sábado, 26 de fevereiro de 2022


 *Puros e Marrons*

 A turma da família conhece a história acontecida em 2005: coisas de um infante então de cinco anos e seu pai, um escriba com sessenta. Ser-me-á prazeroso narrá-la a meus leitores.

Vivo na 7ª cidade mais negra do país: a população branca é minoria e nada mais natural que os estudantes locais reflitam tal realidade.

Iniciado o ano letivo, primeiros dias, o caçula extemporâneo, à mesa no almoço, com a pureza típica das crianças, inopinadamente comenta:

- Papai! Lá na escola tem uma menina bonitinha. A cor dela é marrom!

 Indaguei-lhe:

- E você meu filho? É marrom ou branco?

Dado a dificuldade em definir a cor de sua pele, o guri sem pestanejar, responde:

 - Não papai! Eu não sou branco nem marrom. Eu sou normal!

 Aí, ante a meridiana clareza de uma criança criada sem preconceitos, deduzi cor ser apenas uma forma de se ver o mundo: gente, charutos, seja o que for.

 Aquilo, tido por meu filho como ‘normal’, era apenas o reflexo da predominância da família à qual pertence.

 Os apreciadores de charutos sabem disto. Para uns, ‘normal’ é o puro de capa clara; para outros, o charuto escuro, capa marrom.

 Eu reconheço, ainda um tanto atado a (pre)conceitos impostos por uma (in)formação inadequada, procuro no dia a dia, alternar preferências, sem distinções.

 Embora conviva com os puros todos os dias, dias há nos quais os quero puros e claros; outros, quando os prefiro puros e marrons.

Hugo A. de Bittencourt Carvalho, economista, cronista, ex-diretor das fábricas de charutos Menendez & Amerino, Suerdieck e Pimentel, vive em São Gonçalo dos Campos – BA.

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