Feira de Santana, numa comparação nada modesta com a famosa rua paulistana. Mas, principalmente nos finais de semana, a noite feirense começava ali. Pessoas de todas as partes da cidade para lá se dirigiam para “curtir a noite”, que poderia começar pegando um cineminha ou, jantando no Galo de Ouro ou bebendo com amigo no RN, enquanto aguardava o início da boate do FTC. Mas tinha outras opções. Se podia jogar boliche ou “esquentar as turbinas do Crazy, uma pequena boate com luz negra, globo de luz giratório, desenhos psicodélicos com tintas fosforescentes nas paredes, rock and roll em alto volume, tudo que a juventude mais avançadinha da época gostava. Pra contrabalançar, tinha o teatro Margarida Ribeiro que sempre estava exibindo alguma peça montada por um dos cinco grupos teatrais feirenses da época. Era ou não era a nossa Rua Augusta?      

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