Trato, agora, de vivências protocolares ao início do presente século.
A migração, então ocorrida, do hábito postal para o eletrônico, exigiu do internauta adaptar-se a outros comportamentos. As cartas tradicionais chegavam, de forma automática, às nossas mãos. Alcançadas por alguém do escritório ou da casa, apenas exigiam o esforço de abrir os envelopes. Com o advento do e-mail a coisa mudou.
Ter-se um endereço eletrônico sem acessá-lo, equivalia a ter-se uma caixa postal e não ir aos Correios, abri-la. Consequência: aquilo que seria veloz tornava-se quase obsoleto; retornávamos ao tempo das carruagens.
Segundo minha experiência, certos amigos destinatários das minhas crônicas, enfrentaram tal drama. Passaram a ter endereço eletrônico, mas quem o acessava, em casa era, um filho adolescente; no escritório, a secretária.
No caso dos jovens, por julgarem o assunto “careta”, alguns, o deletavam; no caso das secretárias, as que, em silêncio, “odiavam” a fumaça dos charutos, por contaminar seus cabelos, não encaminhavam a mensagem sob o pretexto de “não aporrinhar o chefe”.
Resultado: rompia-se o elo da comunicação; comprometia-se o relacionamento emissor-receptor.
Certo dia, ano 2003, um de meus destinatários eletrônicos, ao telefone, cobrou-me a falta de cartas.
“’Mas Fulano, tenho enviado as crônicas
para seu e-mail” – argui.
“Meu e-mail?” - indagou
surpreso, em seguida retificou:
“Ah! Meu e-mail, quem acessa é minha filha”.
Sem comentários.
Quem não incorporara a seu cotidiano o hábito de abrir sua caixa eletrônica (ou o de indagar a quem o faz), melhor seria optasse em receber suas mensagens pela via postal.
Com charutos, tal entrechoque entre passado e presente, ainda hoje funciona mais ou menos assim.
Fumá-los exige comportamento
distinto. Saber enfrentar a maré de reclamações dos circunstantes, “sem perder
a chave”, quando as baforadas espalham o aroma do tabaco, requer perseverança igual
àquela do acessar as mensagens do computador. Saber “dar a volta por cima” e
com compreensiva paciência, entender tratar-se tal hostilidade, ser igual uma
lacuna cultural.
Assim, como é reduzido o universo de admiradores de bons vinhos, poucos são apreciadores dos charutos. Por isso, detentores de um saber-viver que os distingue dos comuns mortais, são privilegiados, apesar de estarem, cada vez mais, patrulhados.
Modernidade e a tradição em convivência
Hugo A. de Bittencourt
Carvalho,
economista, cronista, ex-diretor das fábricas de charutos
Menendez & Amerino,
Suerdieck e Pimentel,
vive em São Gonçalo dos
Campos – BA.
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